Merda de Verão
Sempre existe aquela estação. Parece que os pássaros se empolgam mais ou eu que me empolgo menos. Acordo e vejo aquele olho de sol, que mais parece um farol a me derreter. Foda-se se estou desejando ficar um pouco mais na cama, já que os raios solares se insinuam pelas gretas de qualquer coisa, seja janela, porta, ou mesmo o rabo de alguém que cruza a fronteira entre eu e o sol. Um cerveja cairia bem. Alguém vem com aquele papo que não se deve beber tão cedo, mas o fato é que não deveríamos comer noventa por cento da porcaria que comemos em qualquer horário. Mas se bebesse todo dia, aí seria considerado alcoólatra. Rótulas são mesmo uma merda.
Aquele curiosidade me persegue. A curiosidade é mesmo um mistério. Na verdade ela é a busca por desvendar o mistério, já que todo curioso tem aquele desejo íntimo de achar algo, ainda que não seja aquilo que procura. A televisão com aquela programação de luau, como se todo mundo gostasse de música na praia e maconha ao ar livre. Trindade, Maromba, um maconheiro a cada dois metros, ou seria meio metro? A gente viaja e eles viajammm. Conhecer lugares diferentes, rostos não habituais que com o tempo demonstram essas mesmas posturas, já que os humanos são espécie que procura se distinguir, apesar dos costumes que desde tempos remotos fazem parte de sua personalidade fóssil.
Whisky com bastante gelo. Fica aguado mas ajuda a refrescar. Nada refresca. Só o vento quando bate no suor que gela rapidamente no corpo, Saio do banho suado. Não sei se enxugo a água ou o suor, embora o suor seja água. No final, dá no mesmo. O livro no colo e uma, duas, três, dezenas de posições e nada de conforto. O sofá esquenta, o ventilador sopra quente, o ar condicionado agoniza. Cerveja bem gelada. A garganta doendo e a impossibilidade de beber água em temperatura ambiente, já que posso ferver café com o que sai direto da torneira. O que adianta ter um sobretudo? Não se usa roupas de frio, no máximo uma semana no ano e olha lá. As pessoas te observam como se fosse um marciano. Nunca encontraram ninguém em Marte para saber como se veste. Cerveja quente tem gosto de urina. Quem disso isso deve ter bebido mijo alguma vez na vida, o que significa que beber cerveja para ele é mole.
Nenhum filme que presta. A moda é usar camisas com marca de suor embaixo do braço. Alguns saem de bermuda e camisa social, meio ridículo, mas faz parte desses vestuários considerados pós-modernos. Por que os surfistas tem que falar com voz da maconheiro? Não posso generalizar. Nem todo maconheiro tem voz de maconheiro. Seria como dizer que a cannabis promove um padrão vocal, e isso soa ridículo. Esses noticiários de verão na televisão, com gente sarada e retardada. O cara fica o dia todo na praia, nada, anda de skate, vai praticar surf, corpos bronzeados, cor de câncer de pele. Praia à noite é boa, silenciosa, talvez tenha menos coliformes fecais do que de dia com aquela multidão cagando e mijando a torto e a direito. Pego uma latinha e me recomendam limpar o local onde se põe a boca, já que pode ter sido contaminado por ratos. Sempre a culpa é dos roedores, e não do mordomo, como supunham no passado. Acho mais limpo a borda roçada por ratos do que o pão de certas padarias com pentelho e catarro de padeiro.
O sol está de rachar. Realmente vejo o asfalto trincar e tem gente deixando sua marca, como se aquela avenida esburacada fosse a calçada da fama. Basta um cimento fresco e nem que seja as patas de um cachorro, ficará uma marca. Fora o desejo fálico, adoram desejar pênis, talvez pela necessidade de um. Por falar nisso, alguém disse, “esse caralho de verão”. Imagino um pinto pegando fogo ou algo do tipo, uma espécie de fênix da cacetaria. Louco esse mundo. Bebi a lata em duas goladas. Sede é isso. Agora vou pedir a segunda para sentir o gosto da bebida. A lua segue clareando a areia suja. Um cachorro caga ao lado e as estrelas salpicam, como se fossem anunciar o dia de amanhã, ainda mais quente insuportável. Na verdade suportamos, só que indignados. As férias são esse inferno, embora nem todos estejam de férias. É melhor estar de férias no inferno do que trabalhar para o capeta. O lance da cerveja é essa vontade de mijar que quando vem forte, chega doer as bolas. Se o cachorro pode, porque eu não posso? Mijo num coqueiro qualquer e volto a sentar na areia. Logo a noite acaba e o sol volta, com a fúria da aurora, fodendo minhas vistas.
Ontem estava lendo um texto do Sartre. Quem lê essa porra aqui? Acho que sentar junto ao grupo de pessoas naquela mesa, não me fará melhor. Prefiro ficar com minhas meditações, buscando informações de pessoas mortas, que deixaram textos que podem ser vividos por quem não sabe porra nenhuma da vida deles, mas que ainda assim admira e quer tentar entender. O estômago com pouco alimento reclama um pouco, nada que um quinta latinha não rebata. Mergulho no mar e fico observando a camisa deixada na areia. A gente tem o costume de imaginar que será roubado. Agora deixou de ser imaginação. Volto pra casa sem camisa, coisa que não faço nunca. Aprendemos a cada dia um novo hábito, mais por necessidade que por imaginação. Eu bebo sim e estou vivendo, tem que gente que não bebe e está vivendo também. Essas campanhas fitness são um pé no saco. Bebe shake e come ração humana. Sou lá cachorro pra comer e beber essa merda? Embora pareça alpiste. Também não sou passarinho e odeio gaiolas.
Dou risada desse lance de gordofobia. Tem tantas maneiras de se foder nessa vida. Que se dane se o cara quer comer isso ou aquilo. Engraçado são os médicos fumantes que dizem para não fumar e os gordos que pedem para emagrecer e cuidar da saúde e tal. Papo de médico. O lance é faturar uma grana com sua doença e que se foda você. Esse lance de altruísmo é para alguns santos quer já estão em extinção, o resto é só conferindo o saldo e procurando sair do vermelho. Por falar nisso, dizem que o capeta é vermelho. Muitos ficam vermelhos embaixo desse sol, aprendizes de hellboy. Faltam os chifres. Mas como dizem, isso é coisa que colocam em nossas cabeças. Não sei pra que serve água com gás. Refrigerante é mais gostoso de beber e se for para limpar, dizem que coca-cola desentope ralo, o que dirá um intestino. Lendas urbanas são mesmo engraçadas. O verão ainda demora acabar. Continuo curtindo o inferno, agora na estrada. Highway to hell!