Caridade de mãos e braços - BVIW
A mão esquerda não deve saber o que a direita faz. Esta é a verdadeira caridade. Mary cresceu ouvindo a mãe, uma católica-espírita repetir isso para ela e os três irmãos menores, para doutrinar o caráter da meninada.
Solidária, Mary dividia na escola o lanche com quem não tinha comida. Emprestava roupa para amiguinhas antes mesmo de inaugurar a novidade no próprio corpo. Tudo em silêncio. Absorveu os ensinamentos da mãe.
Agora, como secretária de escola, vivia um dilema. O seu novo chefe, Jorge Xerxes, ainda se adaptando na instituição, pedia ajuda a ela mais que o horário de trabalho permitia. Mary não falava dos dissabores para nenhum colega.
Mas todos na instituição reconheciam o suporte que a funcionária dava ao chefe. Diziam que Mary não era só o braço direito dele. Era o esquerdo também. Se fosse possível ela tirar um dos braços, o homem despencaria sem saber o que fazer. Todos viam sua dedicação silenciosa, menos o chefe.
Após um descanso de dez dias de férias – liberado sob protestos – Mary viu que não aguentava mais o tranco. Tirou foto dos dois braços, em tamanho natural, deixou na mesa do chefe com o pedido de demissão e saiu cantando:
- Deixa a vida me levar, vida leva eu.