Dezembro
Era dezembro. Mas ainda faltava um bom tempo para o natal. Caminhava pelas ruas, observando as vitrines enfeitadas. No bar, o pedido de uma dose. Apenas um gole e engolia todo o conteúdo. Saindo pela calçada, esbarrando em um sujeito engravatado que parecia estar com bastante pressa. As crianças brincavam em uma praça, junto com idosos que se divertiam com aparelhos para exercícios na terceira idade. As velhas balançavam e ficava me perguntando se sabia o risco de uma lesão que seria quase fatal na idade delas. Mais um bar, dessa vez, uma partida de sinuca. Ganhou a primeira e perdeu as outras duas, mais uma garrafa de cerveja e uma dose de tequila. Uma parada em frente à banca de jornais, lendo as matérias das capas dos principais periódicos. Uma garota cheia de piercings e tatuagens, entrou. O dono da banca olhou com ar de reprovação. Depois da jovem ter ido embora, fez um gesto de negação com a cabeça, como se pedisse apoio. Continuou imóvel, até que caminhou ao camelódromo. Viu aquele monte de lojas e sentou em uma lanchonete, pedindo um pastel e uma lata de cerveja.
Como o semáforo pode demorar. Aguardando na faixa de pedestres e o sol escaldante. Um carro com som alto estacionado e castigando a audição das pessoas, disputando o espaço sonoro com o anunciante de uma loja de calçados armado de microfone, um crente com megafone, gritando suas pregações e o carro da pamonha, repetindo sua gravação, como um mantra do milho. Um casal se beijava no banco, com fones de ouvido é claro. Acaba por entrara em uma agência bancária e observa que o guarda parece um boneco de cera e fica um tempo encarando o sujeito para ver se mexia. Veio o gesto e um andar desconfiado próximo aos caixas eletrônicos, pois ficara intrigado por ter sido observado daquela maneira. O saque de pouco dinheiro e de volta às ruas. Mais um bar. Entra e escolhe uma cadeira ao fundo. Pede uma garrafa de cerveja, seca rapidamente e pede mais uma, seguida de uma dose de conhaque. Chega ao banheiro, urina bastante, molhando as bordas do vaso. Fica parado. Observa os peitos de um manequim sem braços, uma espécie de Vênus de Milo moderna.
Uma criança faz pirraça no meio do calçadão. O pensamento de que poderia levar uma surra daquela mãe. Que se fosse seu filho levaria. Que tem vontade de bater na mãe e na filha. Os velhos jogam dominó nas mesas da praça e imagina que não deseja aquilo ali para sua velhice, se chegar lá. Policiais passam a cavalo, magnânimos, como se fossem guerreiros medievais, prontos a decapitar alguém. Hoje o sabre é o cassetete, que marca o lombo de quem entra no caminho. Chega em casa e resolve redecorar. Quebra a perna de uma cadeira tubular. Ataca a televisão e a reduz a pedaços, soca os espelhos e chuta a mobília, rasgando papéis, derrubando estantes, quebrando louças contra as paredes. Os vizinhos chamam a polícia por conta da barulheira. Os homens da lei invadem o lugar e encontram o sujeito bebendo o resto de uma garrafa de whisky. Diz que não é crime redecorar a casa e quebrar o que é seu. Mas o policial alega perturbação da ordem e o leva para prestar esclarecimentos na delegacia. Os vizinhos observando enquanto era colocado no banco de trás da viatura, algemado.
Na delegacia é convidado a passar a noite em uma cela por com ta da embriaguez e do tumulto causado. O delegado ainda reclama, diz que é mês de natal e deveria contribuir, já que eles estavam muito atarefados. Passa a noite dormindo com a cabeça próxima a latrina, com aquele aroma de urina. desmaiou e não viu mais nada. Poderia ter sido estuprado e não saberia. Acordou sem sentir do no rabo, o que era algo bom. Estava todo vomitado. Foi liberado e voltou caminhando para casa. Encontrou um bar no caminho. Entrou e pediu duas garrafas de cerveja, a primeira bebeu fácil, a segunda ficou apreciando. Conhecia o dono do boteco e pediu para toma rum banho e trocar a camisa. Conseguiu uma camisa limpa e depois de tomar banho, enquanto bebia a terceira garrafa de cerveja embaixo do chuveiro, foi para casa. chegando lá, tudo revirado. Ateou álcool no colchão e deixou a casa arder em chamas, observando do lado de fora, bebendo o restante da vodka que sobrara em uma garrafa esquecida atrás da geladeira. Primeiro vieram os bombeiros e em seguida os policiais. Perguntaram se ele queira encrenca. Disse que pretendia vender o terreno vazio, era sua propriedade e que fazia dela o que desejasse. Acabou passando a véspera de natal na prisão. Ao sair mais uma vez da cadeia, caminhou pelas ruas, sabia que não havia mais casa. conseguiu um pedaço de papelão e dividiu a marquise de uma calçada com um indigente. Beberam juntos uma garrafa de pinga e nunca havia dormido tão bem.