JOHN MILTON
A eternidade do maior poeta épico inglês
Quando John Milton morreu, em 08 de novembro de 1674 – já cego, sem importância política, em parte esquecido – deixou para a literatura universal o mais importante poema épico em língua inglesa, “Paraíso Perdido”, e uma obra que influenciaria o mundo. Porém, perdida a vida e o Paraíso, a ponto de ter como obituário a frase “John Milton era um velho cego que escreveu documentos latinos”, dito por um, este sim, esquecível crítico, o poeta ganhou a eternidade, reconquistando o lugar que sua criatividade e entendimento da humanidade lhe haviam reservado.
Para entender como o homem John Milton conviveu com o poeta John Milton, é preciso mergulhar em seu espírito rebelde. Nascido em Londres, no dia 09 de dezembro de 1608, Milton ocupou cargos públicos de relevância, como o de Secretário de Línguas Estrangeiras, durante o período do governo de Oliver Cromwell, interrupção da longa tradição monárquica inglesa. Em sua vida pública, defendeu os ideais republicanos, especialmente em seus textos políticos intensos. Porém, com a restauração da monarquia inglesa, em 1660, sob o reinado de Charles II, Milton – que havia ficado cego alguns anos antes – foi empurrado ao ostracismo.
“Paraíso Perdido”, obra da fase madura de Milton, difere em vários aspectos de seus primeiros e populares trabalhos, como L'Allegro (1631), Il Penseroso (1633), Comus (a masque) (1634) e Lycidas (1638). Publicado em 1667, “Paraíso Perdido” é fruto de um esforço heroico, um poema épico que fala mais sobre o espírito humano e a liberdade de escolha, do que sobre aventuras e viagens – como as obras mais conhecidas do gênero: a “Ilíada” e a “Odisseia”, de Homero, ou a “Eneida”, de Virgílio. Composto em 12 cantos, à moda clássica, o poema inova ao escolher um verso típico da literatura em língua inglesa, o pentâmetro iâmbico. O rebelde Milton, mesmo já em sua velhice, inova ao utilizar versos brancos (sem rima).
Na vida de Milton, nada foi linear. O período turbulento da juventude, durante seu curso de Artes em Cambridge, em que enfrentou inúmeras polêmicas com professores e colegas, os três casamentos, as viagens e os altos e baixos na vida pública deram ao poeta o tom amargo que se vê em “Paraíso Perdido”. A obra, que se inicia com Adão e Eva – representando a saga da humanidade – no episódio do pecado original e da expulsão do paraíso, tem Satã como personagem fundamental, anjo caído que ainda busca retomar o céu e superar o criador.
“Paraíso Perdido” poderia ter sido escrito em latim ou em qualquer das oito línguas que John Milton dominava. Mas foi em inglês que Milton produziu a obra, elevando o patamar da literatura em seu país. A sequência seria “Paraíso Reconquistado” (1671), em que Satã – em outro tempo – tenta tirar Jesus do caminho da redenção do homem, lançando suas proverbiais tentações.
Também de 1671, o drama “Sansão Agonista”, publicado no mesmo volume de “Paraíso Reconquistado”, marca o fechamento da trajetória de Milton. Não por acaso, narra mais um episódio bíblico, a tragédia do herói que perde tudo, inclusive a visão, mas tem seu último ato de redenção. Mera semelhança?
(Parte da coletânea HISTÓRIAS DE POETAS, de William Mendonça. Direitos reservados.)