Cara Simone, corajosa e polêmica assunção. Sim, há os amantes de poesia, há os que não gostam, e muito pior, existe quem desconheça, ou ignore. Penso que destes grupos, o mais honesto é o daqueles que não gostam. Não gostam e pronto! Não são arrebatados pelas rimas, pelas métricas (cada vez menos utilizadas), pelo ritmo, e, motivo maior, não adentram as metáforas. Mas quem adentra? Quem é capaz de saber o que o poeta quis dizer com o que disse de forma indireta, torta, fingida, fruto de sua visão, sua imaginação, suas referências? Às vezes ele nem quis dizer nada, fez apenas um jogo de palavras, que poeta é isto, um bufão.
Sentir a poesia é algo entranho a quem lê, que transforma os versos e as imagens para a realidade de sua fantasia, e assim, o que lê não é a poesia que o poeta escreveu, é a sua, criada no momento em que leu.
Saber a poesia somente é possível com a interação do poeta, que ele vá a descrever cada metáfora, cada figura de linguagem, e aí não é mais poesia, é a crônica de uma poesia, interpretação de texto, ou qualquer coisa que o valha.
Li um artigo tempos atrás (não guardei o nome da autora) que a poesia é uma arte moribunda, pois nesta época de comunicação instantânea, visual, ninguém quer parar para pensar a poesia, decifrar os versos, entender a forma e o tema. Paradoxalmente, esta mesma época permitiu que milhares de poetas, grandes ou não, não é este o mérito, pudessem publicar, dar conhecimento aos seus poemas, que antes ficavam guardados em pastas de manuscritos, inéditos, conhecidos apenas por uns poucos amigos ou amantes.
Poetar nunca foi tão fecundo, mas também outras formas de literatura se expandiram, os diários antes secretos agora são escritos para à coletividade; as crônicas deixaram as páginas dos jornais e o monopólio de cinco ou seis cronistas; os contos são contados a qualquer hora, qualquer dia, por qualquer razão, complexos, surrealistas, minimalistas, excessivos (Gogol não é mais a referência, mas o importante é contar, é quantos...); romances são planejados para atingir ao público infanto-juvenil, feminino, masculino, hetero, gay, espiritualista, materialista, novos e velhos leitores, ou apenas consumidores.
A literatura é a mais democrática das artes, qualquer alfabetizado pode escrever algo. Certa vez participei de um concurso de poesia de varal: as pessoas escreviam seus versos, que eram pendurados num varal, e o público lia e votava. O resultado foi o de menos, este concurso foi organizado em um bairro da periferia, os textos foram produzidos por donas-de-casa, estudantes, pedreiros, faxineiras, desempregados... e era pura poesia o que havia ali.
Temos hoje onde e como nos expressar, uns vão ler poesia, outros contos, outros crônicas, tenho amigos que somente lêem artigos técnicos, biografias, livros de auto-ajuda, enfim, cada qual encontra a beleza e a compreensão onde crê que estão, a diferença, hoje, é que temos onde procurar.
Profícuo, e feliz, este momento, para os cronistas, os poetas e os leitores. Não importa em que categoria esteja, importa é que esteja, somente a arte pode se renegar.
“O primeiro poeta deste mundo deve ter sofrido muito, quando deixou de lado seu arco e sua flecha, e tentou explicar a seus amigos do que havia sentido diante de um por-do-sol. É bem possível que estes amigos tenham ironizado o que ele dizia, mas ele o fez assim mesmo porque a verdadeira Arte exige que o artista tente mostrar-se. Ninguém pode conviver sozinho com a beleza que é capaz de perceber.”
Kalil Gibran
Para Simone Simon Paz, que instigou-me com seu texto Cronistas e Poetas