OS MEDOS DO WELSON!

Às vezes eu fico lembrando coisas que aconteceram na cidade de Jaboticabal, interior de São Paulo, onde me criei desde os 03 (três) anos de idade até os 32 (trinta e dois) quando de lá me mudei para Ilha Solteira. Foram tantas histórias, umas alegres outras nem tanto, mas que fazem parte da minha vida.

O que vou relatar hoje é uma história interessante sobre uma família de medrosos. É claro que não vou falar da família toda, e sim, de um dos seus componentes em que o medo parecia ser patológico, tamanha a sua intensidade. Para não identificar as pessoas, e respeitar a privacidade, vou contar sobre um fato e vou dar nome ao personagem principal como Welson, um nome diferente, para uma pessoa diferente.

Mas antes de falar sobre o Welson, vamos falar um pouco sobre o que seja o medo. Não existe explicação sobre o fenômeno medo. Vejam que tem pessoas que tem verdadeira fobia por baratas. Quando veem uma pequena barata se arrastando por dentro da casa, ou mesmo fazendo uma incursão noturna dando aqueles voos rasantes, causam um alvoroço nessas pessoas que perdem totalmente o controle. Essas mesmas pessoas em outras ocasiões, que não envolvam baratas, são valentes e destemidas. Como explicar isso? É extremamente difícil e complicado explicar o inexplicável.

Da mesma forma encontramos pessoas que tem fobia por ratos, por moscas, morcegos e outros inocentes animais e insetos da natureza. Porém, cada qual com sua fobia, não é mesmo?

Mas e o Welson? O medo dele parecia ser hereditário, porque todos seus irmãos apresentavam o mesmo sintoma. Só que o do Welson era mais acentuado.

E olha que ele era motorista de caminhão e viajava por todo esse Brasil de meu Deus, sempre sozinho transportando carga de cerâmica para os Estados do Norte e Nordeste do Brasil.

Vale salientar que Jaboticabal é uma cidade onde havia várias Cerâmicas, fabricantes de filtros para água, e dentre elas se destaca a Cerâmica Stéfani, fabricante dos Filtros São João, de uma qualidade ímpar, e que, ainda hoje, é vendido para todo o país.

Bem, e o Welson? Como motorista ele viajava enfrentando estradas dia e noite, sempre levando e entregando sua carga com todo profissionalismo.

Bem, naquela época, havia na cidade um bar, era o Bar do Agostinho, que era irmão da minha cunhada Ivone, esposa do meu irmão Gilberto. No Bar do Agostinho era feito o melhor Sanduiche Bauru da cidade. Ele funcionava das 10:00 horas do dia até às 04:00h da madrugada. Todos os boêmios da cidade, que ficavam até altas horas pelas ruas, tinham parada obrigatória no Bar do Agostinho para reporem as energias gastas durante a noite, nos mais diversos esportes praticados durante a noite. Se é que entendem o estou dizendo.

O Welson, nessa época havia alugado uma edícula no fundo de uma casa, onde morava sozinho, embora já estivesse namorando e com planos de casamento. A edícula tinha entrada exclusiva, separada da casa da frente por um corredor. Assim, a qualquer hora do dia ou da noite que o Welson chegasse, não havia problema de incomodar ninguém com a sua chegada ou saída da sua casa.

Quando o Welson vinha do namoro da sua futura esposa, a quem ele chamava de Dona Sinceridade, já lhe assaltava o medo por ter que ficar sozinho na sua casa (edícula) até o amanhecer do outro dia. Mas medo do quê? Nem ele mesmo sabia, mas quer era medo, era, não tenham dúvidas.

Assim, vejam a sua estratégia, ele passava no Bar do Agostinho, comprava um Bauru para comer, e outro que ele usava para atrair cachorros da rua que ele levava e prendia no quintal da sua casa, para lhe dar uma sensação de segurança durante a noite. Ele ia dando pequenos pedaços do lanche (Bauru) para os cachorros que formavam uma verdadeira procissão a lhe acompanhar. No outro dia, logo cedinho, para os vizinhos não desconfiar, ele soltava aquele batalhão de cachorros na rua. Era uma verdadeira festa.

Agora vejam um relato contado a mim pelo próprio Welson. Apesar dos cães que ficavam no quintal da casa, para lhe dar sensação de segurança, certa noite, a porta do quarto estava aberta, e da cama onde ele estava deitado, dava pra ver o vitrô da sala, por onde entrava a claridade das lâmpadas da iluminação pública. Assim, ele olhando para o vitrô, e viu algumas sombras fantasmagóricas se mexendo. Foi o que bastou. Embora fosse o mês de junho, em que a temperatura, principalmente à noite, sempre é mais baixa, mesmo assim, ele começou a suar frio, e o medo se instalou no seu pensamento. O que seriam aquelas sombras? Seriam almas de outro mundo? Seriam ladrões querendo entrar na sua casa? O pânico era total! E por que os cachorros não latiam? Teriam sido mortos pelos invasores? Na sua mente já estava se desenhando a cena que ele veria fora da casa, depois do amanhecer. Corpos dos cães espalhados por todo o quintal. E ele temia que o seu corpo pudesse ser mais um deles.

Sua agonia durou a noite toda. Ele nem se mexia com medo de afrontar os fantasmas que o estavam assustando. Pensava: “Seu eu ficar quieto e não me mexer, eles não virão me importunar.” Assim, passou a noite.

Quando, pela manhã, os raios do Sol entraram pelas vidraças, o Welson pode então verificar o que realmente aconteceu. Ele estava deitado na sua cama e estava sob um cobertor de lã. Ocorre que o cobertor não era lá de muita qualidade e já estava com as bordas desfiadas. Da maneira como o Welson estava agasalhado, alguns fiapos do cobertor ficavam na linha entre os olhos do Welson e a claridade do vitrô e, assim, ele via os fiapos através da claridade. Do ângulo em que se encontrava, a visão dos fiapos que pareciam fantasmas, monstros e outras coisas, acabavam sendo ampliadas, o que, da mesma forma, também ampliava o medo que ele sentia.

Ao clarear o dia ele viu que o medo daquela noite, não passou de uma grande bobagem sua, mas, apesar dessa sua constatação, nada disso adiantou para curar a fobia que ele sentia por coisas criadas pela sua imaginação.

O Welson casou-se com a Dona Sinceridade, que passou a dividir com ele suas fobias, porém com uma alteração, pois, quando o Welson ouvia algum barulho à noite, que merecesse uma averiguação, ele ia verificar, mas colocava sempre a Dona Sinceridade na frente, como uma forma de escudo.

Ilha Solteira/SP

08/12/2013 – 12:45h

Daniel L Oliveira
Enviado por Daniel L Oliveira em 08/12/2013
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