UMA LAMPARINA PARA TI MESMO: A VIDA COMO RESSOAR DE UM SINO
 
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Por Leont Etiel
 
O dia surgia, e antes de iniciar o seu percurso, Ravi Sharma parou um pouco e observou a longa estrada que tinha diante de si. Deu uma vista de olhos no horizonte que ela lhe apresentava, e, de chofre, foi tomado por uma sensação originária de um manuscrito tibetano que diz, em sua capa, viver sem arrependimento.
Essa sensação levou Ravi à conclusão de que os pensamentos dominam a nossa atenção. Foi como se lhe fosse dito o seguinte: “Pela noite, adormecemos logo depois de o derradeiro pensamento ter desaparecido no vazio. Quando despertamos, no dia seguinte, o primeiro pensamento já está ali, a esperar.” Assim, uma ilação surgiu às conjecturas de Ravi: é como se houvesse alguém em nossa cabeça, um ente independente chamado eu, responsável pelos nossos atos. Mas, ao se desviar desse raciocínio, outro que se lhe chegou foi que a crença nesse eu revela uma falta de insight sobre a natureza da mente, o que significa afirmar incapacidade de perceber que mente quer dizer nossa reação a estarmos vivos.
Essa reação, calculou Ravi, pode corresponder à ideia de portais da liberdade, ideia presente no manuscrito já referido. Sendo “a mente reagir a estar vivo”, a liberdade é forma e condição da existência, não se devendo perder de vista os seus portais. No primeiro, está escrito: “esqueças o passado”. Não fiques preso ao que te sucedeu antes, pois, caso contrário, poderás desperdiçar o que a vida tem a te oferecer. Encares o passado como uma cidade que ficou para trás. No segundo portal, pode ser lido: “participes do que está acontecendo agora”. A imersão no presente é a chave desse portal. Dessa imersão pode-se ver o terceiro portal, que diz: “não te curves a impulsos egocêntricos, entrega-te ao que fazes, sem presunção”. Desse modo, não demora muito e logo se avista o último portal da liberdade e a sua recomendação: “não percas tempo vagando pelo futuro, como decorrência do imperativo de expectativas”. Em ilação aproximativa, uma síntese do apontado pelos quatro portais se assomou à mente de Ravi: “Não estando preso ao passado, imerso no presente, não capitulando perante o egocentrismo e sem estares submetido  ao controle do imperativo do futuro, estarás livre”.
Após as mencionadas deambulações de raciocínio, ainda parado perante a estrada, Ravi Sharma observava agora o sol se levantar. Ele brilhava de um modo como se dissesse “sejas uma lamparina para ti mesmo”. Uma fagulha que te conduz a tirar o máximo proveito da vida, dado que, quanto mais plenamente as coisas são experimentadas, mais facilmente os seus ensinamentos são aprendidos. Sob estes lampejos, Ravi mudou de posição na estrada, olhou para trás e assentiu que, quando se faz isso lembrando dos acontecimentos pretéritos, não há que ter arrependimentos, pois o que foi vivido foi o que a vida apresentou naquele momento.  Devem então ficar no passado. Seguindo a sua viagem, era agora acompanhado por outra convicção: na vida, tal qual o badalar de um sino, o que importa é que cada novo ressoar crie mais magnitude, cada tom viaje mais longe até o som, no caso a existência, se ampliar infinitamente.
Leont Etiel
Enviado por Leont Etiel em 19/10/2019
Reeditado em 19/10/2019
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