Beco sem saída
Podiam-se adivinhar os seus cabelos apenas por um fio derramado sobre a cama de lençóis brancos. Era de um castanho forte e levemente ondulado. Caíra ali pelo gesto constante de tatear aquele emaranhado entre os dedos longos. Roberto estava às voltas com o perfume dela, entranhado nos travesseiros tanto menos quanto em sua carne exasperada de manhã, desperta após o desejo. Ainda exausto, porque saciado, nu e inerte, fitava o resquício da última mulher com quem se deitara. Ela o havia abandonado feito um amante desonroso que, depois de assaltar o sexo, vai embora sem deixar vestígio. Mas ela havia deixado. E doía, já que ele não admitia ser comiserado por fêmea nenhuma. Mais fácil seria ter Roberto fugido, imaginando-a apaixonada em sua procura até o pranto de constatação do elo rompido. Assim ele partiria para sempre do romantismo de suas vítimas, com as calças arriadas e elas na mão.
Pela primeira vez, deu-se o contrário e ele se sentia meio morto, parado tal o fio de cabelo no colchão. Chorou, chorou amedrontado, parecendo uma virgem que deixava de ser da pior forma possível. Deu-se conta do amor só após tê-lo perdido. E perdeu de uma mulher, a que julgava ser sua. Posse. Onde ela estaria? Mal se lembrava do nome, que dirá do número do telefone somado a tantos outros em papéis cretinos dentro dos bolsos. Foram tantas, mas esta era especial. Quem acreditaria? Dizia isto para todas.
Passou o dia, a tarde toda ali, lamuriando-se por dentro, distraindo-se com alguma ficção fácil a fim de esquecer. Não conseguiu, passavam outros filmes em sua cabeça. Então, esperou a noite lhe render a melhor personagem. Para isso, pôs-se bem apanhado após o banho, em um exorcismo sedutor, cismando entre a lágrima e o riso. Arriscou sair. Metido nas melhores vestes, julgou estar pronto para outra. Até cantou pela casa feito um tenor a aquecer-se antes do espetáculo com aquele nervosismo confiante. Ao pegar as chaves do carro sobre o console antigo, encontrou um bilhete roto, nele escrito um endereço borrado. Aonde daria? Seu consolo, talvez. Começou a guiar sem pressa, ponderando a cada esquina sua felicidade. Bares, boates, pessoas, tudo parecia tão convidativo e cheio, que rodava a mesma rua centenas de vezes até encontrar um lugar. Espremia o bilhete em seu punho suado ao volante, de instante em instante, abria e relia, certificando-se da numeração.
Parou de procurar e entrou num bar a tomar alguma bebida leve, isso porque não lhe agradava qualquer sabor e já se considerava bêbado demais para qualquer trago, quando umas coxas grossas sobressaltavam de uma saia justa na sua direção. Seria ela? Adoraria vê-la novamente transpassar os dedos nos cabelos compridos sobre a sua cama, amaria essa mulher como a nenhuma outra, sem fuga, sem medo. Atentou ao que ela bebia para, então, pagar-lhe uma outra, em aproximação decidida. Mal estendeu o pedido ao garçom, este o premiava com um drink oferecido pela morena em questão. Esta erguia a taça, caminhando sensualmente até o assento ao lado dele no balcão. Apesar da música alta e da agitação do local, ele a contemplava numa áurea de silêncio a mordiscar uma cereja confundida entre os espessos lábios de igual cor. Hipnose súbita, Martini após Martini e beijos ardentes desesperados. Ele estava entregue. Mas antes que clareasse a madrugada, ela se ofereceu a conduzi-lo até em casa:
- A minha ou a sua? – A morena perguntou, sacudindo as chaves de Roberto. Quando ele respondeu, pondo o papel amassado nas mãos dela:
- Vamos a este lugar aqui. - Pensou... Por que não?
Eis que ele amanheceu mais uma vez em sua solidão. Não envolto à colcha perfumada de gozos e de rosas feminis, e sim desnudo de tudo, dentro do seu próprio carro jogado em uma curta e estreita rua, fechada num extremo. Sua extrema unção.
Paola Fonseca Benevides
http://lepdopteratura.blogspot.com
Também no TRAÇAS S/A BLOG