Guardanapos e glutões
- Amiga, ele não voltou. Não retorna minhas ligações. Acho que acabou.
- O que você fez dessa vez?
- Nada.
Era quarta-feira. Eu estava feliz ontem. Iria vê-lo hoje. Eu estava tentando de novo, permitindo que tudo acontecesse... De novo. Mandei um “Ansiosa para te ver amanhã” próximo à meia-noite. Não esperava resposta. Já são 7 da noite. Nos veríamos às 5. Já perdemos o pôr-do-sol, o brilhar da primeira estrela, a entrada da noite.
- Por que ele não me responde?
- Eu não sei. Talvez ele esteja ocupado com alguma coisa. Amanhã talvez ele te responda. Vai para casa antes que fique tarde.
Cheguei às 8 em casa. Mandei mais uma mensagem: “Está tudo bem? ”. Não consegui dormir àquela noite. Estava tudo tão obscuro. Tudo bem que nos conhecemos há pouco tempo, mas não me responder. O que eu fiz de errado? Espero que ele esteja bem.
- Amiga, ele te respondeu?
- Não. Não quero mais esperar. Preciso ir trabalhar.
Estava atrasada. 30 minutos. Ainda perdi a lucidez por três vezes até chegar no trabalho. Estava com sono. Saio mais cedo, às 5 da tarde. Meu caminho é tranquilo.
Acho que foi o meu amor que o assustou. Ainda não era amor, mas parecia amor.
A rua estava vazia, conseguia ouvir meus passos. Conseguia ouvir os de outra pessoa também. Ali em minha frente. Ele. Olhei-o com intensidade, com dúvida e não recebi o retorno. Passaríamos um pelo outro. Percebi o “não quero te ver”. Abracei a mim mesma bem forte. Senti minha mão tremer quando ele virou o rosto em minha direção. O olhar dele não estava em mim. Era como se me ignorasse ao me olhar. Virei o rosto lentamente enquanto buscava o chão “já não quero mais te ver”. Respirei fundo. Passamos um pelo outro como dois estranhos que se veem pela primeira e talvez última vez.
Um pedaço de mim ficou naquela calçada. Não porque amei, mas porque fui descartada. Fui descartada como o papel amassado de um rascunho mal feito. Fui descartada como um guardanapo sujo da gordura dos lábios de um glutão qualquer. E assim segui. Achando que não valia nada. Enganada, pensando que o problema era eu. Estava em mim.
Hoje sei que não era.
Hoje sei que não estava.