Cartas de Um Viajante - XIII

Estou de frente para o mar, aqui se parte a minha ultima mensagem.

Adeus, minha amada, adeus! Eu me vou agora, não tenha dó de mim,

não derrame sequer uma lágrima, pois todas o mar já derramou em suas bravas ondas sonoras.

É tão tranquilo... Tão puro... Aqui será meu leito, então minha amada, adeus! Saiba, eu nunca fui um bom amante pra ti, deveras admito isso, entretanto embora todas as situações quais passamos e quais fiz você passar às escondidas, eu te amei, e te amo a cada segundo deste meu breve fim, como um por do sol nas terras do leste, sempre tão cedo... Não consegui completar uma só tarefa em minha vida, tudo que fiz, fiz inacabado, ansiei tantos fins e tantos outros vieram, completamente diferente de meus anseios, esse sentimento de perda, de dor...

Aquele sentimento que abate quando sabe que o culpado de toda sua desgraça é apenas você, entretanto desta vida eu não podia ter tirado tal ventura, tal tranquilidade quanto aquela dama de verde, aquela dama das rosas brancas que me tirou todos os sofrimentos que por mim já era guardado, e talvez por ela eu parta mais rápido pois a ausência dela me destrói tão quanto essa saudade do vazio, esse tédio solitário que sempre me abateu o seio.

Vi toda minha família morrer pra tentar salvar um miserável, pensei já em vingança, mas isso não me é valido, não passo

de um viajante que não busca mais o conhecimento, mas sim a morte, não contemplo mais nada, apenas as trevas que me contemplam e brincam comigo como se fosse um joguete em seu jogo sádico... Não ter reconhecimento de nada, não ter a bravura da luta, não ter as liras puras, nem melodias belas... Todas as frases já foram faladas, todos os amores já foram amados, toda a vida já morreu... E eu agora morro também.

Não adianta viver como um nada, um reles subalterno, não penso em nada e pensar me entristece, eu já não aguento mais desalegrias... Sinto um arrependimento grande, não fui soldado quando pude ser... Não fui bravo quando deveria, não suportei a dor quando sabia que a aguentaria. Acredito eu já ter perdido todos que me eram valiosos nessa vida... As folhas já se jogam em seu ritual suicida e outras morrem cecando à espera do inverno. As folhas estão mortas e nenhuma mais sopra em meu rosto com o toque gentil e verde... O verde já está morto. E o branco se faz ao longe, mas sem rosas e sem perfume, apenas uma poeira de clorofórmio que me intoxica e me lembra do fim. Nunca mais vi o pôr-do-sol e nenhum cinza como o daquele olhar... Ai minha mãe, ai meu pai... Por que vieste me assombra?! Estava tudo tão bem com a certeza que nenhum mais

sofrimento havia sido destinado a mim, e me fazem isso... Ai de mim! Lutaram e morreram inutilmente... Mas tudo bem, tem certas causas

em que a desistência é sempre melhor.

Morrerei desnudo, para poder sentir todo o frio abater-me o corpo, para ser leve e livre como uma pluma... Como uma pluma negra perdida pelo oceano.

Agora minhas lembranças me abatem... Ravenus, o corvo que sempre me acompanhou... Aonde estás tu? será que vivo? vindo de ti, acredito que sim... Sempre tão bravo e melancólico, suportaria o peso todo de uma vida pelos lábios gentis de uma dama que mimosa sorriria para ele, sempre tão romântico e tão fúnebre... Por quê a presença dele me conforta? (...) Marik, sempre o subjuguei... Nunca tinha reparado que ele era sempre forte, sempre sério... Ouvia como um soldado, agia como um soldado, disciplinado, esforçando-se ao máximo para servir seu general... Kedad. As sombras frias e gélidas, o riso ironico, o ar sarcástico, tudo que em mim me trás mais ódio... Ele ainda me assusta e saber que jamais pensarei nele de novo me conforta, apenas espero não o ver no inferno.

Não culparei a ti Arlid, que me pôs em todas essas desgraças, pois a culpa de fato é minha, sempre curioso queria conhecer o mundo, queria sair daquela vila que jamais cresce e crescer, mas eu não sabia da minha pequenez. A miséria é grande e a alegria é efêmera... A fome, a morte, o sofrimento, a escuridão, alucinações perdida dentro de um sub-solo... E agora, este mar tão grande, verdejante e bravio, como se fosse um leito a espera do suicida para o seu eterno descanso, e eu ando tão cansado.

Tantas coisas me atormentam a mente, a falta de cultura, a falta de talento, a falta das letras, a saudade de meu amor... A perda de meus entes. O Passado que jamais se apaga.

Dessa vida, apenas tirei uma certeza com essa viagem, eu não sou um druida e estou a longe de o ser... Sou um mestiço desgraçado, nem lobo, nem homem... Um loup-garou. Aprendi a controlar o frenesi selvagem, mas de que isso me adianta!? Só me torna mais dificil a morte... Andar como um louco desvairado, um lobo gigante com sede de paz, uma fera com íntimos de vingança e pré-potencia para no final de tudo me tornar um nada. Não fazer dignamente nada, apenas me matar com a certeza que não passo do nada.

O oceano é infinito.

Sinceras despedidas inacabadas,

Ralph Wüf.

Ralph Wüf
Enviado por Ralph Wüf em 04/06/2008
Reeditado em 04/06/2008
Código do texto: T1018953
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