ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O SEGREDO DA BATINA

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O SEGREDO DA BATINA

Rangel Alves da Costa*

Conto o que me contaram...

Dizem que num lugarejo do fim do mundo, onde o transporte moderno era o carro de bois e o lombo do jumento, havia uma comunidade aparentemente muito religiosa, porém também extremamente amiga do conhecer a vida alheia, do conversar mentira e fofocar.

Beata era coisa que infestava, numa procissão de todo dia dentro e fora da igreja. Como o local era onde se encontravam muito mais para ouvir as novidades e as fofocas, falar da vida dos outros, do que propriamente para orar ou pedir perdão por tantos pecados, dia a noite se via velha e nova entrando e saindo com olhos de falsa piedade.

Mas o vai e vem ficou ainda maior quando apareceu, ninguém sabe ao certo da boca de quem, uma conversa dizendo que o sacerdote do lugar - que só ia ali rezar missa e confessar de oito em oito dias – guardava um imenso, enorme segredo debaixo da batina. Assim, por cima da vestimenta sacerdotal, bem na parte debaixo havia uma coisa do outro mundo para um homem santo.

Quando uma beata novata, ex-quenga arrependida, chegou perto da carola sonsa e lhe segredou que imaginava qual seria o segredo que o padre trazia embaixo da batina, esta nem conseguiu ouvir o resto e caiu desmaiada, se abanando afogueada, de pernas abertas.

Assim que outra devota, famosa no metiê beatista pela sua tendência a trair o marido, chegou perto de outra toda de xale na cabeça e livros de rezas nas mãos e foi dizendo que sendo o padre tão jovem e cheio de vigor físico, este só podia trazer embaixo da batina uma cueca apertadinha. Ao ouvir isso, a outra começou a suar frio, a se abanar, a suspirar incontidamente, até resolver perguntar a cor da minúscula roupa de baixo. E soltou gritinhos ao ouvir a resposta, também desmaiando em seguida.

Verdade é que a conversa corria solta, com achaques e desmaios a torto e a direita. Nunca se viu tanto leque abanando, tanto lenço limpando suor, tanta pele vermelha e cheia de arrepios. Uma dizia que achava que ele carregava uma arma, outra suspeitava que fosse uma ceroula com os bolsos cheios de dinheiro, já outra achava que era uma coisa que não podia dizer.

Forçada a dizer o que pensava, a pobre coitada, de cabeça baixa, envergonhada demais, falou que achava que o segredo que o padre guardava debaixo da batina era exatamente não ter segredo algum, pois o homem não usava nada, apenas a batina por cima e pronto. E foi um deus-nos-acuda, com carolas correndo pra cima pra perguntar outros detalhes. Já que não havia nada debaixo, então...

Feito o qüiproquó, resolveram que na próxima vez que o homem chegasse pra celebrar missa tirariam essa dúvida de uma vez por todas. E na semana seguinte o homem da igreja riscou ali, de batina nova e todo sorridente. Achou estranho porque as beatas olhavam demais pra sua roupa sacerdotal, principalmente da cintura pra baixo. Então resolveu perguntar por que o olhavam tanto daquele jeito.

Como não tiveram coragem de perguntar, então ele resolveu logo a questão de uma vez por todas, levantando a batina e mostrando uma calcinha de renda vermelha que usava.

Poeta e cronista

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