DIÁLOGO COM UM MORTO

Um Caso estranho

Ainda não estava tarde à noite, o relógio marcava mais ou menos umas vinte e duas horas, seu passa tempo preferido era arrumar suas roupas de enterro; velório.

Este caixão de defunto que dona filó possuía como objeto de tanta estima foi adquirido em uma ocasião que estava a passeio em uma cidade vizinha, comprou-o de uma agencia funerária propriedade de um velho amigo, esta casa comercial lhe entregou o referido produto com muito cuidado para os olhos curiosos dos vizinhos não perceber e admirar com esta compra esquisita, e tudo ficou acertado como se entregasse um móvel comum, isto há algum tempo já passado, há alguns seis anos.

Esta noite de quarta feira seria inesquecível para aquela senhorinha que gostava de se divertir com os objetos de morte.

Ela se apoderou de uns três caixotes de madeiras que estava por ali quase da altura de uma cadeira colocou ao chão um após o outro bem alinhado em seguida com um pouco de força conseguiu colocar a urna funerário em cima, ficou exposta como se estivesse apresentando um corpo, dona Filo arrumou todos os ornamentos para se assemelhar com um velório, acendeu as quatro velas de sete dias que estava em cada canto do cenário fúnebre em seguida deitou-se dentro do caixão ficaram alguns minutos inertes e brincava com as suas imaginações, pensava como seria seu velório, cheia de contentamento parecia uma adolescente ansiosa pelo dia da festa de debutante, depois de algum tempo ela adormeceu e dentro deste caixão pernoitou até que viesse o raiar do dia da aquela quinta feira.

Na aquela manhã ainda nas primeiras horas do dia acordou com muita disposição, parecia que o sono havia lhe revigorado e rejuvenesceu alguns anos de sua vida. Após ter cumprido todas as tarefas rotineiras vespertinas dirigiu-se até onde havia um calendário exposto fixado na parede, manuseou-o e logo deparou com algum recado que assinalava em um dia impresso no aquele papel, algo lhe recobrou sua memória e com grande admiração percebeu que no aquele dia de quinta feira nesta data deste mês completaria dez anos do falecimento de seu velho esposo; seu Augusto, grande dor lhe causou esta despedida, tratava de uma pessoa muito boa, ela dizia que ele não morreu, mas foi resgatado por um anjo, dizia com toda certeza que o fato haverá acontecido desta maneira que foi um chamado de Deus através de um anjo.

Ela conservava o costume de conversar sozinha, não por se tratava de pessoa solitária, não seria isto o motivo deste hábito, dês do tempo em que vivia entre meio sua numerosa família, as pessoas observadoras diziam que ela pensava em voz alta e que neste diálogo tinha respostas e interagia com o interlocutor, era muito estranho com sua mania, conversava com os animais domésticos, impressionante como se pronunciava em o diálogo de tantas originalidades, parecia que estava falando com gente.

Nos tempos de agora há mais motivos para exercer este cacoete, não tem mais ninguém para trocar nenhuma palavra a casa em que ela vivia não passava de um ambiente solitário e nas paredes só restavam os retratos pendurados atestando a veracidade de que realmente ouve vários integrantes nesta família, alguns já morreram e os vivos estão todos espalhados por ai neste mundo sem fim.

A morte de seu velho companheiro lhe trouxe muita solidão, dês do dia do casamento há algumas décadas até sua despedia desta vida aqui na terra sempre foi um fiel esposo e um bom pai, conservava os costumes de seus ancestrais, nasceu e viveu boa parte de sua vida sobre os costumes indígenas das tribos Aimorés. Dona Filó esta senhorinha vez em quando transitava pela casa falando sozinha, resmungando em reclames desaprovando a decisão de Deus por lhe deixa-la tão solitária, levou seu marido e lhe deixando nesta viúves sofrida.

Seu Augusto descansou no aquele dia de sua partida em momentos tão angustiantes, por causa da demora de voltar para casa seus familiares saíram em sua procura pela lavoura em que trabalhava, encontrou recostado em um tronco de uma árvore, com seu chapéu na mão e sua ferramenta de trabalho do lado, já havia algumas horas que estava desfalecido, não havia mais outra maneira de recuperar sua vida, morte súbita.

Os descendentes de seu Augusto estavam em completa desarmonia, muitas intrigas e desavenças devido a um inventário que necessitava de se redigir em um cartório, os familiares brigavam muito por causa desta herança de algumas propriedades que ele adquiriu através de muitos anos de trabalho.

Dona Renata “a nora” seria a mais encrenqueira, a mais audaz, tinha o desejo de adquirir as partes melhores, brigava e fazia os maiores escândalos, seu Augusto sofreu muito com estas partilha, mas para dona Renata Deus deu-lhe o veredicto, ela morreu antes de desfrutar dos seus bens não houve tempo, não chegou a tomar posse, e sofreu muito em suas horas derradeiras, em seu enterro poucas pessoas foram lhe despedir deste momento tão triste, só alguns companheiros de bebedeiras amigos de bares, era uma alcoólatra.

Na aquela tarde chovia muito, caia do céu um enorme toró, parecia que as águas derramavam-se de vários cântaros, a hora da despedida do corpo estava próxima e a chuva nem se quer dava sinal de cessar e as poucas pessoas que estavam de sentinela já estavam percebendo o mau cheiro que exalava do corpo da defunta, o féretro teria que seguir o mais urgente possível.

Debaixo de chuva o cortejo seguiu e no cemitério foi sepultado, diziam de boca em boca que no momento exato que se lacraram a gaveta com a urna funerária aconteceu um grande estampido, um relâmpago rasgou o céu com grande claridade, um trovão ensurdecedor; um raio caiu em uma das árvores ali bem próximo derriçou os galhos desde a copa até ao solo e neste momento foram descarregadas todas as energias negativas da já morta dona Renata.

Seu Augusto morreu primeiro não teve a oportunidade de presenciar este acontecimento tão lastimável; a morte de sua nora uma pessoa a qual ele não tinha muita simpatia, dona Filó recordou neste dia com muita saudade; a morte de dona Renata e seu esposo seu Augusto. Agora só lhe restava por os pés a caminho e ir em direção do velho cemitério, de posse de seu objeto de caminhada estaria a destino e esta tarde toda estava reservada para fazer esta visita ao túmulo de seu velho esposo seu Augusto que para ela parece que ainda vive em seu dia a dia.

A velha adentrou ao cemitério em ruínas, andou alguns passos e chegou de frente para a lápide, olhou com grande tristeza e balbuciaram algumas palavras em oração, feitas isto se sentou sobre o túmulo se livrou da espécie de bolsa e sua garrafinha de água e algumas velas que acenderia no momento que retornasse para sua casa, acomodou-se sobre aquela pedra gelada que de mostrava toda a morbidez, visualizou a foto amarelada pelo tempo que estava fixa na cabeceira do túmulo e com a mão retirou todo o pó que havia impregnado depois fechou a mão como estivesse apertando algo e logo em seguida tocou algumas vezes na laje que protegia os restos mortais do seu falecido, chamou como se estivesse em frente a uma porta, falou como se estivesse dirigindo a palavra a um ser vivente, insistiu algumas vezes e pedia-lhe a atenção como se o morto fosse vivo e assim dizia:

- Ô meu velho já estou aqui, já cheguei, como passou estas últimas horas? Nada veio lhe incomodar como você disse na noite em meu sonho. Eu rezei muito para o pai lhe dar mais conforto e acho que minhas orações foram atendidas, pelo que percebi parece que agora está tudo bem, você pensou que eu não viria a este momento que esperas com tantas ansiedades, levantei hoje meio atrapalhada até havia me esquecido deste seu aniversário de morte.

Diz alguma coisa você está tão ausente, conversa comigo meu velho me conte as novidades do além gosto muito de saber como esta este lado de lá, este seu mundo dos mortos, me fale alguma coisa Augusto meu velho.

Dona Filó a viúva sentia-se muito a vontade, repousada sobre o granito negro do túmulo deste cemitério deserto, conversava com seu falecido esposo que jaz alguns dez anos, havia algo de sobrenatural na aquela conversa, ela possuía poderes de magia conhecia muitas orações cabalística e cultuava os mortos com cerimônias diabólicas, praticava todos os rituais macabros e viajava através de alucinações a qual a arrebatava para outra esfera; ambiente dos extraterrestres tinha passagens livre entre a oligarquia angelical em escala funcional, com suas meditações contemplativas chegava ao paraíso celestial, passeava pelo vale da morte e até encontrava com os que haviam morrido e estavam neste lugar cheio de encantos e mistérios longe deste nosso mundo, dona Filó era mesmo estranha e continuava prosear além-túmulo.

-Se você não falar comigo vou-me embora, parece que você esta insatisfeito com algum mal entendido, eu sei que você esta ai neste seu velho caixão, ninguém lhe removeu ainda não é tempo, ou você esta desligado deste mundo, se for aquele seu superior que está interferindo em nossas relações você diz pra mim que vou tomar algumas atitudes não muito amigáveis com este anjinho plantonista de meia tigela, ele vai se houver comigo, bom nestes casos acho que devo fazer umas das aquelas orações ai você vai me ouvir, espere um pouco ai meu velho Augusto.

Ela saiu a alguns passos onde existia uma grande cruz que servia para as orações coletivas, ajoelhou-se e rezou com muita insistência, fez uso de todos os seus poderes paranormais, terminando as evocações retornou ao diálogo com seu velho Augusto e o disse com exigência de atenção.

-Meu velho eu gostaria de saber algo de nossa nora; RENATA qual foi seu destino onde estão suas acomodações, me responde Augusto.

No aquele momento em que a senhorinha do já falecido sentou-se sobre a catacumba mal ela se acomodou algo horrível aconteceu ouve um abalo parecia que estava havendo um terremoto a sepultura estava passando por um tremor o tumulo rachou ao meio e uma voz horripilante proclamou com gemidos aterrorizados, dona Filó manteve a calma e ouviu aqueles sons do outro mundo de seu falecido marido e entendeu perfeitamente o que ele dizia com suas palavras tremulas.

-Ai! Que lamentação! Por mil diabos seria possível me livrar desta maldita sepultura? Ô que tormento sem fim, com estes mil demônios me atormentando, que maldição tétrica! Não estou suportando mais.

- Sim, já entendi, estou lhe ouvindo perfeitamente Augusto, não posso lhe livrar deste lugar, não é de minha alçada, neste assunto não me meto, única coisa que posso fazer por você é orar por tua alma, mas não precisava ficar tão furioso assim meu velho.

Não tenho visto Renata por aqui acho que ela esta em outro departamento ela pertence à outra classificação, não posso manter contato com ela, me faça um favor não me pergunte mais desta mal tida dos infernos!

Seu Augusto prossegue com a narrativa: não sei se você sabe, mas sinto meu corpo como se estivesse aqui inteiro com todas as funções percebo perfeitamente as reações como se eu estivesse vida, sinto tudo normal apesar de só restar este amontoado de ossos espalhado por este caixão, sinto todas as minhas funções de meus órgãos, até meu volume corpóreo, mas isto é um grande mistério além-túmulo.

Uma destas noites intermináveis aconteceu algo terrível aqui nesta campa, ouve uma invasão de um grande número de baratas que vieram atraídas pelo o cheiro de urina, nesta tumba ai ao lado, é que houve um banquete de góticos; estes jovens que fazem cerimônias macabras em cemitérios permaneceram a noite toda perturbando com barulhos festejando consumindo bebidas alcoólicas e usando entorpecente, pisando por tudo, algumas das aquelas moças se acharam de fazer xixi bem encima de mina campa o cheiro impregnou no concreto que demorou a sair passei uns três dias percebendo aquele cheiro de amônia que me incomodava bastante.

As baratas vieram atraídas pelo cheiro da urina, era grande a quantidades destes infernais insetos, terminando de consumir o suco deixado pelas moças as baratas adentraram a catacumba e tiveram acessos ao meu caixão, andava por toda a minha carcaça eu sentiam me consumindo, minhas roupas estavam podres mais ainda estava intacta, mas com a visita destes pequenos demônios fiquei desprotegido, devoraram todos os restos de tecidos que ainda davam formas as minhas aparências físicas nestes ambientes fúnebres.

Filó:

- As baratas e os ratos são deveras bichos terríveis, eu que estou ainda no mundo dos vivo não os suporto imagine você meu velho eu penso quantos sofrimentos os traz estas pragas... Conte tudo, quero te ouvir, só assim você pode desabafar destes sofrimentos.

Os ratos, os ratos também fizeram suas visitas indesejadas, já faz alguns anos, mas eu não me esqueço desta grande lamuria, as minhas carnes estavam secas e ainda estava presa em meu esqueleto eu sentia o cheiro de carniça que exalava deste lugar, estava tudo ressequido, não havia nenhuma umidade, os vermes até aquele momento não havia deformado a aparência mumificada, até aquele momento conservava a aparência de um corpo seco...

-Esta me ouvindo minha velha?

- sim vai falando, descarregue tudo que você tem direito.

...Mas quando não se espera pela a desgraça é ai ela aparece com suas garras, fiquei surpreso quando! Por aqueles buracos que não estava totalmente tapado, eis que vai adentrando um a um de mostrando muito apetite, fiquei assustado com tantos bichos imundos logo fiquei completamente coberto por estes roedores que usava de toda sua voracidade, entravam por baixo de minhas roupas e roíam todas as minhas carnes velhas, fique somente com minha carcaça, restaram unicamente minhas ossadas e minhas vestimentas, eu sentia seus dentes afiados me rasgando e a dor que eu sentia eram medonha, eles executaram suas tarefas que era somente a de devorar a carne podre, coisa horrível os ratos não danificaram minhas roupas, isto ficara a cargo das baratas, eu não sei onde vai parar estes meus tormentos, mal posso esperar a hora de me livrar destas amarras que me prende neste mundo sombrio.

Quando estava em vida sempre procurei ser um bom homem, conservei meu caráter, minha honestidade e fiel ao meu dever de cidadão, meus sentimentos de compaixão para com meu semelhante pratiquei tantos atos de caridades e agora de que valeu? Veja a situação que me encontro agora neste tormento sem fim, pelo menos tenho um pouco de esperança de me safar destas agonizantes situações alguém lá do alto escalão me disse que em breve serei privilegiado e a minha recompensa será muito satisfatória estou aguardando, mas já demorou tanto que nem sei se é realidade ou me esqueceram...

Antônio Herrero Portilho.

Antonio Portilho antherport
Enviado por Antonio Portilho antherport em 07/06/2014
Reeditado em 09/06/2014
Código do texto: T4836261
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