O Mar, Mariana, e Marina
Quando a lama chegou ao mar, Marina, que é meio ondina, percebeu que precisava mudar. Parou de chorar por Mariana, de orar por Paris, e de chamar de hipócrita quem não pintava bandeiras do Quênia ou do Mali.
Se olhou no espelho, e notou que tinha muita coisa errada ali. Nela.
Acordou no dia seguinte, decidida a se tornar um ser humano melhor do que era.
Marina não virou hippie. Também não tentou propor outra forma de vida. Perda de tempo. Sabia que diriam que ela ‘viaja’. Sim, porque é mais fácil desqualificar o interlocutor do que os seus argumentos… Enfim, foi para a rua. Para a rotina.
Abandonou o discurso falado e partiu para o persuasivo exemplo.
Entendeu que um mundo de paz deveria partir de cada um e, assim, respirou fundo todas as vezes em que a empurraram e esmagaram no transporte público lotado. Não revidou quando aquela pessoa folgada pisou no seu pé. Não arrumou encrenca quando uma senhorinha atirou cascas de mexerica no vaso de plantas do seu quintal. Afinal, mais eficaz do que condenar atos de intolerância, é praticar a tolerância. E como é difícil essa prática!
Ao fazer comida, à noite, jogou no lixo algumas embalagens de molho de tomate pronto. Neste momento, notou que vinha sendo meio hipócrita, já que, como a Samarco e tantas outras empresas, ela , pessoa física, também poluía o meio ambiente. Entristeceu. Como fazer, neste mundo moderno, para sobreviver sem destruir?
De tanto pensar, encontrou algumas respostas, e começou a agir.
Trocou o supermercado pela feira livre, de sábado e de quarta-feira. Ali, na beirada da pia, Marina notou que seu lixo tinha uma aparência muito mais inofensiva. Sorriu.
Sorriu mais ainda, quando percebeu que as suas amigas, aos poucos, também haviam modificado a sua rotina. E que a sua sobrinha, Sophia, tão pequena, já pedia abobrinha no lugar da batata frita. Por essa simples opção, aquele óleo da fritura deixou de poluir muitos litros de água. Água como a que agora falta ao povo, que antes usufruía do Rio Doce.
O amor pelo mar modificou Marina. O amor, e não o contrário. Quantos amores serão possíveis? Mais amores, então, e menos mísseis.