A favor da Correnteza.

Uma casa de dois pisos, onde os quartos ficam na parte térrea. Em uma manhã chuvosa de inverno, a mulher levantou cedo, fez o café para o marido e logo depois que ele foi para o trabalho, ela resolveu voltar para a cama.

Quando avistou a escadaria – que desce para os quartos – olhou para baixo e se desequilibrou, na queda, a mesma se transformou em um gigantesco penhasco onde ela caíra.

A correnteza a levou imediatamente para as profundezas do mar e as ondas lutavam com ela violentamente, batia de um lado ao outro sistematicamente sem parar, A água furiosa de cor caramelo, fazia com que a gravidade competisse com a sua respiração e ficava cada vez mais difícil respirar. Sem muito ar, ela tentava desviar das volumosas ondas que a levava cada vez mais para o fundo. Profundamente cansada e desesperada com a situação, sentiu que não significava mais nada diante daquela imensidão de água. A correnteza a levava e ela lutava para se manter acordada, reservando as possibilidades do pouco oxigênio que ainda lhe restavam.

O frio da água já a estava imobilizando e ela sentia que estava se afogando. Tinha certeza que ia morrer.

Não via mais nada, a não ser tudo escuro de um silêncio assustador. Apavorada pensava:

Estou fazendo um passeio desamparado pelas águas, mas, não vou me permitir desistir, Tenho que lutar!

Ao mesmo tempo em que, já não tinha mais forças para lutar, vinha em sua cabeça a possibilidade de sair daquele estado de impotência e dor. Começou a repetir mentalmente para si mesmo: lute, lute, lute até não poder mais...

Na exaustão, o inconsciente a fez lembrar só aquilo que ela desejava, e começou a se acalmar. Pensou em seus filhos ainda bebezinhos em seu colo, no marido chegando em casa e a abraçando depois das viagens estressantes, do seu perfume que ficava na casa cada vez que ele ia trabalhar,

da exata cor de seus olhos, da textura da sua pele, da leveza de sua voz que agora ecoava entre as águas, e tudo estava vindo ao seu encontro naquele sufoco triste que estava vivendo. Sabia que não podia esquecer daquilo tudo que vivera, porque estas lembranças seria agora para ela, a verdadeira prova que existe felicidade e, ela não precisava mais lutar para ser feliz, um alívio para aquela dor – a dor da decepção –,

de estar completamente sozinha!

...E, sozinha, ela ainda continuava a dormir.

Quando acordou do sonho, o pesadelo ainda continuou. Ela estava confusa, com o raciocínio lento e com a cabeça pesada. Sabia que tinha dormido demais, - mais do que precisava dormir -.

Lembrou de ter tido vários sonhos, todos coloridos e misturados, e continuavam nítidos em sua cabeça, mas, misturados. Sentia algo como se tivesse ido do céu ao inferno, estado entre anjos e demônios e naquele momento para ela estava sendo difícil de abandoná-los.

Tinha necessidade de despertar, mas, alguma coisa ainda a prendia na cama. Não sabia exatamente o quê, só sabia que tudo permanecia e ela queria colocar os pés na realidade, queria novamente ter a sua vida de volta para fazer as coisas comuns que a esperava. Não tinha noção de horas, nem de dias, e seus olhos relutavam para abrir numa sensação estranha e absurda: se via saindo da cama e fazendo todas as coisas do cotidiano normalmente, ao mesmo tempo em que o seu corpo permanecia intacto e impotente nela, sem conseguir fazer nenhum movimento, tentava com muito esforço sair daquele estado e, não conseguia. O inconsciente trabalhava, mais seu corpo não a ajudava, sentia-se numa sensação pesada e lenta, como se estivesse flutuando, completamente sem forças e, a mente vagando sem solução.

Com muito esforço sentiu que longe dali, alguém a chamava.

Olhando para ela e assustado com as expressões que ela fazia dormindo, seu filho gritou:

- Mãe,

Ela num misto de alívio e terror, disse:

- O quê?! Eu morri?! Diz que eu morri.

E sentou-se na cama, assustada.

Ele sem saber o que dizer, sentou ao seu lado e disse:

- Qual é o problema, mãe? Você não esta morta.

Pegou nela e movimentou seus braços, até que ela sentiu a realidade.

Acordada, ela perguntou a ele porque não conseguia se movimentar depois do sonho,

e ele lhe disse:

- Pode ser que você tenha tido um pesadelo e por medo, não estava conseguindo se movimentar.

- Não, não é isso. Eu caí dum penhasco e fui parar na praia e, foi como estar no inferno com todos os demônios juntos me infernizando.

- E, daí o que você fez pra sair daquela situação?

- Eu lutei.

- E, conseguiu?

- Sim, eu fui para o céu!

Lila Garcia
Enviado por Lila Garcia em 30/07/2009
Reeditado em 30/07/2009
Código do texto: T1727238
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