Uma Partida de Futebol Inesquecível.

Ano de mil novecentos e noventa. Eu havia chegado há pouquíssimo tempo, de trouxa, chapéu e cuia para amarrar meu jegue definitivamente aqui na abeirada do mangue em Aracaju. Chegava a pulso, na marra, puxado pelo beiço igual a piau pelo anzol, esperneando, estrebuchando. Eu conhecia a cidade superficialmente, mas completamente desambientado. Talvez por isso, meu compadre, amigo e cunhado Silvestre me convidou para ver uma partida de futebol no Estádio “Batistão”.

Rolava o campeonato estadual, que como na maioria dos Estados Confederados, resume-se a dois ou três times de ponta. Em Sergipe isso estava concentrado no Sporte Clube Sergipe e Associação Desportiva Confiança. Meu cunhado, torcedor ferrenho do Sergipe, contava como certa a vitória do seu clube, isso porque há trinta e sete partidas não perdiam para seu oponente. Feito histórico para qualquer competição em qualquer esporte no mundo.

O que meu compadre não sabia era que eu não era o convidado específico para tal comemoração. Costumo contrariar os contrários, levar um tremendo azar para os ditos favoritos... Ele comprou as entradas na arquibancada e fomos nós para contar as favas já contadas de boca por eles, como se no esporte se vencesse antecipadamente, fora de campo.

O estádio estava lotado, vermelho e branco de cabo a rabo, bandeiras, foguetes e fanfarras fazendo barulho.

Iniciado a partida... Passava o tempo e aquilo que se contava como um “clássico” não passava de uma pelada. Jogo mal jogado entre as duas intermediárias, as defesas dominando os ataques, numa partida sem graça. Placar ÔCHO sem motivação alguma. Lá em Teresina, chamamos de ôcho quando ninguém faz gol = 0 X 0.

Tudo parecia que não sairia daquilo mesmo, um purgante antes da segunda-feira. Até que lá pelos 38 minutos do segundo tempo, um fato surpreendente transformou-se no assunto da semana inteira, quando o Confiança marcou o único gol da partida, saindo vencedor, para contrariar o otimismo de meu cunhado e dos outros torcedores do Sergipe.

O gol marcado pelo jogador Mica, que foi o ápice do acontecimento acabou sendo irrelevante, tudo por conta de um locutor esportivo cacófato que transmitia pelo rádio.

Narrava mais ou menos assim: “...Vai o Confiança para o ataque pela ponta direita, a bola foi lançada na área subiu Mica goooooool, Miiiiiiiiiiiiica gooooooooooooooooooooool, numa tremenda cagada, cabeceou de costas sem querer e a pelota entrou no ângulo, lá onde a aranha tece a teia. Confiança 1 Sergipe 0.”

Os torcedores com o ouvido colado no radinho de pilha prorromperam numa ensurdecedora gargalhada, gente chorava de rir.

Desse dia em diante meu compadre nunca mais me chamou para assistir nem briga de canário.

Um Piauiense Armengador de Versos
Enviado por Um Piauiense Armengador de Versos em 25/10/2014
Reeditado em 01/07/2020
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