"Tudo que tinha que ser falado já foi falado", inclusive esta frase, quem a cantou foi o fingidor Raul Seixas, em direta alusão aquilo que se disse, senão há 10.000, há quase 2.500 anos atrás. Aristóteles, se a memória, na qual pouco confio, novamente não me trair.
Assim o alegre espanto quando ouço, por palavras diferentes, antigos conceitos. Prova cabal de que ainda há poetas, e muitos e bons.
O meio é o e-mail, preferia-o redigido à voz, pois a palavra escrita é tão suave quanto dura. Apenas paradoxo de forma, ou a intenção do olho que olha?
A beleza, assim como o horror, está antes no olhar que no objeto. Esta foi a maneira simplista com a qual expressei aquilo que chamo de olhar poético. Coisas de Carlos, deste, que utiliza bytes, e muito mais daquele, que um dia foi ser guache na vida
[...] Ai, as crianças... Para elas
há um mirante iluminado no olhar de Alécio
e sua objetiva,
(mas a melhor objetiva não serão os olhos líricos de Alécio?) [...]
A beleza, supus, estava ali: Beijei lábios pela manhã, quando a alma ainda é sã - ficou-lhe, todavia, o horror: beijei lábios de amor, deixaram o gosto da dor.
Fui poeta esnobe, de verso dorido e rima pobre. Mas quem me ensinou a sofrer? Decerto não as musas, que destas tive risos, cenas, prazeres da heteromia, jogos de realidade, sedução e festa.
Seria Alphonsus?
“E o sino geme em lúgubre responsos”:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!”
Ou não sofro, como a Tennyson apraz?
“ou no brilho de uns olhos profundos
Haverá razão para um sorriso fugaz”.
Seria este o mote de um épico, como o Ramayanana, de Ly Yu Tang?
“entregar-me a um dever mais alto, e para mais bela vida preparar-me".
É cedo para dar-lhe tão definitiva resposta, meu catedrático poeta. Ainda sigo colhendo impressões, borboletando, nas coisas feitas da vida, nas coisas que vida faz.
"É o príncipe que abre a porta que ilumina parcialmente Maggie, assim como é Maggie que abre a porta que o ilumina parcialmente. O resto de nossas impressões, em ambos os casos, chega diretamente pelo movimento com que o ato é realizado". - Henry James
Incomodo-me sim, sou jovem, embora já não jogue mais botão na calçada, e muito mais me apresento como executivo que como poeta, mas naquele estou, e neste, sempre o sou, divino e humano, como no plano de ação de Whitman:
“Depois que os grandes capitães e engenheiros completarem sua tarefa... o poeta (...) o verdadeiro filho de Deus chegará cantando suas canções. (...) e então (...) todas essas separações e falhas serão reunidas e afastadas umas às outras. A terra inteira, esta terra fria, impassível, sem voz, será completamente justificada (...) gloriosamente realizada pelo verdadeiro filho de Deus, o poeta".
Em minha primeira sessão de acupuntura, a médica perguntou-me se eu achava que vivia bem, e obtendo resposta afirmativa, cercou-me o rei com um simples e gracioso movimento do cavalo: "e o que você considera que seja viver bem?"
Hesitei em lhe falar sobre o devocional e o existencial. Sua larga compreensão, fruto de suas práticas orientais e leituras de Kafka e Maquiavel, assustaram-me, eu que ainda não concatenei esta dicotomia. De vida, só entendo, como Lorca, viver, e sempre a caminho da morte.
“Alguns me chamam de idealista, e de fato o sou. Só que de um tipo diferente, daqueles que arriscam sua vida para demonstrar suas verdades"
Quem quiser conhecer a ligação entre ação e pensamento, não pode deixar de conhecer Che Guevara, porque, mesmo que não lhe perceba, o mesmo terá contato com textos de exacerbado lirismo. Talvez a emoção da bala torne mais bela à fala.
O exemplo é esta carta, a última para seus "velhos", que além da justificativa acima, tem esta abertura:
"Sinto novamente sob meus calcanhares as costelas do Rocinante..."
Sinto sobre mim a pena e o tinteiro, dizendo-me: "escrevas tua história, invente-a, só não te esqueças, depois. de vivê-la".
E para isto que tento entender o tempo, que passa, e o homem que não se estabelece, não se faz inteiro.
“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa, Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive".
Antes de se tornar, em literatura, o único Nobel de língua portuguesa, Saramago escreveu, num janeiro de Lanzarote, que "o próprio Pessoa, que foi grande mesmo, ainda que de outra grandeza, nunca foi inteiro". Logo, não tive outro remédio que me tornar, também, humano.
Caro Feitosa, não lhe respondi nada, e talvez nem me atreva, faço antes como Osvaldo Montenegro: "que a arte nos aponte uma resposta, ainda que ela não saiba". Como manter ao homem e ao poeta?
“Que a vontade e a energia, embora raras,
São muito menos raras do que o amor".
Mathew Arnold em "Um adeus"; se algo sei, é que não nos fazemos de despedidas, mas de encontros; encontros na telúrica tarde do suicídio vermelho do sol, quando na noite a lua trará estrelas para carpirem a ausência da luz. Entanto, cá embaixo os boêmios cantarão à sua ação: o luar.
O camponês, em suas manhãs orvalhadas, produz vinho, feliz por pisar com sua família os frutos que escolheu; na taberna, ante o calor da exaurida madeira, o vinho reunirá poetas e musas, alimentando risos, toques suaves, o olhar mais acurado, pequenas distrações, desilusões; seremos novamente Deuses, recriando com nossos olhares e nossas palavras todos amores sentidos, todos gestos de adeus, toda beleza e tristeza e ternura que o mundo algures aprendeu.
"Não ao ser, a morte é, a arte fica."
Se o Cony permitir, será este meu epitáfio.
Para a amiga poeta Cissa de Oliveira
*esta carta foi uma resposta e início de uma correspondência, há alguns anos atrás, com o poeta Soares Feitosa, editor do site Jornal de Poesia, que, a la Rainer Maria Rilke, também deu seus sábios e virtuosos conselhos aos poetas jovens.
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Assim o alegre espanto quando ouço, por palavras diferentes, antigos conceitos. Prova cabal de que ainda há poetas, e muitos e bons.
O meio é o e-mail, preferia-o redigido à voz, pois a palavra escrita é tão suave quanto dura. Apenas paradoxo de forma, ou a intenção do olho que olha?
A beleza, assim como o horror, está antes no olhar que no objeto. Esta foi a maneira simplista com a qual expressei aquilo que chamo de olhar poético. Coisas de Carlos, deste, que utiliza bytes, e muito mais daquele, que um dia foi ser guache na vida
[...] Ai, as crianças... Para elas
há um mirante iluminado no olhar de Alécio
e sua objetiva,
(mas a melhor objetiva não serão os olhos líricos de Alécio?) [...]
A beleza, supus, estava ali: Beijei lábios pela manhã, quando a alma ainda é sã - ficou-lhe, todavia, o horror: beijei lábios de amor, deixaram o gosto da dor.
Fui poeta esnobe, de verso dorido e rima pobre. Mas quem me ensinou a sofrer? Decerto não as musas, que destas tive risos, cenas, prazeres da heteromia, jogos de realidade, sedução e festa.
Seria Alphonsus?
“E o sino geme em lúgubre responsos”:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!”
Ou não sofro, como a Tennyson apraz?
“ou no brilho de uns olhos profundos
Haverá razão para um sorriso fugaz”.
Seria este o mote de um épico, como o Ramayanana, de Ly Yu Tang?
“entregar-me a um dever mais alto, e para mais bela vida preparar-me".
É cedo para dar-lhe tão definitiva resposta, meu catedrático poeta. Ainda sigo colhendo impressões, borboletando, nas coisas feitas da vida, nas coisas que vida faz.
"É o príncipe que abre a porta que ilumina parcialmente Maggie, assim como é Maggie que abre a porta que o ilumina parcialmente. O resto de nossas impressões, em ambos os casos, chega diretamente pelo movimento com que o ato é realizado". - Henry James
Incomodo-me sim, sou jovem, embora já não jogue mais botão na calçada, e muito mais me apresento como executivo que como poeta, mas naquele estou, e neste, sempre o sou, divino e humano, como no plano de ação de Whitman:
“Depois que os grandes capitães e engenheiros completarem sua tarefa... o poeta (...) o verdadeiro filho de Deus chegará cantando suas canções. (...) e então (...) todas essas separações e falhas serão reunidas e afastadas umas às outras. A terra inteira, esta terra fria, impassível, sem voz, será completamente justificada (...) gloriosamente realizada pelo verdadeiro filho de Deus, o poeta".
Em minha primeira sessão de acupuntura, a médica perguntou-me se eu achava que vivia bem, e obtendo resposta afirmativa, cercou-me o rei com um simples e gracioso movimento do cavalo: "e o que você considera que seja viver bem?"
Hesitei em lhe falar sobre o devocional e o existencial. Sua larga compreensão, fruto de suas práticas orientais e leituras de Kafka e Maquiavel, assustaram-me, eu que ainda não concatenei esta dicotomia. De vida, só entendo, como Lorca, viver, e sempre a caminho da morte.
“Alguns me chamam de idealista, e de fato o sou. Só que de um tipo diferente, daqueles que arriscam sua vida para demonstrar suas verdades"
Quem quiser conhecer a ligação entre ação e pensamento, não pode deixar de conhecer Che Guevara, porque, mesmo que não lhe perceba, o mesmo terá contato com textos de exacerbado lirismo. Talvez a emoção da bala torne mais bela à fala.
O exemplo é esta carta, a última para seus "velhos", que além da justificativa acima, tem esta abertura:
"Sinto novamente sob meus calcanhares as costelas do Rocinante..."
Sinto sobre mim a pena e o tinteiro, dizendo-me: "escrevas tua história, invente-a, só não te esqueças, depois. de vivê-la".
E para isto que tento entender o tempo, que passa, e o homem que não se estabelece, não se faz inteiro.
“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa, Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive".
Antes de se tornar, em literatura, o único Nobel de língua portuguesa, Saramago escreveu, num janeiro de Lanzarote, que "o próprio Pessoa, que foi grande mesmo, ainda que de outra grandeza, nunca foi inteiro". Logo, não tive outro remédio que me tornar, também, humano.
Caro Feitosa, não lhe respondi nada, e talvez nem me atreva, faço antes como Osvaldo Montenegro: "que a arte nos aponte uma resposta, ainda que ela não saiba". Como manter ao homem e ao poeta?
“Que a vontade e a energia, embora raras,
São muito menos raras do que o amor".
Mathew Arnold em "Um adeus"; se algo sei, é que não nos fazemos de despedidas, mas de encontros; encontros na telúrica tarde do suicídio vermelho do sol, quando na noite a lua trará estrelas para carpirem a ausência da luz. Entanto, cá embaixo os boêmios cantarão à sua ação: o luar.
O camponês, em suas manhãs orvalhadas, produz vinho, feliz por pisar com sua família os frutos que escolheu; na taberna, ante o calor da exaurida madeira, o vinho reunirá poetas e musas, alimentando risos, toques suaves, o olhar mais acurado, pequenas distrações, desilusões; seremos novamente Deuses, recriando com nossos olhares e nossas palavras todos amores sentidos, todos gestos de adeus, toda beleza e tristeza e ternura que o mundo algures aprendeu.
"Não ao ser, a morte é, a arte fica."
Se o Cony permitir, será este meu epitáfio.
Para a amiga poeta Cissa de Oliveira
*esta carta foi uma resposta e início de uma correspondência, há alguns anos atrás, com o poeta Soares Feitosa, editor do site Jornal de Poesia, que, a la Rainer Maria Rilke, também deu seus sábios e virtuosos conselhos aos poetas jovens.
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