A REAL IDENTIDADE

Ela era uma, que na verdade era outra. Era a segunda opção, sempre. Porque a primeira acho que nunca existiu pra ninguem. Já chegava dizendo que era a outra em primeira opção, mais ou menos isso. Tinha sempre que se explicar, dizendo que era a fulana porque a sicrana nunca houve de fato. Não foi nem sua escolha, como sempre, apenas assimilou-se a ideia.

Bem, o fato é que era a "outra", a segunda sempre, e não conseguia mais se sentir a "uma", a primeira opção...

Quando questionada, geralmente com ar de reprovação, pela suposta renegação de si mesma, já nem sabia oque dizer, porque nem mesmo sabia ela. Tinha sido imposto, desde sempre, desde que se conhecia por gente, mas é claro que bem intencionada, a identidade imposta.

Pensavam mil coisas a respeito dela, da sua opção, ou falta de opção.

E lá se vinha a avalanche de questionamentos externos, que geravam tantos outros internos na sequencia...

Não gostas do primeiro nome? Acha feio, estranho, esquisito? O que há contigo afinal? Oque quer esconder ou renegar? Não gosta do diferente, do extraordinário?

Mas mal sabiam eles que ela adorava o diferente, o incomum, o fato de ser única. E era isso que mais a encomodava, no caso. O fato de não ter tido muita opção de escolha e ainda ser mal interpretada por isto. Talvez a renegação do fato de ela ser meio diferente desde o seu surgimento, não tivesse partido dela, e provavelmente, foi assim que o tenha sido...

Oque causa questionamentos é mais dificil de lidar, explicar ou entender...

E assim, deu-se a anulação parcial de sua verdadeira identidade.

Muitos nem imaginavam que existia ou existira a "primeira". Mas nem era por mal, e sim porque geralmente nem ela lembrava mais disso tambem. E em filas de espera seguia seus dias, por inúmeras vezes perdendo a sua vez, por não conseguir estar atenta e atender ao chamado do seu verdadeiro eu. Já estava acostumada a ser oque não era... não originalmente...

Não que talvez não o fosse esta "outra", mas o era para ser um pouquinho menos, pela ordem natural das coisas... se é que existe uma ordem... Porque afinal de contas, segundo é segundo e primeiro é primeiro, e "ponto".

E veio a ideia...quanta tolice...

Como nunca acerteram sua identificação mesmo, pensou, pensou e decidiu que se autoapelidaria.

Por mais estranho que parecesse talvez funcionasse e ainda poderia escolher como ser chamada e identificada a seu gosto e estilo, pela primeira vez na vida. Começou a formar as possíveis combinações...

Saiu de tudo...

Dio...mas parecia Deus...

Diu...parecia método contraceptivo...

Sane...hmm, nem parecia ela, e falariam como S ou Z? hmm, não...

Di...era tão resumido que mais se parecia com um resmungo...imaginaa...ela nem ouviria isso...

Pensou no nome completo, sem abreviações ou arranjos...

Diosane...era uma, uma opção... e tambem era a "uma", a propria...

Mas era tão estranho de pronunciar que nem ela conseguia direito. Talvez tenha sido a falta de prática durante a vida toda...

Podia ser falado de várias maneiras, uma infinidade de opções que chegavam a confundir ela própria e isso não era nada bom...

Pausadamente:

*Dio-sane ou *Dio-ssane...porque escrita é escrita e pronúncia é pronúncia, mas isso é uma outra história, para outro por do sol...

*Djo-sane ou *Djo-ssane (o "I" dito rapidinho com som d "J")...hmmm...sei não...

Ou quem sabe cair um pouquinho mais para o lado, o seu lado de sempre, como:

*Paulinha... era o mais comum até então e dava um ar de delicadeza e graciosidade. Mas sei lá, por outro lado não parecia com ela, a verdadeira. Dava um ar de fragilidade tambem, de diminuição, fraqueza e piedade...hmm, definitivamente não era ela...

Nossaa, e então? Talvez fosse melhor deixar assim mesmo. Tem coisas que é melhor nem mecher...

*Paula... é tão mais fácil, tão comum, não gera questionamentos, e nem interpretações erroneas, faz parte de uma normalidade aceitável...

E de mais a mais, tem coisas que só a gente sabendo chega...basta...

E outras jamais poderiam ser mudadas, refeitas ou revividas do jeito que a gente gostaria. Isso já não mudaria muita coisa mesmo, não mudaria o mundo e não mudaria nada em seu mundo, principalmente... Então qual seria o motivo maior de querer a tal mudança? Não havia, apenas os contratempos gerados por ignorância dos outros e de si mesma algumas vezes...

De qualquer forma esses contratempos ainda não tinham sido até então, suficientemente fortes para que merecessem tamanho empenho em modificá-los... Sabia da sua real identidade...

E ela ficou assim...

Continuou sendo e sabendo quem realmente era... a "outra" que era a "uma"...

E isso era oque bastava para que se orgulhasse de si e continuasse mesmo sendo "uma" ou "outra", sendo a pessoa que sempre foi...

DinyPily

DinyPily
Enviado por DinyPily em 24/02/2010
Reeditado em 24/02/2010
Código do texto: T2105205
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.