/Farsa-farpas/
Para ler ao som de Só as mães são felizes
Eu era uma farsa, às vezes com boa direção, outras nem tanto. Um despojo. O apojo, a primeira cena, a mentira travestida. Um anacoluto, frase quebrada, verso em desvio. Venho da Itália, da Alemanha, de um Brasil interiorano. Sou de um estado não sei quê de confusão. Invento a todo instante umas estorinhas de bicho papão para me manter na linha. Venço os medos por puro cansaço. Por preguiça de seguir, vou-me indo sem estrofação, sem parágrafo, sem travessão. Fui feito para uso exclusivo de quem me ama. Não aceito. Estou tão, quieto demais, bobo demais. Um “estroncho”.
Gosto daquilo feito assim. O teu sonho como um caminho dado, de velas; cera amarela a escorrer. Deixando marcas nas mãos magras, de calos. Eu vario, tu varias. Eu; vários, tu nem tanto. Na cama, os pés no travesseiro, as mãos na parede.
“Tô cansado, poxa! Tô numa m*!”
De braços sujos, de camiseta rasgada, com o último trocado indo pro cigarro. Não sei mais por onde ir, a quem seguir, o que fazer dessa coisa morna que a minha vida é. Sempre querendo coisas que as pessoas não sabem me dar, ou que não podem me dar. Sei não! Totalmente poluído pela incredulidade, um ser de grampos, que prende tudo o mais e não consegue descartar. Um destino de fracasso. Sem cavalos brancos, ou príncipes louros e de cabelo cerradinho. Fui afastando os menores traços de paz, de bem, de religião e de sorte. Uma lâmina, um copo descartável na pia do banheiro. Uma veia, algumas veias, saltadas esperando o corte. Um sangue vermelhinho, nem rubro o é, a escorrer. Era. Já era. Foi e nada poderia voltar. Eu quero mamãe, o seu regaço apertado, os seus seios grandes, as suas costas cheirando a leite de rosas. Eu quero papai, sem características, só ele, completo e complacente.
Tarde demais. Sangue, muito. Cambaleante. Telefone. Telefonema.
Um oi; estou ainda aqui, preciso de ajuda, amo vocês.
Um quarto, uma cama, cerejas e meu queijo preferido. E eles me amavam, me armaram.