MAIS UMA NOITE NO VELHO CASARÃO
( Um pequeno conto)
Estou cá dentro, no antigo e mal cuidado casarão.
Pela janela posso ver que o sol brilha lá fora, mas cá dentro faz frio; um frio que gela meus ossos, estremeço, me encolho, enquanto vou transitando pelos cômodos abandonados.
Há muito nada aqui recebe cuidado; as paredes de madeira estão descascando a pintura, vê-se que não são caiadas há muitos anos. O chão range sob meus pés, parecem que vão desabar, mas sei que não vão. Cá dentro tudo é assim, como um mundo à parte, uma esfera com energia própria. Uma energia que invoca velhos fantasmas. Espectros sofridos, cheios de lembranças que gostariam de esquecer. Mas não esquecem. Talvez não queiram esquecer. Talvez, não possam esquecer. Estão presos às suas dores e agonias.
Quisera transitar pelo jardim. Há flores por lá, alguém cuidou da terra e plantou novos bulbos que florescem, a luz incide sobre as pétalas ainda molhadas pelo orvalho da noite e há alegria ali, mesmo que eu não possa ouvir risos ou conversas animadas. Não há crianças ali. Não há ninguém. Mas ainda há beleza, contrastando com a melancolia que há cá dentro.
Sento à uma velha escrivaninha e finjo um verso de amor, mas soa tão falso que quase rasgo a folha, mas me lembro que posso fingir e então termino o soneto.
Há muito estou aqui, perco a noção do tempo. Pela janela de vidros quebrados vejo que o sol se poe. Sombras se esgueiram pelas paredes já mal iluminadas e sinto fome e sede. Mas não há do que se alimentar aqui. Aqui não há nada.
Silencio a voz no meu espírito, aquieto meus pensamentos e me preparo para passar mais uma noite no casarão.
E esta noite será longa... Talvez sem fim!
Anna Corvo
(Heterônimo de Elisa Salles)
( Um pequeno conto)
Estou cá dentro, no antigo e mal cuidado casarão.
Pela janela posso ver que o sol brilha lá fora, mas cá dentro faz frio; um frio que gela meus ossos, estremeço, me encolho, enquanto vou transitando pelos cômodos abandonados.
Há muito nada aqui recebe cuidado; as paredes de madeira estão descascando a pintura, vê-se que não são caiadas há muitos anos. O chão range sob meus pés, parecem que vão desabar, mas sei que não vão. Cá dentro tudo é assim, como um mundo à parte, uma esfera com energia própria. Uma energia que invoca velhos fantasmas. Espectros sofridos, cheios de lembranças que gostariam de esquecer. Mas não esquecem. Talvez não queiram esquecer. Talvez, não possam esquecer. Estão presos às suas dores e agonias.
Quisera transitar pelo jardim. Há flores por lá, alguém cuidou da terra e plantou novos bulbos que florescem, a luz incide sobre as pétalas ainda molhadas pelo orvalho da noite e há alegria ali, mesmo que eu não possa ouvir risos ou conversas animadas. Não há crianças ali. Não há ninguém. Mas ainda há beleza, contrastando com a melancolia que há cá dentro.
Sento à uma velha escrivaninha e finjo um verso de amor, mas soa tão falso que quase rasgo a folha, mas me lembro que posso fingir e então termino o soneto.
Há muito estou aqui, perco a noção do tempo. Pela janela de vidros quebrados vejo que o sol se poe. Sombras se esgueiram pelas paredes já mal iluminadas e sinto fome e sede. Mas não há do que se alimentar aqui. Aqui não há nada.
Silencio a voz no meu espírito, aquieto meus pensamentos e me preparo para passar mais uma noite no casarão.
E esta noite será longa... Talvez sem fim!
Anna Corvo
(Heterônimo de Elisa Salles)