Monólogo para seu ego

Olhava-se no espelho do banheiro de um barzinho qualquer, desses que é pouco movimentado qualquer dia do ano, aquela sua cara embriagada e o rosto manchado com o preto da maquiagem que borrara denunciava que ela andou chorando. De volta à mesa do bar, bebia mais uma dose de uísque, não sabia de quantas, era sempre mais uma que perdeu a conta. Em seus momentos lúcidos observava um rapaz pagando uma bebida para uma jovem que acabara de conhecer, invejava os sorrisos que aquela pouca intimidade conseguia arrancar.

-Estúpidos – ria consigo mesma.

O fim era, para ela, mais perceptível que o inicio, porque não existe “Era uma vez” estampada na pessoa que vai criar contigo uma nova história e quando você se dá conta, a história já está acontecendo. Mas o fim é tão preciso, pois é tão familiar. Ela sabia, porém, que aquela cena se repetiria, mas com emoções opostas. Acendeu um de seus cigarros. Aquela mulher, cobiçada, desejada, que agora rir com tão pouco, ainda irá chorar com toda essa indiferença.

O barman analisava aquela linda mulher já desgastada do excesso de álcool.

- Primeiro meros desconhecidos que o acaso dará um jeito de apresentá-los. Tornar-se-ão amigos quando começarem a conversar, e adorarão sentirem-se meio próximos, ir para as festas juntos. Entretanto não conhecerão as verdades da vida do outro, mas isso não será, de fato, um incômodo, não farão questão de saber o que o entristece, não há o desejo de cuidar e nem o de sentir-se desejado- Deu um trago.

- Mas aí eles vão começar a se envolver, um será a vida do outro. Apaixonar-se-ão. Então serão confidentes, haverá uma vontade mútua de fazer bem ao outro, de conhecer seus medos e secar suas lágrimas sempre que insistirem em cair. Um acabará magoando o outro por um jeito desajeitado de cuidar. Mas tudo bem, porque se perdoarão por medo de perder o outro - conteve uma lágrima e tragou seu cigarro.

- De repente eles começam a parar de se falar, a parar de telefonarem... – Soprou a fumaça em um jato e prosseguiu com o seu monólogo destinado ao seu ego – Aí essa indiferença agora incomoda, faz mal. Antes não era ruim porque não tinham provado da confiança, não conheciam o sabor do amor. Sabe qual é mesmo o problema do amor? É que ele é tão doce que tudo o que você prova depois dele tem um gosto azedo.

Uma pausa, um trago, o sopro e outra tragada.

- Termina igualzinho a como começou. Entretanto, depois que você vive uma relação mais profunda, voltar à superficialidade de dois conhecidos machuca, porque é um tanto ruim perder algo ou alguém que requereu tanto esforço para se conquistar. Mas no primeiro momento, você ainda não passou por nenhuma dessas experiências, e o pouco parece muito, o superficial é o ápice da relação.

O barulho do choque de duas bolas de sinuca ecoou pelo salão. A mulher deu uma ultima tragada e apagou seu cigarro. Deixou o dinheiro sobre a mesa do bar e saiu. Um dos jogadores de sinuca observou a mulher saindo do bar com as sandálias em uma das mãos e a outra se mostrava erguida a chamar um táxi, que partira com a figura que fez a vida daquele barman ter um outro sentido.