Antes da próxima viagem...
Minha doce amiga,
Há quanto tempo não lhe escrevo. Tantas coisas não tão novas pra contar, é que o tempo passa rápido, mas diga lá! Deves ter também tantos pódios pra contar, alguns tombos também, eu imagino.
Já eu continuo essa longa viagem, tem vezes que me some da memória o que eu realmente buscava. Deixa estar. Minha história é quase uma jangada em mar revolto, isso você sabe bem. Mas deixa eu lhe contar o que eu não conto pra ninguém.
Fui à Paris e não conheci uma menina, fiquei triste por lá, mas a dor da gente não sai no jornal. Pois sim, ouvi Chico Buarque em Portugal, depois fui à Uganda, por puro egoísmo, lá, quase esqueci meu grande amor. Mas a gente tem que voltar um dia, àquelas raízes, àquelas lembranças da época em que a casa onde morava era obrigatoriamente chamada de lar. A casa estava escura, mas acendi todas as luzes. ensaiei chorar, Mas que! Só aquela coisa lenta, presa não sei onde. Continua lá.
Arranjei um pequeno trabalho onde as pessoas são sérias, a maioria é tão cinza que se destaca no sol do verão, desde então, aprendi a ficar assim, meio calado. Acho até que estou ficando acinzentado. Alguns antigos amigos se casaram, são deveras ocupados com seus lares. Outros não procurei, planejo ainda uma resposta para quando perguntarem onde anda meu azul? Ou comentarem que esse cinza em meu semblante empalidece.
Mas para compensar participei da São Silvestre, deixei quinhentos pra traz. Ganhei um premio literário, mas ainda sou ingrato, venceu a poesia que arrancou de mim o maior número de lágrimas, e veja só! Gravaram uma de minhas canções, quem sabe até ganho algum dinheiro, quando brigar pelos direitos autorais.
Fui enganado por ai e acabei perdendo coisas, até a graça. Por isso estou aqui, pra variar. Já nem lembrava de escrever, pois só sabia escrevinhar. Que nostalgia é lhe escrever, meu doce anjo! Faz lembrar dos tempos em que eu sorria, lembra? Bobagem. Isso foi há tanto tempo...
Espero que me escreva, que me conte as novidades, fico pouco tempo na cidade, talvez tomemos um chá, breve faço as malas, não sei se vou à Shauara, à Brasília, ou Xangri-lá. Por hora o cinza é fogo! Teu sorriso seria para mim como um tesouro, afinal as pessoas aqui são meio estranhas, gostam de machucar...
Ando meio perdido por cá, ah! Mas qualquer dia desses prometo que vou me encontrar. Só não prometo agora.
Caso não nos vejamos, pequena filha do sol, mando um cadinho bom do meu carinho nessa carta.
Um beijo em seu coração.
Não gosto mais de despedidas...
Wellington Cruvinel
04.08.2011
Rigoroso inverno imposto.