A MENINA QUE CHORA

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 Para todos Patrícia era apenas uma criança normal, meio tímida, calada, mas, o que realmente preocupava seus pais era o quanto aquela doce menina chorava. Desde bebê era assim, pensavam ser cólicas ou alguma outra dor, só que a saúde dela era perfeita, foi crescendo entre alegrias pueris e crises de choro, às vezes convulsivos, preocupantes. Seus pais, Olavo e Rosa a levaram para consultas com diversos médicos, psicólogos e psiquiatras e nada era apontado que necessitasse de um medicamento sequer, Patrícia era uma menina sem problemas aparentes, mas, não era compreensível tanto choro.

Chegou a adolescência, Patrícia era uma aluna brilhante, de poucos amigos pela timidez, pelo choro constante, a própria achava que os poucos que com ela se relacionavam, era apenas por compaixão. Patrícia não parecia se preocupar muito com isso, mas, era bom ter com quem compartilhar os trabalhos escolares, ela mesma não entendia o motivo daquela tristeza repentina e tanto choro, só sentia isso profundamente, como uma dor sua fosse.

Olavo e Rosa, trabalhavam muito no comércio que tinham na cidade, precisaram contratar uma pessoa para organizar a casa e também olhar Patrícia, só que demoraram um pouco para escolher, então,  eu apareci para a entrevista e foi uma ligação imediata com a menina, só isso já me abriu as portas da confiança para Olavo e Rosa. 

As coisas e rotinas iam seguindo seu curso até a primeira crise de choro de Patrícia. A dor que a menina sentiu, aliviou meu coração na hora, foi como se uma paz enorme me invadisse, um descansar de alma, por instantes fiquei atônita, a saudade da minha filha morta aos primeiros dias de vida, não doía mais, era uma saudade diferente, um sentimento totalmente novo, era saudade, lembrança boa de seu rostinho risonho, não era mais uma falta amarga dolorida, alguma coisa boa se quebrara dentro de mim e eu chorei junto com ela, mas, serenei feliz. Nesta noite eu voltei a rezar e agradeci.

Estes episódios de choro de Patrícia, aconteceram de novo, no comércio do pai, quando uma mulher com dois filhos, devolveu parte da compra por não ter dinheiro para arcar com a despesa , Patrícia se abraçou a ela e chorou copiosamente, inesperamente a mulher lhe agradeceu e com um olhar confiante, pediu um emprego de meio expediente, o olhar de Patrícia para o pai lhe garantiu uma colocação.

O outro episódio, foi numa missa de sétimo dia de um  amigo de seu pai. Patrícia se aproximou da viúva e a mulher se jogou sobre ela, como que aquela mocinha fosse uma tábua de salvação, depois disso o choro convulsivo de Patrícia, fez Rosa levar a filha para casa. Na Igreja ao lado dos parentes, uma viúva serena e fortalecida, confortava os filhos, ser dor aguda no peito. 

Sempre me disseram que sou sensitiva, mas, nunca dei muita importância para isso, mas, os acontecimentos mexeram demais comigo, conversei com a D.Rosa que depois de todas as pessoas que já consultara, sobre o choro de Patrícia, era toda ouvidos. Depois de me escutar, foi comigo e a filha para uma consulta com um parapsicólogo, deixando um pai amoroso no comércio aflito por notícias.

Primeiro demos todas as informações possíveis ao terapeuta, relatamos todos os episódios de choro de Patrícia, enquanto ela aguardava na recepção. Depois de pouco mais de uma hora de conversa com a menina, nos escutamos o choro soluçante de Patrícia acompanhado de um outro choro contido, mas, constante, sem pensar invadimos a sala. A cena era surreal, o terapeuta ajoelhado com a cabeça no colo de Patrícia, que o abraçava, ambos aos prantos.

Instantes depois mais calmos, o terapeuta falou, Patrícia, você tem um dom que pode ser uma benção ou uma pena capital, pois se revelado poderá causar muitos transtornos em sua vida. Você tem a capacidade de sentir a dor da alma do outro, o choro vem quando esta dor passa para você, não fazer da dor recebida algo seu, mas, o portador tem alívio imediato, como um tipo de cura, fortalecendo e abrindo mentes e caminhos, é um dom muito raro. D.Rosa, converse com sua filha e com seu marido, para saber como irão lidar com isso. Já li um estudo sobre um caso semelhante, só que a mulher preferiu se retirar para um convento rígido, para não ter que dar muitas explicações. Este dom não lhe provoca dores reais, o choro é apenas um gatilho, será preciso controlar os ambientes, as emoções, há que se ter muita serenidade para conviver com ele, a decisão será só sua, não creio que deva resolver e absorver todo esse turbilhão agora, pense bem, obrigado por tirar a dor das lembranças dolorosas de uma traição que sofri. Fique atenta minha querida, o dom lhe causará um certo cansaço, embora, sua mente e espírito não armazenem os fatos.

O tempo passando e foi ficando difícil se relacionar com as pessoas, como o terapeuta dissera, um cansaço ia dando as caras, Patrícia, então, tomou uma decisão. Muito choro e abraços amorosos marcaram a entrada de Patrícia no Convento das Almas e enfim, alguns poucos episódios depois, pois freiras são pessoas com vidas comuns antes das clausuras, Patrícia se sentiu em seu habitat e plenamente feliz. Seu jardim de flores era tão bem cuidado e colorido, pareciam flores de alegria.





***A pretensão deste conto, é ser uma singela homenagem para os poetas Patrícia Justino, Poeta Olavo e Rosa Alves, pelo enorme incentivo, obrigada imenso. 



* Imagem - Fonte - Google
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 03/02/2019
Reeditado em 04/02/2019
Código do texto: T6565804
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