CARTA ABERTA À MINHA FILHA ANA CLÁUDIA - Matéria da minha coluna, Cantinho do Zé Povo, n'O Jornal de Hoje - Natal-RN, edição de 24 de Janeiro de 2009
Minha querida filha Claudinha:
Hoje eu ia, como sempre, ia tentar colocar um sorriso no rosto de cada um dos meus leitores(as); mas o peste do Rossine, aquele mesmo da Budega Véia e conterrâneo de Duruca, me mandou uma mensagem via internet; minha filha; e mudou o rumo da prosa do Cantinho do Zé Povo, nessa semana. Seu velho pai, “bruto qui só tôco de roçado”, se enterneceu e resolveu repassar a mensagem especialmente a você; estendendo a mesma a todas as minhas leitoras; “uis macho véio, meus leitô qui me adiscúipe”. Êi-la, na íntegra! Certo dia, uma mulher chamada Anne, foi renovar sua carteira de motorista. Quando lhe perguntaram qual era a sua profissão, ela hesitou. Não sabia bem como se classificar. O funcionário insistiu:
- “O que eu pergunto é se tem um trabalho”.
- “Claro que tenho trabalho, exclamou Anne; sou mãe”.
E o funcionário, friamente:
-“Nós não consideramos isso um trabalho. Vou colocar dona de casa”.
Uma amiga sua, Marta, soube do ocorrido e ficou pensando a respeito por algum tempo. Um dia, ela se encontrou numa situação idêntica. A pessoa que a atendeu era uma funcionária de carreira, segura, eficiente. O formulário parecia enorme, interminável. A primeira pergunta foi:
- “Qual é a sua ocupação”?
Marta pensou um pouco e sem saber bem como, respondeu:
- “Sou doutora em desenvolvimento infantil e relações humanas”.
A funcionária fez uma pausa e Marta precisou repetir pausadamente, enfatizando as palavras mais significativas. Depois de ter anotado tudo, a jovem ousou indagar:
- “Posso perguntar o que a Sra. faz exatamente”?
Sem qualquer traço de agitação na voz, com muita calma, Marta explicou:
-“Desenvolvo um programa a longo prazo, dentro e fora de casa”.
Pensando na família, ela continuou:
-“Sou responsável por uma equipe e já recebi 4 projetos. Trabalho em regime de dedicação exclusiva. O grau de exigência é de 14 horas por dia, às vezes até 24 horas”.
À medida que ia descrevendo suas responsabilidades, Marta notou o crescente tom de respeito na voz da funcionária, que preencheu todo o formulário com os dados fornecidos. Quando voltou para casa, Marta foi recebida por sua equipe; uma menina com 13 anos, uma com 7 e outra com 3. No andar de cima, pôde ouvir seu mais novo projeto, um bebê de 6 meses, testando uma nova tonalidade de voz. Feliz, Marta tomou o bebê nos braços e pensou na glória da maternidade, com suas multiplicadas responsabilidades. E nas horas intermináveis de dedicação: Mãe, cadê meu sapato ? Mãe, me ajuda a fazer a lição ? Mãe, o bebê não para de chorar. Mãe, você me pega na escola ? Mãe, você pode assistir minha dança ? Mãe, você compra ? Mããããeeee... Sentada na cama, Marta pensou; se ela era doutora em desenvolvimento infantil e em relações humanas, o que seriam as avós ? E logo descobriu um título para elas; doutoras-sênior em desenvolvimento infantil e em relações humanas. As bisavós; doutoras executivas sênior. As tias; doutoras assistentes. E TODAS AS MULHERES, mães, amigas, esposas, companheiras; DOUTORAS NA ARTE DE FAZER A VIDA MELHOR. O que eu quiz dizer ao repassar especialmente a você essa mensagem, Claudinha, é que num mundo onde se dá tanta importância aos títulos, em que se exige sempre mais especialização na área profissional, ainda está em tempo de você continuar seus estudos e ganhar seu título profissional. Você, assim como sua mãe e minhas queridas leitoras, já são DOUTORAS NA ARTE DE FAZER A VIDA MELHOR. Por enquanto, dedicação exclusiva ao seu projeto chamado MARIA FERNANDA, hoje, 24 de jan de 2009, com 16 dias de nascida. Sei que nunca pude dar à sua mãe, a você e seus irmãos, o melhor de tudo. Mas fique certa, que desde o dia 12 de dezembro de 1992, quando me libertei das algemas do alcoolismo, venho tentando, com todas as forças que ainda me restam, lhes dar o melhor que possa existir dento desse meu coração véio e chêi de remendo e de amor por vocês...Em outras palavras, “já que não posso lhes dar o melhor de tudo; procuro lhes dar o melhor de mim”... Beijos do seu velho pai, Bob.