CAUSOS DAS VELHAS ESTRADAS DE FERRO

Foi na década de 1950, quando ainda existiam no Brasil as velhas estradas de ferro, que cruzavam uma boa parte do território de São Paulo que aconteceram vários casos, que agora se conta em forma de “causo”. As Companhias de Estrada de Ferro que cruzavam o território paulista nessa época eram: a Companhia Paulista de Estrada de Ferro, a Estrada de Ferro Mogiana, a Estrada de Ferro Araraquarense, a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, a Estrada de Ferro Sorocabana. Quase todas elas tinham ramais ferroviários que interligavam cidades próximas ao tronco da via férrea principal.

A Companhia Paulista tinha vários ramais que se interligavam com a linha troco (bitola larga com 1,60m de largura), a várias cidades através de linhas com bitola estreita (1,00m de largura), Dentre esses ramais, um deles saía da cidade de Rincão, passava por Jaboticabal, e servia as cidades de Taiuva e Taiaçu. Posteriormente, na década de 1960, já no governo paulista de Laudo Natel, por ser deficitário, esse ramal foi desativado.

As locomotivas, nessa época, eram máquinas movidas a vapor, eram as famosas “Maria Fumaça”. Não sei a que título lhe deram esse apelido, mas assim eram conhecidas. Eram máquinas que utilizavam lenha para ser queimada nas caldeiras e fornecer calor para o aquecimento da água que produzia o vapor para acionar os êmbolos dos pistões que movimentavam as máquinas. Então para conduzir tais locomotivas, eram necessário duas pessoas, o maquinista, que era quem conduzia a máquina, e um foguista, que era o auxiliar e responsável em manter o fogo acesso, alimentando-o com a lenha combustível, e mantendo a pressão do vapor em nível adequado ao funcionamento. Também era dele a responsabilidade por abastecer a máquina com água, nos pontos certos de abastecimento, onde uma caixa d’água enorme ficava ao lado dos trilhos e, o maquinista parava a máquina no ponto estratégico e o foguista descia um tubo enorme e, por gravidade, a água descia e abastecia o reservatório da locomotiva. Normalmente o empregado começava trabalhando como foguista e, com o passar do tempo, acabava sendo promovido para maquinista.

Entretanto, enquanto existiu o ramal ferroviário entre Rincão a Taiaçu, muitas coisas interessantes aconteceram e que passo a relatar.

Uma das coisas interessantes que acontecia, era que nas máquinas a vapor, na sua chaminé, às vezes saiam pequenas partículas de carvão incandescente (pequenas brasas) que, se as janelas dos vagões de passageiros estivessem abertas, poderiam penetrar nos vagões e, além da sujeira que provocava, pois brasa apagada vira carvão, também poderiam provocar pequenos furos nas roupas das pessoas.

Assim, certo dia, um senhor todo elegante, que normalmente era chamado de “almofadinha” estava viajando de Jaboticabal para Taiuva.

No mesmo vagão, viajava um matuto que havia colocado um litro de pinga, no bagageiro superior, destinado a pequenos volumes. Quando o trem fazia alguma curva, o litro de pinga que estava solto no bagageiro, rolava no sentido de cair. O almofadinha todo preocupado assim falou para o matuto: – Meu senhor, o litro vai cair! O matuto nem dava bola. O trem ia balançando e era a mesma história. O litro ameaçava cair, o almofadinha já avisava o matuto: – O litro vai cair!

Depois de vários avisos, o matuto resolveu se manifestar, e assim falou: -- O senhor é mesmo inxerido, não? – O sinhor tá preocupado cum meu litro de pinga, e seu paletó tá pegando fogo i eu num tô falano nada!!!

Noutra ocasião, no trem viajava uma professorinha que dava aula na cidade vizinha à que ela morava. O meio de transporte por trem era o mais adequado para ela, naquela época.

Era no final de maio e com a proximidade da estação do Inverno, a temperatura já estava bastante fria.

A professorinha sentou-se num banco, onde já estava sentado, do lado da janela, um caboclo que estava viajando na mesma direção.

A janela do trem estava aberta. O vento frio que entrava pela janela estava cortante, e a professorinha, embora estivesse agasalhada, estava incomodada com o vento frio que entrava pela janela.

Então educadamente, como toda boa professorinha, pediu ao senhor para fechar a janela, assim dizendo: – Meu senhor, por gentileza, queira fechar a janela, por favor! O caboclo lhe respondeu: – Não carece, minha senhora.

O frio continuava a castigar. A professora, novamente, pediu: – Meu senhor! Por favor! Feche a janela que o frio está me incomodando. Novamente o caboclo lhe respondeu: – Não carece.

A professora, já não mais aguentando o frio e a indiferença do caboclo, levantou-se, dobrou-se por cima dele e fechou a janela.

O caboclo, então, com toda a calma do mundo lhe disse: - Num falei que não carecia, moça! – A janela num tem vidro!!!!

Outro causo interessante se deu quando um senhor bem vestido, sentou-se no vagão de passageiros ao lado de um jovem matuta.

Naquele tempo nem se cogitava da proibição de não se fumar em trens, ônibus ou lugares fechados.

A viagem seguia e, de repente, o cavalheiro tirou do bolso do seu paletó um finíssimo charuto Havana e preparava-se para acendê-lo.

Então ele virou-se para a jovem e disse: – Senhorita! Porventura o finíssimo e perfumado olor desprendido da fumaça do meu havana, irá incomodá-la?

A jovem, sem ter entendido patavina alguma, respondeu: – Fale cum o pai. Si ele dexá nóis casa!

Outro causo interessante se deu quando uma senhora, que nós hoje chamamos de terceira idade, viajando no trem, teve um acesso de tosse e, educadamente, foi tossir na janela. Acontece que essa senhora usava dentaduras, e durante a tosse, com o intuito de expelir alguma secreção, foi cuspir para fora da janela. Nesse momento, por uma fatalidade, ela acabou cuspindo fora suas dentaduras.

A coitada entrou em desespero. Como ela ia fazer agora, se não tinha condições financeiras para mandar fazer novas dentaduras. Não ia mais poder chupar cana, que ela tanto gostava. Nem mesmo comer amendoim e paçoquinha nas festas juninas. A coitada era um pranto só.

Um senhor que viajava no banco ao lado, vendo o desespero da velha, resolveu ajuda-la. Tomou de um saco que carregava onde existiam vários pares de dentaduras, e disse para que ela escolhesse a que mais lhe servisse.

A senhora foi experimentando uma por uma até que achou duas que se ajustaram na sua boca.

Já com um sorriso nos lábios, mostrando novos dentes, disse para o senhor que não tinha como pagar pelas dentaduras, ao que ele lhe disse que não iria custar nada.

Ela vendo aquele gesto de bondade, em receber aquele presente que a deixou tão feliz, perguntou se ele era dentista. Então ele respondeu: – Não, eu sou coveiro!!!!...

Ilha Solteira/SP

01/05/2015 – 21:35h

Daniel L Oliveira
Enviado por Daniel L Oliveira em 01/05/2015
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