Insisto
Já sentiu aquela sensação de que não deveria ter acordado ou mesmo existido?
Se levantar angustiado, devorado pelas próprias palavras e confusões, com aquele gosto amargo no fundo da língua de que nem em sonhos conseguiu dormir bem, ou ainda depois de rezar uma novena inteira, se sentir culpado, dono de algo que nem sequer é seu?
Colocar um dos pés no chão e o outro permanecer no colchão, e só com isso já sentir um enorme desejo de abandonar tudo e desistir. Sorrir falsamente quando na verdade tudo é hipocrisia e historias que deixam a desejar.
Ladrar sem nada acontecer, sempre mais do mesmo como já diria aquela outra.
Escutar palavras doces, uma sutil preocupação que no final não vai levar a nada. E eu depois disso tudo me sinto pobre.
Pobre de corpo, alma, paixão. Descobrindo que tudo é a mais pura ficção.
Não sei se desisto ou insisto, sigo outra senda ou arrisco. Ter certeza de uma verdade, mas querer tentar uma dúvida.
Os meus ponteiros estão tortos, minhas horas não sabem se atrasam ou adiantam. E o caos, discórdia e desconfiança se instauram no meu peito.
Como proceder numa vida que só me faz querer?
Como realizar um sonho sem sofrer?
Como eu posso viver?
Viver sem comparação, na saudade do coração de algo que morreu e já foi enterrado a eras passadas. Respirar um futuro brilhante sem se voltar, sem se demorar, sem respirar.
Preciso de um pulmão de aço, um fígado de filtro, um coração de pedra e um amor robusto.
Em que casa eu consigo encontrar isso senão na minha?
Uma meditação, duas, três ou seis. Um dicionário rasgado com verbetes decorados se torna palpável a minha volta. O mundo vira confete e eu não pulo mais esse carnaval.
Velhice precoce? Talvez. Infelicidade, com toda a certeza.
Como diria o filósofo: “A angústia é a disposição fundamental que nos coloca ante o nada”.
A angústia agora é minha esposa, a facada no peito minha amante, o sonho despedaçado minha filha puta, e a soberba e sublimação são meus cães de guarda.
Porque você não morre, sonho defasado, atrasado, comodidade sem tesão?
Porque você não morre e me leva junto com todo esse pesar?