ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 10
ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 10
Rangel Alves da Costa*
Sem saber o que fazer diante daquela fotografia e da notícia estampada no jornal, até mesmo porque tinha certeza que nada havia acontecido com sua mãe, Zezinho colocou a parte do jornal que lhe interessava embaixo do braço e saiu quase correndo em direção a uma pracinha nas proximidades.
Chegando ao local, encurtou o passo e, como quem não queria nada, foi sentar bem ao lado de um senhor de cabelos e bigode totalmente embranquecidos, que estava ali parecendo todo contente observando a movimentação ao redor. Sorte que o tempo estava nublado e soprava um vento agradável na pracinha, do contrário seria impossível estar sentado no local em plena manhã.
O senhor achou de bom agrado dividir o banco com o jovem visitante. Perguntou se o menino estava bem e este, após afirmar que estava passeando e sentou para descansar um pouco, aproveitou para ir bem ao ponto onde queria:
"O senhor, que deve entender mais de leitura do que eu, poderia ler essa notícia aqui – Mostrando o jornal – inteirinha pra mim?". E o homem respondeu: "Mas claro, será um prazer, mas na sua idade já deveria estar um mestre no conhecimento das letras, está entendendo?".
"Eu sei ler, e até já li, mas é só pra poder entender melhor o que diz aí", falou Zezinho, querendo esboçar um sorriso em meio ao nervosismo. E o outro continuou:
"Então vamos lá. Diz aqui exatamente o seguinte: "Ontem, por volta das seis horas da noite, a senhora Maria Rosa dos Santos sofreu um ataque súbito do coração no terminal rodoviário e veio a óbito. Segundo testemunhas, a mulher se encontrava totalmente aflita porque no tumulto do terminal havia se perdido do filho menor, de nome Zezinho, com quem iria viajar para o sul do país. Depois da intensa procura e de não ter encontrado o filho, a mulher começou a se desesperar e isto pode ter provocado o mal súbito que a fez cair sem vida em meio aos passageiros. O corpo foi recolhido pelo serviço de atendimento funeral da prefeitura para a tomada das providências cabíveis". Então é isto que está escrito aqui. Mas posso lhe fazer uma pergunta?".
E ao olhar para o menino enxergou a tristeza, a angústia, a dor e o sofrimento em pessoa. Para quem já estava abatido pela violência sofrida e pelo internamento no hospital, a confirmação da notícia chegou como um baque difícil de suportar. Zezinho chorava de cabeça baixa, com as mãos nos cabelos, procurando não demonstrar que estava sofrendo.
Vendo o menino daquele jeito, o senhor se espantou: "Mas o que está acontecendo meu filho, foi a notícia do jornal que lhe deixou tão triste assim? Vá, me diga...". "Não, nada não. É que esqueci de deixar desarmada a arapuca de pegar passarinho...".
"Mas isto não seria motivo para choro e tristeza tão grande assim. Tenho certeza que o seu estado tem a ver sim com a notícia que li. Por favor, pode me falar, me diga a verdade. Foi a notícia que li? Você conhece essa mulher que o jornal informa ter morrido na rodoviária? Era alguma conhecida ou parente sua? Vá, me diga..."
E Zezinho levantou a cabeça, limpou os olhos molhados com a mão, procurou respirar fundo e depois disse em voz baixa: "Se essa notícia que tá aí for verdade, a mulher que morreu é a minha mãe. E se ela morreu a culpa é minha que me soltei da mão dela e fui subir naquele outro ônibus. Se eu não tivesse feito aquilo ela não ia ficar me procurando, não ia ficar preocupada, doente, e não teria acontecido nada com ela...".
E o senhor, totalmente estarrecido com essa novidade, interrompeu para falar:
"Mas é verdade o que está dizendo, meu filho? Você tem aí algum documento, alguma coisa que comprove que é realmente filho desta mulher que morreu e cujo retrato está aqui no jornal?"
"Ter documento eu não tenho não. Não tenho nada. Mas um filho conhece o retrato de sua mãe, sabe o nome dela e sabe onde foi a última vez que deixou ela. E quando aquele ônibus saiu comigo dormindo dentro dele, ela ficou na rodoviária, e ficou lá porque a gente ia viajar. E eu vim parar aqui mas tava fazendo tudo pra ir pra lá, pra rodoviária encontrar ela pra gente viajar. É que eu só tinha minha mãe na vida e agora...".
E agora era o senhor que deixava escorrer uma lágrima pelo canto do olho. "E agora o que?", perguntou.
"Agora eu não tenho mais nada na vida, mais ninguém na vida. Meu pai já morreu e agora minha mãe também. Eu também quase morro. Agora eu tenho que me virar sozinho na vida. Se ao menos eu tivesse lá no sertão...".
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com