Seu Hipocondrilho

Seu Hipocondrilho era um dos habitantes mais populares do Terceiro Distrito, muita junta médica foi formada pra estudar o causo dele, pra tentar entender a natureza do trauma sofrido...

A mãe dele dizia que tudo tinha começado em tempos de guri quando fora coiceado por um porco... Não que coice de porco seja lá alguma coisa muito relevante, mais vá lá! O guri era pequeno...o coice desequilibrou a criança que caiu, e dar cabeçada em pedra sempre acontece! (Sempre tem um pedra batendo em cabeça pra justificar a soma recessiva de tendências genéticas no casamento da parentada...)

Pois o seu Hipocondrilho foi aonde mais longe chegou a humanidade na junção tão intensa e perigosa da mania de doença com a auto medicação...Não tinha semana que ele não passasse na Pharmácia Central, e já da porta ia gritando pro Pharmaceutico: "Não chegou nenhum lançamento, Seu Analgésio?"

Tendo novidade, ele levava!

Coisa que sempre tinha em dia era o grau dos óculos, porque ai que não pudesse ler as bulas de cabo a rabo! Raramente ele ia no médico, mas por força da necessidade por vezes se via obrigado...quando não entendia alguma coisa consultava o Dr. Eufrates, entrava no consultório, atirava a caixa do remédio em riba da mesa e dizia: "Destrincha isto daí e me diz que doença tenho de pegá pra tomá este remédio!"

Pois de tanto tomar remédio e ler bula Seu Hipocondrilho além da mania de doença desenvolveu outra mania perigosa, a de achar que sabia mais que os médicos e passou a andar pela rua dando palpite a torto e a direito pra todo sintoma encontrado no caminho... Dor de cabeça: Fontol... Azia e má digestão: Magnésia Bisurada... Caganeira: Enteroviofórmio... Mulher se queixando do marido: Regulador Xavier...

Tanto se inflou nesta carreira de médico voluntário itinerante que até uma requisição fez pro Instituto Universal Brasileiro, tentando trocar o diploma do Curso de Datilografia que ele fez por correspondência por um de Médico...

Vai daí como ninguém é eterno, porque até mesmo os que bebem formol por água um dia haverão de morrer, teve um dia que o Seu Hipocondrilho bateu com as botas... Sim aquelas mesmas botas onde ele usava aquelas palmilhas com imã pra ativar as "chácaras" dos pés, cosa que ele nunca entendeu, mais usava! No Atestado de Óbito, no campo da causa mortis, ou por falta de espaço ou por falta de paciência, o legista escreveu um lacônico: "Várias"...

A família além da saudade herdou a maior coleção de embalagens de remédio do cone sul...

Até hoje se diz por aqui que aqueles estranhos engravatados que compareceram ao velório eram representantes da Bayer pleiteando levar o corpo do Seu Hipocondrilho pra análise, talvez até fazer uma reciclagem...Mas isto já pertence ao terreno da lenda, vocês sabem quão fértil é a imaginação do povo do interior.

Steve Johnson de Almeida

Steve Johnson de Almeida
Enviado por Steve Johnson de Almeida em 26/12/2013
Reeditado em 26/12/2013
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