" MÃEZONA "

Mãezona morava na beira do floresta, no fim de uma trilha

que serpentava entre aroeiras e duendes. Já era muito velha e tinha um olho só que interrogava os curiosos. Morava num casebre coberto de sapê com janelinhas indevassáveis pois eram vedadas por cortinas de renda. Mãezona trançava rendas de bilro, finíssimas como teias de aranha. Dizia que as rendas espantavam mau olhado.

Diziam-na bruxa com conhecimento de mandingas e ervas milagrosas, capazes de levantar defunto. Conhecia o jaborandi, a garra do diabo raríssima, a aquiléa para o intestino, a pata de vaca para o diabetes, a agoniaga para mulheres histéricas, o boldo digestivo, a losna para as bichas, o alecrim para o coração, a alfavaca para dor de garganta, a arruda para cicatrização de feridas, o barbatimão para deixar as mulheres mais apertadas e para o catarro vaginal, o mandacaru poara as aftas, a calêndula para as alergias, a

cana do brejo para as pedras renais, a carobinha para a sífilis, a catuaba para a impotência sexual, a maminha de cobra para picada de insetos, enfim, uma quantidade inesgotável de milagres vegetais aprendidos com seus ascendentes indígenas. Ela dava consultas no terreiro e não cobrava nada, só um ajutório de punhadinho de arroz, feijão ou sal. Plantava abóboras que cresciam na terra fértil.Nas épocas fazia curau, pamonha e doce de cidra com rapadura que minha mãe experimentava com cara de nojo. Puxava terço nas festas mas fazia o "Nome do Padre" ao contrário, diziam que a cruz ficava de cabeça para baixo e as pessoas ficavam desconfiadas.

Mãezona contava "causos" pra meninada que fascinada ouvia histórias do Boitatá, da Uiara, do Saci, da Mãe de ouro e da Caipora que era mulher que namorava padre.

Quando eu aparecia de pescoço destroncado, e Mãezona cerzia sobre o lugar um paninho, enquanto dizia palavras incompreensíveis e abria a boca como se fosse dormir com caretas.

Sarava incontinente, Mascava tabaco, cuspia longe, todo mundo morria de medo de suas pragas.

Não matava galinha na degola, só destroncava e bebia o sangue quente. Meu pai dizia: "_O que ela sabe fazer de bem feito é ser esperta."

Ao passarmos perto do arbusto certo, meu pai dizia: "_Aquela é a pata de vaca", então colhíamos um punhado de folhas medicinais, e cá entre nós, também pensávamos: "_O que não mata, engorda."

permiano colodi
Enviado por permiano colodi em 11/05/2012
Reeditado em 11/05/2012
Código do texto: T3661922