Capítulo 5 – Um Obstáculo Vencido.

Cheguei à primeira serie do ginásio. Naquele tempo havia o curso primário, que era da primeira até a quarta serie e só um professor por cada turma. Depois havia um exame de admissão para o ginásio, e então era tudo diferente; vários professores no mesmo dia, um para cada disciplina. Fiz um curso de admissão e estudava num livro grosso que tinha todas as matérias: era um livro muito bom, tinha mapas, ilustrações; e eu me sentia fascinada pelos novos conhecimentos.

Prestei o exame no Colégio São Bento. Na época, meu pai era Inspetor de Ensino; esse colégio era supervisionado por ele e nesse caso eu não pagaria apesar de ser um colégio particular.Para minha surpresa, passei! Achava que não iria passar, que não sabia nada, era tudo tão difícil! Será que o meu pai deu um empurrãozinho?  Não sei...

O uniforme era lindo: blusa branca, saia pregueada bordô e, o mais charmoso, gravata bordô combinando com a saia! O diretor, professor Walter, era muito exigente e mandava que verificassem todos os dias na entrada o comprimento das saias.

Era uma briga porque já estava chegando a moda das saias curtas; mas ainda se usava muito aquelas saias rodadas mais compridas. Era o tempo do rock and roll, e eu ia, escondido de meu pai, na Casa Barbiari e comprava (mandava marcar na conta dele) LPs do Elvis Presley, da Celly Campello e escutava  “Estúpido Cupido” até furar o disco em alto e bom som! Eu adorava o Elvis Presley, comprava revistas com suas fotos, era fã de carteirinha!

O ginásio era uma experiência nova todos os dias: vários professores, cada um na sua matéria; Professor Malaman, bonachão e paciente, lecionava historia; Professor Machadão e Professor Machadinho (acho que eram parentes!); o inesquecível professor Jurandir, uma fonte de sabedoria, lecionava português; Professora Teresa nos ensinava os compassos de musica, Professora Lilica, minha parente, lecionava Frances; Professora Gessy, matemática e a matéria mais difícil para mim, por incrível que pareça, trabalhos manuais!

Foi aí que me enrosquei! As outras matérias até que eu ia levando bem; os professores eram sérios, ninguém mais ficava orientando, olhando os cadernos e os deveres de casa como no curso primário; era cada um por si e Deus por todos. Mas não havia meio de eu conseguir fazer os tais “panos de amostra” onde eram bordados diversos tipos de pontos, um pedacinho em ponto cheio, outro em ponto cruz, e por aí afora. Também tinha que levar agulhas para tricô e as lãs; e eu nunca levava. Até hoje eu não entendo porque isso acontecia; minha mãe e minha irmã sabiam fazer tudo isso e em casa tinha todo esse material... Mas agora vejo que era uma época de revolta: eu não queria ser como elas, queria dançar rock and roll e usar saias curtas!

Um belo dia levei um “chega pra lá”!  A professora me intimou: se eu não trouxesse o tal paninho com todos os pontos bordados eu não entraria mais na sua aula! Conclusão: eu não ia à escola nos dias que tinha aula de trabalhos manuais! Arrumava meus materiais, me vestia, escondia os cadernos num cantinho do jardim e, detalhe! Pegava meu bambolê (brinquedo que tinha surgido naqueles dias) e ia para o clube. Brincava e bamboleava até chegar a hora de voltar para casa.Comecei a ser turista: só ia para a escola de vez em quando...

Por sorte a cavalaria apareceu para me salvar, na figura da tia Leonora! Ela veio passar uns dias na nossa casa e foi visitar uns parentes cujo filho, estudava na minha classe. Lá ficou sabendo do meu “turismo”. Então ela trouxe todos os cadernos do primo; me fez sentar e copiar todas as matérias que eu tinha perdido e me ajudou com o bendito “pano de amostra”. A partir daí não faltei mais às aulas, tomei gosto pelo estudo e só tirava boas notas!

Querida tia Leonora, você foi meu modelo e minha salvação! Você foi a pessoa que me mostrou que era possível uma mulher estudar,trabalhar fora, ser independente, bonita e bem cuidada! Que bom ter tido você na minha vida!

Ela foi professora primária, depois fez Faculdade de Letras, português e francês, foi diretora de escola, viajou para o exterior. Depois de aposentada fez Faculdade de Direito, estudava inglês e sempre tinha um namorado... Acho que eu segui esse modelo em quase tudo!

Bem, a partir daí nunca mais tive problemas na escola a não ser quando entrei na Faculdade de Letras. Que engraçado! Estou percebendo agora que na vida tudo vem em ciclos: as dificuldades se repetem, só que a cada vez fica mais fácil de vencer os obstáculos!

                                                                                                             continua...                                      

Malu Thana Moraes
Enviado por Malu Thana Moraes em 15/10/2009
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