Uma Simples Mulher II               Capitulo 12

Ações e Reações.
 
Relendo as anotações daquela época, percebo tantas coisas…
Muita coisa mudou em mim, mas outras permanecem insolúveis até hoje.
Vejo o quantas bênçãos eu recebia fazendo as meditações do Rajneesh e como não dava valor: quantas percepções, quantas jóias de sensações, quanta vivacidade!
Ao mesmo tempo, deixava-me influenciar pelas conversas com as amigas (que tinham enveredado por outros caminhos), pelos negativismos que ouvia, pelos queixumes e apatias.
Tenho vontade de dar uns tapas em mim!

Eu sentia demais o fato de as amigas estarem distantes do Mestre, seguindo o caminho espiritual que a professora de yoga estava trilhando: era um caminho de renúncia total à vida, de esperar a morte como uma bênção.

E eu, em vez de ficar com aquilo que me dava tantas alegrias, em vez de confiar nas minhas sensações e afastar aquelas conversas angustiantes, ficava em dúvida e deixava que o desespero e o tédio tomassem conta de mim.
Não percebia que , na verdade, o que havia na minha vida era calma, sossego e que tudo havia melhorado.

Cheguei ao final de 1983 com essa sensação de vazio, de solidão e achando que meu caminho espiritual estava parado. Mas quando eu continuava com as meditações, sentia muita alegria.

Fomos passar o Ano Novo na nossa casa de praia. Levamos conosco um casal de amigos e os dois filhos pequenos.

Essa amiga, Mary, andava escrevendo umas mensagens muito bonitas, que não sabia explicar como nem porque vinham a ela.
Conversávamos muito.
Eu levei meus livros e fitas e fazia as meditações do Rajneesh.
Uma noite, ela disse que sentiu a presença do Bhagwan e teve a intuição de que deveria ler para mim uma das mensagens do seu caderno. Ela leu: dizia que não existe parada; que nada pára na evolução espiritual.

Foram dias muito bons, nós passeamos, eu estava até feliz; a não ser na passagem do ano, em que chorei e fiquei triste, não sei por quê.

Depois que voltamos, A Mary entrou numa profunda crise de depressão que durou meses; chorava, sofria, ia consultar com um psiquiatra que a proibiu de escrever e lhe deu remédios.

Ela dizia que tinha ficado assim desde o dia em que viu a foto do Rajneesh lá na casa da praia; dizia que tinha sentido uma espécie de tranco, um baque quando viu a foto dele; falava do meu mestre com uma espécie de terror.

Sabe-se lá o que aconteceu; o que despertou nela as nossas conversas, aquela convivência e a presença da energia do Bhagwan.

Toda crise é para o despertamento; hoje ela diz que passou por um grande sofrimento, mas que muito aprendeu e amadureceu.

Eu por mim acredito que se ela tivesse feito as meditações comigo lá na praia e depois continuado a fazer aqui na cidade, ela não teria que ir ai médico, tomar remédios e nem sentir tanto medo e sofrimento.
 
Em fevereiro, fomos passar um fim de semana na casa da praia: eu, o Mauro, as crianças, a minha prima Marylin, e seu marido, Charles.

No dia 4, sábado, fomos passar o dia em uma outra praia próxima; o Mauro e o Charles tomaram muitas cervejas.

No final da tarde pegamos o carro para voltar para casa: o Charles dirigindo, a Marylin e a Marília, minha filhinha, na frente; o Mauro eu e o Armando atrás.
Quando fomos entrar na rodovia, vinha vindo um Fiat em alta velocidade; o Charles ficou indeciso, entrou; o carro nos pegou em cheio na lateral.
Foi horrível. Só me lembro do instante da batida, mais nada.

Fui acordar no hospital, numa maca, só via a Marilia me olhando e chorando, o Armando chorando, mas graças a Deus, estavam bem.
Eu tinha tido um forte tranco no pescoço, que me desacordou; a minha prima estava com o rosto cheio de cortes, mas foi só isso. O Armando fraturou a omoplata; o Charles não sofreu nenhum ferimento, mas estava tendo um ataque de nervos: gritava e chorava. A Marilia não sofreu nenhum arranhão: era pequena e esperta, disse que na hora sentiu o perigo e se encolheu toda na frente do carro.
Já o meu marido,Mauro, ninguém sabia dele, tinha sumido, não sabíamos se estava vivo, um desespero!

Mais tarde, depois que tivemos alta, conseguimos localizá-lo: tinha sido levado para outro hospital; estava internado; tinha fraturado algumas costelas; por pouco não foi operado por suspeita de perfuração do pulmão direito.

Depois de uns dias, quando fomos visitá-lo, ele declarou:
-Não fico mais aqui. Empreste-me a sua bermuda, vou sair daqui agora com ela.
Ele tinha sido internado de maiô: não tinha roupas para ir para casa!

Fui ao carro, tirei a minha bermuda, que era daquelas bem largas, dei a bermuda para o Charles levar e fiquei no carro, sem bermuda, só de calcinha, esperando.
Ele vestiu a bermuda e saiu de fininho, descalço e sem camisa...

No final acaba virando uma comédia e rimos muito, mas na hora, quanto desespero!

Voltamos para AraCity todos estropiados, parecia que estávamos vindo de uma guerra, todos num carro só porque o carro do Charles ficou arrebentado.

Demoramos a nos recuperar; o Mauro foi o que mais sofreu: ele gemia tanto à noite que pela primeira vez na minha vida soube o que era sentir compaixão por alguém.

Por sorte, a nossa empregada trouxe erva de santa Maria, fizemos uma compressa com a erva bem moída, óleo e sal. Pusemos à noite no peito dele, envolvendo com uma gaze e, incrível, na manhã seguinte ele não tinha mais dores!

Ficamos tão abalados e assustados que até perdemos o gosto pela nossa linda casa de praia.
Após alguns meses apareceu uma oferta e a vendemos!
Na época eu não entendia, nem o porquê do acidente, e nem porque vendemos a casa! Mas depois comecei a entender...
Que pena que vendemos a casa...
 
Esse ano de 1984 foi muito rico em acontecimentos, buscas, aventuras psíquicas e espirituais.
Eu diria que foi o ano mais louco da minha vida, literalmente falando: lidei com o material do qual a loucura é feita e só não enlouqueci porque esse não era o propósito da minha vida!...
                                       continua...
Malu Thana Moraes
Enviado por Malu Thana Moraes em 08/02/2010
Código do texto: T2076082
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