Em Algum Tempo

Aqueles finais de semana, que se pareciam os dias “normais” da semana. Nada para se fazer, quando apenas frequentamos escolas e demonstramos alguma eficiência no trabalho doméstico. A reunião com amigos,a decisão sobre quais filmes alugar. Poucos, já que o dinheiro minguava, e quando crescíamos isso tendia a piorar. O terror imperava, sendo que dos três amigos, o terceiro, sempre solicitava um pornográfico. Dizia ser viciado. Não sei se era pelo filme ou pela sensação de estar entre pessoas com o pau duro. Os filmes acabavam, regados a mortadela e refrigerante. O silêncio durante o erótico, sem demonstrar nenhum gesto que pudesse constranger ainda mais os presentes. Nada de olhares abaixo da cintura e nem mãos nessa região. As portas do quarto encostadas, o volume baixo para não despertar a atenção dos pais. Em quase toda casa existe uma irmã, que acaba sendo olhada com malícia, se encontrada após a sessão erótica.

Em seguida, as batalhas diante do vídeo-game. Lutas e corridas para acirrar o espírito de competitividade. Os mais frustrados no dia-a-dia, buscavam resgatar sua auto-estima humilhando os adversários na partida. Piadas, socos nos braços, risadas altas, volume ao máximo. Um que não passava o controle, já que não perdia. Em algum momento, alguém disse que quase o vencera, que foi por pouco. E ele, sério, dizia, “quase não é suficiente. Em cada final de semana a concentração era em uma casa. Na do primeiro dos três, existia uma fartura de mulheres, casa movimentada, duas irmãs, mais primas que visitavam constantemente. Na casa do segundo, poucas mulheres e de poucos atrativos. Na do terceiro, nem eram consideradas mulheres, as que existiam no local. A partida fora interrompida, pelo episódio de um camundongo que corria pela casa, e uma tias pedira ajuda. Os três, armados com vassouras, caçavam aquele Ligeirinho, que não foi encontrado, sendo cogitada a hipótese de ter ido parar em outra dimensão. Piada de games.

A semana retornava. De volta às chatas aulas. Os professores insuportáveis, com aquelas expressões de cansaço. O de matemática, com aquela voz de pamonha, parecia se arrastar, feito uma lesma, menos asquerosa e mais vagarosa. A imaginação fugia e a matéria ensinada se perdia. Em casa, auxiliar na faxina, vez o outra sobrava algum trocado, feito uma pequena esmola pelos trabalhos prestados, que não era remunerados, pelo argumento de ser obrigação dos membros da casa, preservar a limpeza da mesma. E existia outra explicação ainda mais contundente, de que já pagavam dando moradia, alimentação e vestimenta. Os meninos andando pelo bairro, com bermudas, camisetas furadas e chinelos. Tentando comprar cigarros e bebidas em bares e padarias. Aprendendo a dar as primeiras tragadas e suportar o gosto dos primeiros goles de bebida destilada. Os pelos pubianos crescendo, a voz mudando de tom. Os hormônios, ou seja lá que porra for essa, fazendo ficar de pau duro até se caminhar e roçar a própria coxa no pênis.

A televisão, com aquela programação de merda, anima apenas os paralíticos, principalmente os paralisados em raciocinar. Aqueles senhores comentando sobre o noticiário, com o se isso os fizesse mais cultos e bem informados. Os olhares safados para as filhas dos amigos, com aquela disfarçada de velho malandro. Certos olhares também eram para nós, os garotos. Uns veados velhos do caralho. Aquela programação de esporte, como se todo menino fosse obrigado a gostar de futebol, e assistir aquela entediante partida, com aqueles caras, correndo atrás de uma bolinha, e chutando em direção às traves. Gostava quando saía briga e se arrebentavam. Aquela preguiça que faz ficar na cama até os pais irem de expulsar dela. A diversão era roubar um cigarro do maço do pai, fumando na praça, a alguns quarteirões de casa, com olhar de criminosos, preocupado em ser descoberto. Sentindo-se adulto, por soltar aquelas baforadas com treze anos de idade. A vida parece que nunca vai passar, o tempo parece favorecer a idade. Nos sentimos invencíveis e eternos, olhando a vida com desdém. Vendo nos céus as nuvens e tentando imitar suas formas com a fumaça que sai da boca. Talvez chova. Ótimo dia para um banho de chuva. Os primeiros pingos caem no rosto virado para o alto. A sensação é de que sou a própria chuva. Por isso bebo um pouco do que cai, engolindo pequenas porções. Sou tudo, nessa nada que é minha vida.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 16/03/2013
Código do texto: T4191711
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