Flutuar.
Se me perguntassem há dois anos o que eu mais gostava de fazer para passar o tempo, eu responderia "escrever". Mas hoje tudo está diferente, não sei muito mais sobre o que escrever, ou porque escrever. O sonho de ser escritor se foi com a minha infância. Exceto por alguns poemas tortos e murmúrios arbóreos que me aparecem vez ou outra, nada mais flui naturalmente de mim como costumava ser. Eu acredito que todos nós nascemos cheios de algo especial, um fluido colorido que preenche todo o nosso corpo com brilho, criatividade e talento, mas estando expostos à crueldade deste mundo, começamos a vazar, através de furos em nossos corações. Tudo o que há de belo vai se esvaindo aos poucos, às vezes depressa.
Ainda sou jovem, ainda há muito o que vazar. Fico imaginando o que acontecerá no dia em que eu já estiver totalmente vazio. Se me perguntarem hoje o que eu mais gosto de fazer, eu responderei que gosto de boiar no mar, antes da maré agitada, apenas ouvindo o barulho reconfortante do mar, sentindo a água, horas fria, horas quente me envolver e a luz do sol queimando minha pele. Exceto por esta última, acredito que é mais ou menos assim que os fetos se sentem quando estão nas barrigas de suas mães, envoltos no fluido colorido que também os preenche. Talvez estar vazio facilite a flutuação na água salgada. Pelo menos um propósito para isso.