Errare Humanum Est

Uma noite dessas ouvi uma história indizível, ela representa a torpeza de caráter do ser humano, mas de toda forma, vale a pena que você leia; é lúdica. Meu amigo e eu sorvíamos numa libação, o nosso ritual pagão-sagrado, sempre preparando-nos para mais uma noite de perversão no bar dos descamisados na Mary Sales; que fica no meu nostálgico bairro Irajá. O botequim é um tradicional pé-inchado do bairro, aonde todo suburbano é bem vindo para acomodar-se nas cadeiras enferrujadas com o logo de indústrias de cerveja, a mesa de sinuca localiza-se no centro do boteco, onde você pode perder todo o seu salário em algumas rodadas com o Zé Pretinho e, uma máquina Jukebox para curtir às suas músicas favoritas, além é claro; do famoso ovo podre. Se fosse para escolher algo para representar este lado da cidade, com certeza eu escolheria o bar de Mary Sales! Aquilo sim; representa o subúrbio do início ao fim. Meu amigo e eu bebíamos cerveja ao som de Jesus Chorou do grupo de Rap nacional: Racionais Mc’s e, fazíamos um debate acadêmico dissertando sobre filosofia e verdade:

- Platão faz a distinção de dois mundos: o mundo sensível, que é o mundo tal como conhecemos; o mundo que nós percebemos através das nossas experiências sensoriais e, o mundo inteligível, que é o mundo perfeito das idéias abstratas, o mundo das ideias. Por isso Platão é conhecido como o Filósofo idealista. – Eu iniciara o discurso.

- E o que ele tem a dizer sobre a essência, a verdade sobre todas as coisas? – Meu amigo interava-se na conversa.

- Para ele, a verdade é inata; - respondia-lhe a pergunta – antes de nascermos nós contemplamos a verdade no mundo inteligível (que pode ser entendido como o pensamento, a nossa concepção de paraíso e etc.), mas, no momento do nosso nascimento há um processo de adormecimento dessa verdade. Na teoria das reminiscências Platão diz que: “aprender, é relembrar uma verdade que já existe dentro de nós”.

- Sim, é muito bonito; mas, Michel de Montaigne dissertará defendendo a impossibilidade de alcançarmos à verdade; porquanto amigo, a verdade é um sonho platônico – Meu amigo expondo sua tese cética, como sempre.

Mary Sales ouvindo-nos quis entrar na conversa, e, como é de praxe iria contar-nos uma história leviana, anticristã, pérfida e, com um final cômico; ou seja, tudo que nós gostávamos. Mary, era a mulher mais sádica e cruel do bairro de Irajá, e nós a adorávamos por isso.

- Vocês otários vou contar-lhes uma história que os farão rir até borrarem as calças! Não possui esse papo furado de verdade, filosofia; isso é papo de frescos! Por acaso vocês fumaram “um”, antes de virem para cá, héin?! – Mary, com sua sutileza corriqueira.

- Então conta logo, caralho! – Meu amigo e eu dissemos em uníssono. Mary Sales começou a sórdida história, que confesso não saber ser verdadeira ou falsa, mas como dissera Shakespeare na peça Hamlet: “Existe mais entre o céu e a terra do que supõe a vã filosofia”:

- Eu pegara o ônibus 712, pois necessitava resolver algumas coisas em Cascadura, para variar o trânsito estava horrível, e o calor estava insuportável. Na vileza da viagem naquele ônibus dos diabos, lembro-me que havia um moleque me “encoxando”, pude até sentir o pa... Não, me desculpe, estou desviando-me da história. Mas, aquele ônibus estava um inferno, quando eu morrer e, for para o inferno, acredito piamente que a minha tortura será ficar no 712 lotado por toda a eternidade...

- Então você, que é atéia convicta, acredita no inferno? – interrompi a sua história.

- É claro, pela vida que eu levo você acha que eu vou para o céu? Eu não tenho certeza se Deus existe, mas o Diabo, eu tenho certeza absoluta que ele existe! Sem mas delongas, não me interrompa mais, Merda! Onde eu estava?... Ah sim, eu estava seguindo viagem, quando entrou um Hippie, um cara com os cabelos Dread’s, barbudo, todo sujo, o seu fedor impregnou o ônibus. Quando o ar já estava completamente estagnado com odor nauseabundo do desgraçado, adentrou uma freira, ainda jovem, “comível”. Então o Hippie confessou-se ao motorista:

- Aí motorista... porra, eu sei que é errado, mas eu estou com um tesão nessa freira!

- Há é? – Perguntou o motorista – Mas aí sabe o que você pode fazer para comer ela?

- O quê? – Quis saber o Hippie.

- Essa Freira – explicou-lhe o motorista – todos os dias à meia noite, ela vai ao cemitério de Irajá acender vela para Jesus. Então, você toma um banho, passa um gel nessa barba e nesse cabelo, põe um roupão branco e diz que é Jesus, que ela vai pirar e, vai fazer o que você quiser.

- Boa ideia, farei isso! – Ratificou o Hippie.

Alguns dias depois eu encontrei o Hippie desolado e, ele acabou desabafando. Contou-me que foi ao cemitério de banho tomado, gel no cabelo e roupão branco, e, avistou a freira acendendo vela para Jesus. Então ele aproximou-se e disse:

- E aí Freira, eu sou Jesus!

A freira apavorada berrou de Susto, mas, depois terminou por se maravilhar na presença do senhor:

- Ó, você é o meu senhor? “O que tu queres, comigo”?

- Eu sou Jesus e, quero te comer! Respondeu sorrateiramente o Hippie.

A freira ficou espantada com a vontade do “senhor”, não obstante; é necessário fazê-lo, para não despertar-lhe a ira.

- Bom senhor, eu sou freira; eu só dou atrás – Consentiu a Freira.

- Tá, tudo bem; vira o pandeiro – Ordenou o Hippie.

Então o Jesus fajuto, fez sexo anal com a freira, para com isso não tirar o selo de pureza dela. Porventura, após a orgia profana no cemitério, o Hippie sentiu remorsos e desabafou com a freira:

- Aí freira, preciso lhe contar: eu não sou Jesus porra nenhuma, eu sou o Hippie lá do ônibus. Então a freira também desabafou:

- Ah, não liga para isso não! Eu também não sou a freira, eu sou o motorista...

Diogo Abreu
Enviado por Diogo Abreu em 28/06/2012
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