A dádiva do Rei
Em um reino muito distante, o rei passeava com a comitiva por seus lindos bosques, quando encontrou um homem moribundo, deitado no chão. Ele trajava farrapos, parecia muito doente, pois a sua pele estava pálida e tremia de frio, possivelmente causada pela fraqueza. O Rei ficou comovido pelo estado do homem e mandou que cuidassem dele.
Após alguns dias, o Rei resolve visitá-lo. Totalmente recuperado e bem vestido o homem, assim que avista seu benfeitor, joga-se a seus pés beijando-o com muita devoção. Ambos muito emocionados abraçam-se com ternura. O homem pede que o Rei o deixe servir de qualquer forma, em gratidão por tê-lo salvo e resgatado da miséria. O Rei, muito complacente, pede-lhe apenas um gesto simples, que ele, quando puder, vá ao castelo para beijá-lo. O homem fica feliz, diz que fará isso até o dia que morrer, pede que o Rei lhe mande fazer outra coisa, pois isso não seria uma obrigação, mas uma honra. O Rei responde que esse gesto seria suficiente. Os dois se despedem.
Já totalmente recuperado o homem, volta para sua aldeia, é recebido em festa pelo povo, a alegria toma conta de todos. O homem é solicitado a falar sobre o Rei e sua bondade. Já no fim do dia o homem, mesmo cansado das festividades, apressa-se a ir ao castelo para cumprir o que o Rei lhe pedira. Muito feliz, o Rei encontra-o na sala do trono e estende-lhe a mão para que fosse cumprida a "Cerimônia do Beijo".
Os dias passam e o homem continua sendo o centro das atenções da aldeia, porém a vida agitada o deixam exausto e ele pensa que o Rei pedira que ele fosse somente quando fosse possível. Em muitos dias o homem estava cansado demais, faltava à cerimônia. O Rei esperava-o e preparava-se sempre para sua chegada. Dias passam e o homem cada vez menos ia ao castelo. Ele sempre era convidado a participar de jantares, dar palestras para falar do Rei e seu castelo. Tantos compromissos impediam-no de ir beijar a mão do Rei.
Porém, com o passar do tempo, as pessoas foram perdendo o interesse, o homem já não era mais tão requisitado. Algumas pessoas fizeram-no acreditar que o Rei era o culpado pela rejeição que sofria, pois o Rei deveria cuidar dele constantemente e isso não acontecia mais. As pessoas diziam que, se o Rei quisesse a mão beijada, que ele mandasse buscá-lo. O homem acabou se convencendo de sua limitação e passou a difamar o Rei e desprezar o gesto de bondade, então o homem nunca mais voltou ao castelo...
Muitos anos passaram, o homem foi totalmente esquecido e desprezado pelo povoado. Caiu doente e sem ninguém para cuidar dele, arrastou-se até o bosque do castelo e lá ficou até que foi novamente encontrado pelo Rei. Novamente o Rei ficou triste ao vê-lo e perguntou-lhe por que andou maldizendo seu reinado, depois de ter recebido tantas benesses? E onde estavam aqueles que o aconselharam e que julgava seus amigos, para cuidarem dele?
O homem, muito envergonhado e arrependido, pediu perdão. O Rei abençoou-o e mandou que novamente cuidassem dele e depois despediu-o pedindo que ele não mais entrasse em seu reino.
Marcelo Oliveira