Em Uma Partida de Sinuca
Em um boteco, daqueles de ovo colorido e torresmo com cabelo. Um grupo de amigos disputava uma partida de sinuca. Nada de muito sofisticado. Mesa simples, com fichas e o objetivo era matar bolas impares e pares. As duplas feitas. A partida começou. Os corpos pequenos de cerveja, que se mata em uma golada, deixados próximos, em pequenas mesas armadas e com logotipo de alguma marca de bebida da moda. O primeiro competidor pegou seu copo embasado e deu a sua tragada, seguida daquele, “Aaahhhhh!”. As bolas caindo e a conversa seguindo. Um deles apostou que acabaria com o jogo nas próximas duas jogadas. O terceiro, que era o segundo da dupla ao lado, disse que se fizesse o prometido, ele enfiava o taco no próprio cu. Talvez tenha sido um exagero. Por nervosismo, quem sabe, o segundo não conseguiu o feito e a partida se alongava. Trouxeram um prato com miúdos de frango e a rapaziada ao redor veio conferir a iguaria. A televisão ligada e de vez em quando alguém prestava atenção e comentava a respeito de algo noticiado.
Uma chuva começou a cair. Ameaçou vir forte, mas afinou e o calor subiu ainda mais forte. O dono do bar comentou que o político entrevistado era conhecido dele, “um tremendo filho-da-puta”, dizia o proprietário do estabelecimento. Um galhofeiro disse ser feio ofender a mãe do “cabra”. Mas um outro, também conhecedor da situação esclareceu que não era figura de linguagem, a mãe do tal deputado, dava e cobrava, ele mesmo já havia gastado uma pequeno quantia com aquela “xana velha”, como fez questão de salientar. A notícia prosseguia e o primeiro da mesa de sinuca falou que o sujeito, depois de ter ido para Brasília, esquecera aquele lugar e só retornava em época de eleição, para conseguir permanecer no cargo. Todos concordaram e reclamaram da situação do município e do estado. Um garoto que esperava para engraxar algum sapato, riu e sentou em seu caixote, observando o movimento em frente do bar. Um grupo de uma das mesas, entediado, começou a jogar porrinha. Um concertou, “que Mané porrinha, isso não sai do caralho de ninguém não, é purrinha seu retardado”. Sujeito de classe e que quis demonstrar sapiência. Um deles propôs xadrez, mas o outro se negou comentando que, “isso é jogo de intelectual e afeminado, coisa de quem esquenta muito a cachola, o negócio aqui é toma lá dá cá”.
A partida de sinuca estava para terminar, uma tacada para decidir o jogo. O quarto jogador colocou os amigos a par da situação de um conhecido deles, dizendo que a filha do sujeito estava “prenha”. O terceiro jogador não se espantou e ainda emendou dizendo, “que a guria passava toda rebolosa por aqueles lados, com um short atochado e que logo o resultado seria embuchar. O dono do botequim gritou que, “filha dele o caso era resolvido com duas bolachas de mão cheia na cara”. O moleque deu risada e disse que o agressor nunca fizera filho em ninguém, gerando olhares e um silêncio no recinto. O sujeito pulou o balcão e foi chutar a bunda do menino para fora do bar. “Essa partida de sinuca não acaba mais?” — alguém perguntou em tom exasperado. As doses de cachaça continuavam sendo servidas em copos pequenos que eram enfileirados sobre o balcão. As noticias agora eram de crimes ocorridos e perseguições policiais. O dia ia acabando e a noite começava a se fazer ver. Um vira-lata roía um ossinho jogado próximo da valeta. Lamentaram não ser dia que a TV transmite jogo e um dos frequentadores reclamou ter visto uma barata. O proprietário se azedou e disse que se quisessem coisa grã-fina, “que fossem para um restaurante, cinco estrelas, ou para a puta que os pariu”. O dia no bar se prolonga de forma diferente dos outros estabelecimentos.