A história de José, o besouro
Esta é uma história triste. Tá, não é um daqueles romances que arrebenta corações onde alguém morre jovem e deixa outro alguém apaixonado chorando por ele, mas, não deixa de ser uma história triste. Não espere muita coisa, não sei nem se recomendo que leia isso, só queria que a felicidade e infelicidade de um pobre besourinho não ficassem perdidas no tempo, esquecidas, embora eu imagine que estas linhas simples não serão suficientes para honrar a memória do coitado, mas será uma forma de guardar sua memória. Vamos aos acontecimentos: José (vou chama-lo assim porque acho José um nome de sofredor, mas não sei seu verdadeiro nome, ou se insetos tem nome ou se o chamavam apenas de besouro mesmo) não tinha atingido nem metade da idade que os insetos costumam viver, quando conheceu seu grande amor, Carla. o problema é que esta não era um besouro como ele e sim uma mulher.
O bichinho não precisou olhar duas vezes para cair de amores pela moça. Descobrindo onde ela vivia, passou a morar em sua janela, admirando de longe sua graça e beleza. Quando ela saía, ele ousava entrar no quarto para sentir seu perfume. Carla estava em seus sonhos, mas José sabia que aquele amor era impossível, mas o amor não é uma destas coisas que a gente é capaz de controlar, mesmo quando reconhecemos que ele é inalcançável continuamos desejando que se realize. José continuava caindo de amores.
Foram muitas as vezes que José a fazia favores, os quais ela jamais perceberia. Desde que o besouro decidira viver ao lado dela, ela nunca mais precisou usar o inseticida que guardava detrás do computador, pois José espantava todos os mosquitos que ousassem se aproximar da sua amada. Ele era forte comparado aos outros insetos e ela era só sua (era?) e ele só dela, embora ela não soubesse disso. O besouro, entretanto, não era forte o suficiente para trazer-lhe flores, como gostaria, mas trazia o perfume delas guardado debaixo de suas asas e o espalhava pela casa, também trazia pequenas sementes de rosas caboclas e logo mais, Carla teria ao pé de sua janela um maravilhoso jardim amarelo.
Cansado de amar só de longe, José percebeu que acabaria perdendo sua amada, por não ter a coragem de ir falar com ela. Por ter medo de ser esmagado. Já sentia precipitadamente a dor de vê-la com outro, inseto ou humano que fosse. Uma lagarta de fogo de um pé de maracujá ali perto, vendo de longe a aflição do pobre besourinho, resolveu dar-lhe alguns conselhos. Disse que se não arriscasse jamais saberia o que seria, que já ouvira falar de muitos insetos que conseguiram casar com humanos e viveram felizes para sempre. Deslumbrado diante daqueles fatos, por ele desconhecidos, José encheu o peito e tomou coragem para ir falar com Carla, expor para ela o tamanho dos seus sentimentos de inseto. Voou lentamente na direção dos lindos olhos castanhos da amada, para melhor ser visto, ia abrir a boca quando num gesto ágil, Carla pega o inseticida, agora pouco usado, e borrifa contra o pequeno besouro. Tamanha quantidade que, zonzo, José viu apenas a imagem duplicada de sua amada antes de bater as botinhas de besouro. Não poderia morrer de forma mais maravilhosa, senão olhando para sua amada.
Desculpe-me por fazê-lo gastar seu tempo com esta história que, acredito eu, não terá a menor relevância para você, afinal José era apenas mais um inseto como outros quatro milhões que voam e rastejam por aí, mas eu ainda acho que José merece ser lembrado. Isso cabe a você decidir.