O RIO ONDE FUI FISGADO (miniconto)

 

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Estava eu à beira do rio, pitando um cigarro imaginário, cofiando os meus bigodes grisalhos, pura calmaria, os peixes pareciam adormecidos, poucos e pequenos passavam pelo espelho d’água, mas, pescador é paciente e o dia era radiante, não me fustigava o calor, as águas refrescavam os meus pés e a brisa parecia conversar comigo.

 

Puxei o boné por sobre os olhos, apenas para me esticar na cadeira de praia, uma dormidinha não faria mal nenhum, afinal porque só os peixes podiam relaxar. Já na madura idade, quando se pensa num soninho bom, vem logo uma preguiça dolente e eu acabei deixando um ronquinho pelo ar, talvez por uma hora. Quando abri os olhos, logo procurei a vara, mas, ela estava no lugar e nada de peixes, espreguicei a pancinha suave, não estava de todo mal, mas, os anos de cerveja deixaram um montinho no meio da barriga rsss...abri os olhos, voltei a cabeça e tal qual um peixe fui fisgado e foi como se um raio de Sol invadisse todo o meu ser. A visão do outro lado da margem do rio era um céu na Terra. A mulher mais linda do mundo estava de cócoras pegando um peixão que acabara de fisgar, eu nem um Lambari pequeno conseguira pescar e a deusa morena lá sorridente, com um belo Acará nas mãos, não era justo.

 

Era a fantasia de qualquer homem ali bem na minha frente, que beleza de mulher, as coxas bem torneadas que estavam aparentes pela saia levantada, os cabelos castanhos anelados escorregavam pelas costas e por um segundo, eu quis ser um fio deles. Precisava puxar conversa, queria ouvia a voz dela, ver o seu olhar, a sua face madura bronzeada, ai ai...o que deu em mim!

 

Ela se levantou e guardou o peixe numa caixa de isopor e continuava sorrindo, parecia satisfeita. Olhou na minha direção e perguntou

- Você teve sorte?

Meu Deus a voz era de anjo e eu demorei uma década para responder...estava com dificuldade de encontrar as palavras...que mulher linda.

Enfim respondi meio sem graça que não havia pescado nada e ela disse

- Amanhã terá mais sorte...acenou e foi embora deixando um velho pescador muito feliz.

 

Aposentado e morando com um cão, um gato e um papagaio, tinha todo tempo do mundo, mais tarde dormi e sonhei com a pescadora morena.

 

Acordei bem cedo e parti para a beira do rio, desta vez levei o cachorro e a ansiedade era tanta, que levei cadeira, iscas, água e quando me dei conta não tinha levado o anzol, já ia dando meia volta quando a morena passou numa canoa e acenou pra mim. Perguntou se eu queria ir mais acima no rio, pescar com ela. Expliquei que havia esquecido a vara e até já estava voltando pra casa para buscá-la. Ela prontamente disse que tinha uma de reserva e gostaria de companhia. Eu me tremi todo, mas, precisava vê-la bem de pertinho, que velho bobo eu estava me tornando, me sentia um garoto...dizem que quando a gente chega à terceira idade vira criança..naquele momento eu acreditei piamente nisso rsss...entrei com o cachorro na canoa e lá se vão dez anos buscando estrelas, acendendo o Sol e lustrando a Lua para a minha deusa do rio, pescando juntos só felicidade.

 

 

 

* Imagem de     pixabay.com

Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 22/02/2022
Reeditado em 23/02/2022
Código do texto: T7458419
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