Flertes

Em um dia qualquer, caminha pela rua já gasta. Aquelas construções tendo pouco a revelar por não desejar mais vê-las. Os rostos que cruzam são indiferentes, ainda mais com o rosto sob um guarda-chuva. Dia de movimentação eletrizante embora com ar de moleza, a chuva fina causa aquela sensação de depressão após um dia ensolarado. No primeiro comércio, um entra e sai, que quando percebe, já está fora.

O balcão de informações com três assistentes em papo descontraído, as perguntas sendo feitas e respostas objetivas selam outro momento de rápido contato. Mas é na saída que surge a surpresa, quando a moça de óculos com lentes arredondadas e cabelos negros, expondo um sorriso simpático, pergunta sobre um ente do passado. Os olhos naquele rosto de boneca demonstram o interesse além da curiosidade, a necessidade de prosseguir um diálogo. O rapaz, capta o sentido e retribui com um derretimento na fala e gestos exagerados.

Ao sair, com o coração batendo exageradamente, desloca-se para um bazar. Pequena loja onde costuma-se entrar quem resolveu encontrar ali algo sem muita importância. Servindo-se do pequeno comércio ara saciar algum desejo menos requisitado. Ainda com a lembrança da figura de porcelana, se depara agora com um sorriso tímido, só que não menos convidativo. Uma mulher com ares joviais, pele mulata, cabelos curtos, roupa justa, embora discreta, mas que deixa ressaltar os atributos físicos. Os dois se embaraçam, um em solicitar e o outro em atender. Por fim, até esquecem embrulhos, saem se despedindo demoradamente.

Por fim, já satisfeito com duas cenas, que apenas uma faria um sujeito feliz por talvez um ano. A passos largos, respingando poças com pisadas firmes. Eis que ergue os olhos em direção a farmácia avistando dentro, no balcão, uma jovem de maquiagem chamativa, com batom rosado que faz crescer-lhe os lábios, protegendo-se com grossa jaqueta sobre o uniforme. Os olhares se cruzam e não se desgrudam, parece que o próprio tempo andou vagaroso naquele instante. Os dois espectadores, mudos, embora o rapaz tenha salivado e engolido o suspiro como a contenção de uma tempestade. Embora a chuva continuasse branda e constante e as pessoas indiferentes, molhadas, apressadas, depressivas, misantrópicas, nubladas.