Algum lugar no tempo, algum ano. (uma carta aos Severino...)
Ilustríssimos Senhor,
Venho por meio desta, que infelizmente chegará atrasada, graças à greve dos correios, tratar de minha morte. Parecendo-nos estranho tratar da morte de alguém, mesmo depois de morto, já estar. Parece-nos, mas, não é. Gosto muito de obras póstumas, mas esta, ainda estava aspirando quando escrevi. Felizmente, a greve permitiu-me o trocadilho.
Será uma carta, curta, sem muitos barbarismo ou “locuções formalíssímas”. Estou cansado de viver, e aspiro à morte, mais que tudo.
Fortunamente, eu quero deixar claro, nestas pequenas linhas de melancolia e indignação, que: EU NÃO SOU POETA. Não tenho a pretensão, pretensioso que sou de arquetipizar-me tal coisa. Não escrevo bem, tampouco, tenho amor de tanto e quanto tem os, supostos, poetas.
Sou cronista? Retóricas não cabem em minha carta póstuma, quase. Sem prender-me a meros detalhes, que muitos de vós que me lêem, não sabem se quer o que é a postumidade dos autores. E sim, faço-me de neologismos. Seria um verdadeiro infortúnio privar do mundo, minha genialidade.
Eu sou apenas um homem, algumas vezes até mesmo eu, duvido de mim. Sou apenas um ser humano, ora real, ora romântico. Definitivamente, alguém que mente. Sem dente. Espere. Começo com rimas? Que infortúnio, falar que não sou poeta, e de rimas usufruir.
Minha formalidade, pede, implora que me apresente: sou Fernando de Abreu Souza Guimarães e Silva. Não sou prefeito, e vereador, deputado, senador ou presidente, quiçá. Tenho, ou melhor – como já morri, ou espero tê-lo que esta chegar –, tinha 23 anos. Não sou escritor, poeta ou doutor. Homem, jamais, fui. Eu era mesmo um desafortunado, sem Fortuna alguma (permito-me os trocadilhos semânticos, esperando que meu leitor os conheça se não, o Houaiss existe).
Do quê morri? Acalme-se estranho. Quem sou eu para contar minha morte? Contudo, as lamurias de cá, fazem-me contar: morri de morte morrida. Como os Severino, que de lá e de cá, morrem. Morrem do quê? Não se sabe, morrem de morte morrida. Eu? Morri mesmo de morte morrida.
Vivi uma vida cheia de dogmas e drogas. Era dogma de manhã, drogas a noite. Uma época só dogmas, sem um pouco de drogas, outras, invertia as consoantes. Cansei-me desta tão curta carta.
Deixo assim, meu cordial adeus ao Senhor, dizendo que: não carregue da vida, a própria vida. Carregue da vida, a morte. Porque como o Severino: um dia se morre de morte morrida... E, algo mais, posso dizer: gosto dos Senhores menos da metade do que mereciam que gostasse.
Atenciosamente,
FASCS., ou se preferir: Fefeu.
Autor: agradeço se os devidos créditos me forem dados, pela carta. Fernando de Abreu Souza Guimarães e Silva é uma personagem, meu narrador. Sua carta vai de encontro aos Severino. Portanto, deixo com vocês meu cordial obrigado, dizendo que gosto de vocês mais da metade do que merecem.