CONTO DE AREIA

Num recanto a beira mar, com seus tons azuis e verdes, o navegar das ondas ao sabor do vento, leva pescadores, ilusões e dores, muitas vezes devolve amores, sabores, cores e sofrimento, nas ondas do mar existem sonhos, moram seres, morrem corpos, vão amores e voltam suores, tão simples é a vida de um pescador, tão árdua sua jornada, nem sempre benfazeja, muitas vezes de regozijo. No casebre sobre palafitas reside Bento, bento por Iemanjá, Bento de nome, bento de abençoado por sua velha mãe Carolina, e todos os dias sagrado por sua mulher, Maria do Rosário, seu nome na verdade é Ester, mas, como tem o hábito de dedilhar seu rosário a cada dia de mar de Bento, lhe deram esse apelido, é com um misto de esperança e dor, que ela o ver partir, irrompe em orações, até sua chegada, para ela cada volta com o barco, cheio ou não, já é motivo de dar glórias, pelo retorno de seu amado. Como iria sobreviver sem ele, com 04 filhos pequenos para criar, ela sabe que é uma mulher delicada, sábia na lida do lar e da família, às vezes também ajuda na confecção das redes, embora sua compleição delicada, não lhe permita muito esforço, pariu 04 filhos quase seguidamente, ainda não tomou corpo de novo, mas, é batalhadora, não se deixa esmorecer com facilidade. Bento tem lá seus 30 anos, moreno de mar, louro de nascimento, olhos de se mergulhar, de tão claros, tem um corpo magro, mas cheio de vigor, não é bonito, e ainda assim ela o ama demais, Ester (Maria do Rosário), é uma moreninha brejeira, pequenina de corpo e forte de disposição e inteligência, todas as contas da pescaria são com ela, Bento é meio lento pra isso, tem olhos castanhos escuros, pequeninos e vigiantes, e o sorriso mais lindo de toda a beira do caís. Teve quatro meninos, que com certeza são a alegria de sua família, José Antônio com 08 anos, Marcos de 07, Jorge Luiz de 05 e Pedro Bento de 03 anos, como lhe dão trabalho, são arteiros, gentis com todo mundo, e possuem uma energia extraterrena, não param um só momento, quem os doma na verdade, é sua amiga e velha sogra, mãe de Bento, Véia Carolina, é como a chamam, doce senhora, paciente, e curtida nas histórias do mar, já viu muita coisa nessa vida, e de tudo tira uma lição, difícil é o dia em que não passam por sua porta para lhe pedir a benção antes de ir pro mar, é como se fosse um combustível a mais, nas orações. Carolina, já está bem idosa, o povo do mar parece mais velho, pela exposição ao sol, mas, ela já está com seus 70 anos, olha os netos com amor, os afaga e repreende com o mesmo carinho, ajuda no que pode, mas, seu prazer preferido, é ficar em sua cadeira de balanço, observando o ir e vir das ondas. Graças a Deus, até hoje não passaram necessidade, todos eles sabem que o mar, nem sempre está para peixe, como se diz por aí, eles são de pouco luxo, e têm sobrevivido bem, não há do que reclamar. Um dia de peixe e mistura, outro só de mistura, meninos na escola. Na beira do mar, sapato é coisa rara, só pra escola e pra missa mesmo, roupa de domingo e chinelas, roupa leve, um chalé pro frio, agasalho da fogueira, luz de lampião, são felizes assim. Era de se esperar mais um conto de areia, cheio de dores e derrotas, amores e vitórias, mas, nem tudo é igual, pois isso seria um tédio total, esse conto, é apenas um conto singelo de FELICIDADE.

Cristina Gaspar

Rio de janeiro, 23 de janeiro de 2015.

Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 24/01/2015
Reeditado em 24/01/2015
Código do texto: T5112257
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.