A CHEGADA DO CORVO ( CONTO EM VERSOS)
Foi há dias longinquos; tempos ancestrais...
Quando a rosa floria no campo primaveril
E as moçoilas corriam livres nos campos madrigais
Que surgiu uma moça tão bela como jamais se viu.
Trazia no rosto a alegria inocente das donzelas
Que ainda nunca viram a obscuridade da vida
Seus olhos eram claros como a luz de vela
E seus passos como o bailar sobre margaridas.
Mas um dia um moço despontou lá nos outeiros
Olhou a moça como se nunca vira outra igual
Fez-lhe juras de amor embaixo do persegueiro
Jurou-lhe paixão sublime, fiel, doce e eternal.
E os olhos lá da Serra, viram a menina virar mulher...
O homem de voz macia tragou-lhe a inocência
Partiu ao alvorecer, como quem deixa uma qualquer
Abriu-se os olhos da moça, fatal e sem clemência.
Buscou seu amado pelos quatro cantos do mundo
Chorou a dor das mulheres cridas amadas
E que descobriu usada, engodo vil e profundo
De tristeza ficou o vazio abismal. Ela não é nada!
Nada que crê na beleza mentirosa das promessas
Onde a crença sucumbe ante o desespero da dor
A alma sangra o lamento e consolo algum cessa
A sangria do coração estraçalhado pelo amor!
Foi quando numa noite escura, nebulosa e fria
Um belo pássaro pousou no umbral do seu portal
A solidão cortava-lhe tanto o coração em agonia
Que a moça não estranhou aquela figura espectral.
Afagou-lhe os penachos negros, lustrosos e cheios
A ave grasnou baixo, parecendo contente ao afago
De repente o espectro já não era medonho e feio
Antes um amigo que ocupava seu espírito vago.
Aos poucos o Corvo se fez presença constante à ela
Não havia local onde ela sem o bicho não se via
Trocando suas vestes claras por negras, ia ela
Desconjurando sua sorte nos versos da poesia.
Hoje ninguém mais se lembra da moça tão sorridente
Que bailava pelas campinas tendo os lábios musicais
Calou-se no peito o amor para sempre_ Tristemente
Tudo que se ouve é o corvo à grasnar: _ Nunca mais.
Anna Corvo
(Heterônimo de Elisa Salles)