É o medo e preguiça que me impedem de viver meu amigo
Caro detestável inimigo, ódio profundo da minha vida. Estou escrevendo para mais uma vez lhe desejar todo azar do mundo. Espero que sua vida seja repleta de infelicidades, que morra da pior forma possível e que de preferência a morte seja algo como morrer carbonizado. Te odeio para sempre.
Sabe B.A, assim como o Vinícius naquele poema “o falso mendigo”, eu também sofro de um tédio enorme da vida. Fora essa ideia ridícula que venho alimentando na cabeça já faz anos, de escrever quem sabe um romance, mas sem saber como. Sabe B.A, é desestimulante tentar, tentar, tentar e nunca conseguir. Eu vivo justificando essa minha incapacidade, com a desculpa de não ter recebido educação e nem estimulo para tal. E que a educação autodidata que tive, talvez tenha me vindo tarde demais. Mas no fundo eu sei que isso não é real. A verdade é que eu não tenho o dom, nem talento para escrever coisas além desses meus despropósitos, dos quais lhe dou as vezes pra ler. E que angustia que dá!
Sabe B.A, Eu ainda não sei dizer se essa necessidade que sinto de escrever, é o que realmente sinto, ou o que me forço a sentir para ter algo que fazer da vida. Um dilema digno de um poema do Pessoa, não? Claro que você agora deve estar pensando mais ou menos assim, “Esvazie-se, se é o que necessita e dana-se todo o resto! “E eu lhe respondo, “mas é o que eu faço, caralho!” O que me é útil no momento do ato e deveras frustrante em seguida.
Pois, além de não desenvolver uma história legal, as bobagens que consigo escrever não me traz admiradores (para inflamar o meu ego). Não me rende dinheiro (para minha sobrevivência). E pior de tudo, eu nunca como alguém. E você deve estar ciente de que tudo que se faz nessa vida é pra ver se a gente consegue comer alguém. O sujeito trabalha pra comer alguém. Compra carro e casa pra comer alguém. Se veste pra comer alguém. Se come pra comer alguém...
Mas como eu dizia no começo, o que mais me tortura é esse tédio enorme que sinto da vida. Eu posso não saber escrever como disse a pouco, mas criatividade e vontade viver não me faltam. Fora que sou um sujeito inteligente e sensível, carinhoso e gentil, e como você percebeu, muito modesto também ha ha ha. Só que sozinho não dá (Assim como não dá pra transar sozinho. Você sabe que masturbação não é a mesma coisa).
Sabe B.A, eu já mandei você ir se foder hoje? Eu alguma vez já te agradeci por ter me apresentado o Osho? Já lhe falei da libertação que foi pra mim ter me “desprendido” um pouco das velhas ideologias moribundas (para não deixar de usar uma frase do hakim bey) já? Esse livro realmente me ajudou a afirmar muita coisa que eu já suspeitava hehehe. Não agradeci? Então ai vai: Valeu cara!
Isso sem falar em todas nossas conversas e discussões sobre o zen, a poesia, o rock progressivo, livros, autores, a arte e loucuras em geral (Se não fosse você eu até hoje não teria entendido direito o progressivo. Se é que eu entendo agora) Enfim, tudo que discutimos até aqui, me fizeram pensar melhor sobre um monte de coisas e descobrir outras. Abrir cada vez mais a mente. Obrigado cara.
Querido amigo irmão B.A, amor da minha vida. Porque será que quando eu penso em te escrever, vem logo na mente essa vontade de fazer a introdução com xingamentos? Como aliás eu fiz no início dessa carta. Será que é por você ser um...
ETERNA INCÓGNITA
Não sei quem sou nem sei por que motivo
Vim ao mundo e o que nele vim fazer.
Sei que penso e, portanto, sei que vivo,
Neste anseio instintivo de viver.
Porque procedo do homem primitivo,
Há rugidos de fera no meu ser.
Bom e mau, triste e alegre, humilde e altivo,
Não me posso, a mim mesmo, compreender.
Pois se, de mim, não sei causa e destino,
Que dos outros, do mundo, saberei?
Que definir, se a mim não me defino?
E sigo, ao léu da vida, a ignota lei,
Descrendo das verdades que imagino
E acreditando em tudo o que não sei.
[Bastos Tigre]