Que a hiprocrisia não nos contamine - BVIW
Kátia entrou no restaurante com o marido. Usava a melhor roupa entre as que ele havia comprado para o enxoval de noiva dela. Era a primeira vez que ia conhecer os colegas de trabalho de Otávio. Não fazia, ainda, a menor ideia de que eles conheciam a história inteira do casal. Descobriu meia hora depois, após usar o banheiro feminino e as mulheres passarem a preferir o masculino.
Puta. Sim, não ia esconder o passado só para ser aceita entre os amigos do marido. Foi com esta profissão que pagou as contas por uns dez anos, após ser abandonada pelo marido abusador. Deixou o cabaré depois de Otávio insistir que fosse só dele. Pagaria uma mesada no mesmo valor do faturamento dela. E ainda faria casamento com papel passado.
Ela passou dois meses para decidir. Enquanto isso, o quase noivo, ansioso, desabafou para um vizinho de mesa na repartição. Na mesma semana toda a secretaria só falava da coragem dele em ficar com uma mulher da vida. Comentavam pelas costas, especulavam se ela seria fiel, se ele ia dar mesmo para a tal mulher, o sobrenome Penadiel, herdado de um antepassado ibérico.
Agora, ali no restaurante, entre as várias mesas ocupadas pelos servidores da secretaria, apenas a de Kátia e Otávio Penadiel havia ficado isolada com o casal. Os amigos pediram até as cadeiras restantes, para se amontoarem com outros colegas. Kátia segurou o sorriso. O marido não largou sua mão. Conversaram mil outros assuntos, de preço da carne à violência no trânsito.
Otávio de vez em quando escrevia em guardanapos. No meio da festa levantou, foi de mesa em mesa e entregou, para as esposas dos colegas, uma relação com os nomes de todos os homens da secretaria que frequentavam o mesmo cabaré. O casal Penadiel, em seguida, foi para casa, para gozar, sem falsidade, o prazer de suas noitadas.