ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O VIOLEIRO DO VENTO

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O VIOLEIRO DO VENTO

Rangel Alves da Costa*

Conto o que me contaram...

Dizem que num sertão bem sertanejo, de matutice e seca de não acabar mais, morava um povo empobrecido, cuja sobrevivência muitas vezes dependia até mesmo de comer calango e cobra tiradas as tripas.

Era pouco ou quase nenhum o trabalho ali. A seca não deixava, e com a terra esturricada não havia como preparar o chão e semear qualquer grão; o muito que se fazia era catar um pedaço de palma ainda verdosa e pinicar pra dar aos bichos pelancudos que continuavam em pé.

Contudo, mesmo essa triste situação de sobrevivência não desanimava completamente aquele povo trigueiro, rajado de sol. Muito pelo contrário, pois dentro de cada tapera, casinha de barro e ripa, sempre havia um povo feliz. Não se sabe os motivos da felicidade, mas era um povo de sorriso fácil no rosto.

Contam também que a felicidade aumentava ainda mais da boquinha da noite em diante, depois que o sol se escondia e o acinzentado do começo da noite começava a tomar conta daqueles vastos descampados.

Depois que o cheiro do café torrado já ia sumindo, os mais velhos começavam a sair das casinhas e sentar nos tamboretes, nos banquinhos, nos troncos de paus ao redor. Estranhamente, não sentavam em conjunto, numa roda de amigos e vizinhos, mas cada um sozinho e afastado.

E dizem que faziam isso pra ouvir, bem sossegada e calmamente, a música que não demorava pra chegar. Assim que a lua aparecia, um vento macio começava a soprar e com ele vinha uma música de viola tão plangente e apaixonante que faziam os velhos corações recordar os tempos idos.

Era a noite de luar e o vento trazendo, soprando a música do violeiro invisível, misterioso, ouvindo-se apenas o dedilhar de cada nota musical. E o mais estranho ainda é que cada um ouvia uma música diferente, uma canção única para cada um velho coração.

Naquela mesma noite ninguém se reunia mais para falar sobre o violeiro do vento, mas no outro dia não se falava de outra coisa, relembrando sempre a música ouvida. E por isso, por tantas noites assim, de melodia e saudades boas, era um povo tão feliz...

Poeta e cronista

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