Epaminondas Ferreira Lins
François Fénelon, membro ilustre do episcopado francês, e certamente um dos homens mais admiráveis de sua época, em uma de suas reminiscências clássicas, escreveu que “as almas belas são as únicas que sabem o que há de grande na bondade”. A suavidade e a elegância metafórica dessa frase, de imediato nos remete a síntese memorial do querido tio Nondas, cujo enredo de sua história de vida encontra-se grifado no cerne da beleza caridosa de sua alma, e na essência altruísta de seu coração florido; naturezas que se reverteram em virtudes praticadas por toda sua vida, as mesma, simplesmente as mesmas que perpetuaram sua memória.
FAMÍLIA É ONDE COMEÇA NOSSA HISTÓRIA...
Independente de seus conceitos - sejam eles, filosóficos, antropológicos, religiosos ou do próprio pensamento social pós-moderno - a família, em sua essência, por ser a maior riqueza de nossas vidas, sem dúvida alguma se reverte em toda sociedade num tesouro de alva porcelana. É nela que nossa história começa. É nela que se alicerça nosso maior patrimônio de vida, o amor fraternal que nos acompanha para muito além desta vida...
Não seria diferente que a linhagem da Família Lins surgida em 1912, na pequena e aconchegante Vila de Fonte Boa, por intermédio da união e do enlace matrimonial do apaixonado casal Belarmino e Zulmira, constituiu-se em uma dessas riquezas floridas. E, como todo “jardim familiar” não tardou também chegar à primeira florada, fruto do amor e da paixão desse afortunado e pranteado casal.
O nascimento do primogênito Epaminondas Ferreira Lins, ocorrido na terça-feira do dia 15 de julho de 1913, foi um desses perfumados eventos. Tio Nondas chegou feito presente de Deus, encantando a todos e contagiando seus familiares com um amor especial, ternura cintilante daquelas que só existe no universo dos anjos, um amor intenso, puro, feliz e incondicional. Assim, com a chegada do primeiro filho, vovô Belarmino e vovó Zulmira passaram a desempenhar novos papeis e assumir novas responsabilidades. Definitivamente foi uma mudança na vida do casal, uma mudança constituída de luz e felicidade, pois o amor entre eles agora seria compartilhado em laços mais fortes, pois a família estava crescendo.
A INFÂNCIA
Apesar de ter sido o primeiro filho biológico dos meus avós paternos, tio Nondas teve por toda sua infância a companhia de seu querido irmão Alberto, filho do vovô Belarmino com a senhora Mônica de Carvalho. Apenas para relembrar, tio Alberto já tinha sido acolhido no seio materno de vovó Zulmira antes mesmo do enlace matrimonial, e quando tio Nondas chegou já era um privilegiado por ter em sua família um irmão para compartilhar de sua vida.
O tempo de sua meninice foi vivido intensamente. Tia Eurídice me contou que ele adorava correr pelo descampado do terreiro de sua casa, ir pescar as margens do rio Cajaraí e jogar bola na pequena praça que ficava a beira do barranco. Aliás, a beira do barranco era para ele um lugar especial, mágico. Lá costumava ir todas as tardes com tio Alberto para juntos apreciar o pôr-do-sol.
Quanto aos estudos elementares, seguindo a tradição, soubemos por intermédio de tia Clarisse que ele iniciou as primeiras letras em sua própria casa pelas mãos caridosas de sua mãe, e ao chegar à escola regular já sabia ler e escrever. Foi aluno dedicado, tendo concluído os estudos primários e secundários no grupo Escolar Estelita Tapajós que se localizava perto de sua residência.
Tempos atrás meu querido e saudoso pai, Maneco, rememorando comigo a história de nossa Família em Fonte Boa, por intermédio de suas lembranças, deu-nos ciência de que seu irmão Nondas sempre foi um homem muito responsável e solícito, um homem bondoso, e que desde muito jovem jamais se utilizou de qualquer prática ou desculpas esfarrapadas para reclamar ou fugir dos afazeres de casa ou de suas obrigações sociais. Já tio Alberto, em outro momento, recordou que ele vivia sempre em um estado duradouro de alegria intensa, e que apesar das adversidades da vida, era perceptível que a felicidade fazia parte de seu cotidiano desde sua infante idade. Lembrou que foram muito felizes na infante idade. Tio Nondas sempre foi um menino feliz com um coração enorme, um irmão bondoso, e um filho maravilhoso. Por sinal, o irlandês Oscar Wilde (1854-1990) expoente da literatura inglesa, já sustentava no século XIX a ideia de que “a melhor maneira de tornar as crianças boas, é torná-las felizes”.
Por intermédio de uma visão romantizada, daquelas que se cultivava no seio familiar constituída em grande parte das pacatas cidades de idos passados, talvez a feliz infância vivida por tio Nondas, o embalo da boa educação familiar que teve, o constante exercício da espiritualidade, as práticas da moral e do amor fraterno que recebera, possam ter-lhe favorecido a construção de um caráter virtuoso baseadas nos princípios universais que carregaria consigo por toda sua vida terrena.
UM JARDIM QUE NASCEU DE UM GESTO DE AMOR
Vovô Belarmino era proprietário de um barracão comercial existente na sede do município de Fonte Boa, e desde cedo ensinou ao tio Nondas o ofício empresarial. Sua primeira função foi a de balconista, mas diligente e responsável como era, não tardou ascender por merecimento à gerência da loja. Nas dependências do empreendimento comercial da família, tio Nondas viu pela primeira vez a figura fulgurante de uma jovem menina que o encantou. Era a frajola cunhatã de nome Joaninha, filha do senhor Lázaro, um imigrante peruano que era freguês assíduo do barracão comercial da família Lins. Naquele instante, imbuído de um sentimento arrebatador, pode perceber que a sua frente estava aquela que seria o grande amor de sua vida, e que de fato foi o seu maior esteio enquanto o sopro da vida portou. Tio Nondas estava muito mais que certo, pois ela foi mais que isso, foi no sagrado mistério da vida sua própria alma gêmea!
Em certo momento vovó Zulmira percebeu que seu primogênito estava diferente, inquieto, e tudo levavam a crer que ele estava divagando pelas emoções floridas da paixão. Chegou a falar com o vovô Belarmino a respeito da situação. Inquirido, tio Nondas revelou que já há algum tempo tinha conhecido uma moça chamada Joaninha, e que eles estavam apaixonados, que a paixão deles já havia se metamorfoseado em amor verdadeiro. Entretanto, esse amor era vivido de longe pelo respeito às regras culturais que permeava a sociedade daquela época.
Para quem já vivenciou intensamente esse sentimento sabe muito bem o impacto que a paixão do amor promove, e quando se trata da ardente paixão do amor, podemos dizer que o mesmo se assemelhar literalmente as palavras do poeta Luís Vaz de Camões (1524-1580) quando em seu canto lírico e racional diz: “Amor é fogo que arde sem se ver / É ferida que dói, e não se sente; / É um contentamento descontente; / É dor que desatina sem doer”.
Sem demora vovô Belarmino se prontificou a informar os pais da faceira menina às intenções de seu filho. Depois de cumprido todos os protocolos socioculturais da época, já com a permissão e bênçãos de ambas as famílias, tio Nondas e tia Joaninha passaram a enamorar-se. Com o passar do tempo o casal resolveu se unir pelos laços do casamento. O pedido formal foi novamente feito por Belarmino ao próprio pai da moça, seu Lázaro, tudo conforme pregava a tradição dos costumes peculiar daqueles idos. Concedida à autorização o noivado se realizou envolto de uma grande festa.
O casamento religioso realizou-se na histórica Igreja de Nossa Senhora de Guadalupe de Fonte Boa na segunda-feira do dia 29 de março de 1937. Deste feliz consórcio, nasceram 13 filhos, porém somente “sete filhos vingaram”, conforme relatou tia Joaninha, sendo “cinco mulheres e os dois homens”, dentre eles a querida prima Raimunda Maria da Conceição (Jurinha), a Jany, o saudoso e sempre risonho Sósthenes, a Maria do Perpétuo Socorro, a Liney, o Francisco das Chagas (Fran), e a caçula Adeilza Maria Francisca (Bel). O casal adotou também com muito carinho a Maria da Penha, cuja filha Ana Paula, hoje psicóloga festejada, é considerada pela “Socorro” uma sobrinha-filha.
Por força do deficiente tramite do cartório judiciário local, pela falta constante do juiz da Comarca, dentre outros motivos ocorridos que a memória de tia Joaninha não pode recordar o casamento civil só pode ocorrer no ano de 1958. A mesma fora laureada com uma bela festa, cuja cerimônia foi abrilhantada com a presença marcante de sua mãezinha Zulmira. Sim, o fato é que vovó Zulmira já se encontrava estabelecida em Manaus dado o falecimento de seu esposo Belarmino. Vovó Zulmira fez questão de ir a Fonte Boa prestigiar o casamento de seu primogênito. Segundo tia Clarice, esta foi à última vez que ela esteve no chão que viu surgir toda nossa história.
UMA HISTÓRIA DE AMOR E DOAÇÃO
Segundo o Livro Sagrado dos Cristãos, no tempo dos antigos patriarcas, o filho primogênito recebia a primogenitura, e assim herdava o direito de ser o chefe da família quando o pai falecia. Para assumir tal responsabilidade o primogênito tinha que ser digno; e podia perdê-la por causa de iniquidade, o seja, das injustiças promovidas.
Apesar dos avanços do pensamento social e das dinâmicas culturais que já se diversificava naquela época, tal conceito se aplicou a Família Lins de Fonte Boa de forma semelhante ao cenário social passado. Vejamos que com o falecimento do vovô Belarmino - que era o patriarca da família -, tio Nondas passou a ser, juntamente com sua “mãezinha” e seu irmão Maneco, o principal responsável pela manutenção do clã, da casa e do comércio. Tio Nondas era o encarregado pelo armazém comercial e da imensa unidade produtiva assentada no antigo seringal Mororó estabelecido na propriedade de sua família. De fato era o Gerente Geral que tinha de sua mãezinha toda a confiança do mundo para realizar e promover os negócios empresariais.
Tio Nondas trabalhou arduamente durante muitos anos para que seus irmãos mais novos pudessem ter a oportunidade de permanecer em Manaus estudando. Sim! Podemos afirmar incontestavelmente que seus esforços não foram em vão, eis porque trago aqui, à luz da publicidade a informação histórica de extrema importância, ou talvez apenas um mero detalhe esquecido nos porões da memória - que não se pode deixa passar em brancas nuvens – a de que tio Epaminondas e o seu irmão Maneco tiveram nesse processo de redenção social, econômica e intelectual de que puderam usufruir seus irmãos mais novos. Fazemos este resgate histórico familiar para prestar aqui nossas homenagens a estes dois baluartes que abdicaram de uma vida melhor, mais farta, confortável e dos estudos superiores para proporcionar aos seus irmãos uma vida mais digna e amena daquela em que o interior à época proporcionava.
O Filósofo Lao-Tsé (- 570/- 490) já contemplava em suas concepções que “a bondade em palavras cria confiança; a bondade em pensamento cria profundidade; a bondade em dádiva cria amor”. Neste pensamento existe uma similitude com a história de tio Epaminondas, pois quem teve a graça de conhecê-lo, teve também a felicidade de testemunhar sua profunda bondade posta nas práticas de suas ações diárias. Fazer o bem era algo que lhe fazia incontestavelmente um homem feliz. Cativar e promover o amor ao seu redor lhe era extremamente reconfortante. Sua bondade ia sempre além das palavras e do plano das ideias, ela se materializava constantemente em suas atitudes humanistas. Realmente, “fazer o bem é o mais suave prazer que se pode experimentar”, afirmava Henri Amile, poeta e filósofo suíço do século XIX ao esparramar as metáforas de seus versos as nossas reflexões. Fazer o bem independente do tempo e lugar promove a todos nós uma paz interior inexplicável, além disso, semeia no jardim da vida um canteiro cintilante de flores de felicidades que propagaram suas sementes de exemplos as gerações posteriores.
Outro dia desses chuvosos, em uma determinada ocasião cingida de muita alegria e saudade, tia Joaninha me confessou que de todas as grandes alegrias vividas por tio Nondas, as que realmente o deixava eufórico e muito mais do que feliz, era quando ele vivenciava intensamente evento festivo do nascimento de seus filhos. Seus maiores infortúnios se deram pelo dissabor amargo de ver alguns de seus filhos partirem prematuras, assim como o impacto da morte de sua querida, amada e sempre querida mãezinha Zulmira, fato ocorrido no dia 05 de outubro de 1984, dias antes de sua própria partida ao plano espiritual.
A SIMPLICIDADE DE UM GRANDE LEGADO
Martin Luther King, líder de movimentos que buscavam o respeito aos direitos dos negros e o fim da discriminação racial nos EUA, dizia que “pouca coisa é necessária para transformar inteiramente uma vida: amor no coração e sorriso nos lábios”.
Tio Nondas foi um desses homens que sempre enfrentou as adversidades da vida com as mãos cheias de flores, com o sorriso constante nos lábios e com o coração sempre impregnado de amor. Quase nada lhe aborrecia, no entanto quando os funcionários responsáveis pela coleta da castanha e pelo do corte da borracha atrasavam a entrega do produto prometido da semana, tio Epaminondas zangava-se. Irritava-se sim, mas não perdia as estribeiras. Era um homem de negócios e de palavra, e era religioso enquanto aos seus compromissos comerciais, principalmente ao se tratar da entrega destes produtos, pois fazia questão de honrar com sua palavra junto a sua clientela. Costumava dizer que era um homem cumpridor de seus deveres, dentre eles, o dever de entregar o produto comercializado dentro do prazo prometido.
De certo deve ter tido seus defeitos como também tiveram todos os seres humanos que por aqui passaram. Mas tanto a família, quanto os amigos, e a própria memória coletiva que permeia a sociedade fonteboense, demonstram por intermédio de seus festivos tambores a preservação em suas lembranças de um dos muitos legados de sua vida: a de ter sido um homem bom, amável e generoso; um paradigma de virtudes a ser seguido.
Um dia desses sai por ai perguntando sobre o tio Nondas. Sim! Sou um catador de histórias, um preservador de nossas memórias. Neste dia me encontrava em Fonte Boa, nossa pátria. Conversei com dezenas de amigos, outros apenas conhecidos que me receberam para um dedinho de prosa. Muitas lembranças boas surgiram. Falávamos da História local, e sempre que trazia à baila a figura singular de tio Nondas, o primeiro semblante era de um sorriso. Logo diziam: teu tio foi um homem bondoso com um coração enorme e uma alma abençoada. Era um homem que todos nos admirávamos. Nossa cidade - relatou um amigo - ainda está em dívida com ele, pois deveria ter em um de seus prédios públicos a preservação de sua memória por intermédio de seu nome posto em uma imensa placa luminosa. “Mas nunca se é tarde para se corrigir os erros históricos”, afirmou!
Tio Nondas era daqueles homens simples por opção, e que recebia em sua casa muitas visitas. Era daqueles homens habilidosos que sabiam tocar com sua luz a tez de nossas almas. Ele nos faz lembrar Valquíria Cordeiro quando diz que “tocar na alma de alguém é virtude de poucos. Exige destreza, sensibilidade, amabilidade e extrema delicadeza”.
Independentemente de quem fosse - necessitado ou não - além da atenção e do carinho, o visitante jamais iria embora sem fazer “uma boquinha”, ou seja, sem tomar um café, lanchar ou fazer uma refeição mais completa. Ainda era agraciado com um pequeno agrado do amigo, nem que fosse uma dúzia de ovos, uma camisa, uma cambada de peixe, um pedaço de pirarucu salgado, até mesmo um saquinho de castanha ou outro mimo qualquer. Suas ações cotidianas nos levam aos ensinamentos de Santo Agostinho ao narrar que “aquele que tem caridade no coração tem sempre qualquer coisa para dar”. Tio Nondas muito mais que bem material, se dispunha perenemente em doar o próprio amor fraternal que tanto cultivava; o mesmo amor que brotava de seu coração bondoso que fazia cintilar sua alma. Retorno às palavras de Santo Agostinho quando o mesmo anuncia: “à medida que o amor cresce em você, a beleza também cresce. Pois o amor é a beleza da alma”. Assim se revestia tio Nondas, pela bondade, ou seja, pela capacidade de ajudar o próximo de maneira espontânea e desprendida.
É corrente também que tio Nondas sempre foi um exemplar chefe de família, pai carinhoso e esposo dedicado. Nunca teve participação política partidária ativa em sua cidade natal, e nunca dela se enamorou ou fez questão de atuar, apesar das insistentes tentativas de alguns amigos em persuadi-lo para tal ofício. Além de não participar desses movimentos eleitoreiros, sempre que possível fugia das intrigas políticas e das agitações febris que se vivia junto ao cenário político de Fonte Boa. Nos momentos em que não estava trabalhando, devotava integralmente a sua família e aos amigos.
Muito religioso e dotado de grande força de vontade, entusiasmo e fé, jamais esmoreceu as dificuldades que perenemente chegavam a sua vida. Também adorava auxiliar de bom grado as festividades religiosas realizadas em sua cidade natal.
BRILHA NO CÉU DE NOVO UMA ESTRELA
O desabrochar doce da vida é um fenômeno divino, mágico e cintilante, disso não temos duvida alguma. Mas também temos a plena convicção que em algum momento desfrutaremos também do momento amargo da partida. É como canta o poeta Áureo Mello em seu lantejoulado soneto “Como se eu fosse um cantador” ao nos apresenta em seus versos a metáfora de que “A vida é como um trem que vai passando... / cada vagão é um ano transcorrido / Puxados por um coração sofrido / aos poucos da estação se distanciando”. Ao fim do trilho o itinerário se encerra, e de certo se inicia uma nova viagem.
Em tais circunstâncias, a morte do corpo físico - senhora dos nossos destinos - é também a única certeza que podemos afirmar. A única “verdade” mesmo que questionada em alguns dos muitos cenários do pensamento humano, de fato, um dia se concretizará. Sob este aspecto, o enredo da história marcante de tio Nondas se destaca pelo dia em que é chamado a retornar ao plano espiritual. Sua passagem deu-se mediante seu falecimento ocorrido no domingo do dia 07 de outubro de 1984, fato este transcorrido por volta das 06h00, no leito do hospital de Fonte Boa. Segundo boletim médico, causa da morte se deu por conta de problemas cardíacos. Coincidentemente este acontecimento sobreveio dois dias após o óbito de sua estimada mãezinha, ou seja, um episódio de dupla tristeza quase que simultâneo, deixando seus entes queridos no cálice amargo da saudade daquelas duas joias raras que partiram.
Sou sensível no versar do poeta que diz que a “morte” só ocorre de fato quando a memória daqueles que partiram forem esquecidas. Eis porque o saudoso tio Epaminondas continua intensamente vivo entre nós. Seu coração de ouro, promovedor de inequívocas provas de sua alma compassiva e boa, soube muito bem em vida compreender a sua missão terrestre. Assim partiu de Fonte Boa para ocupar seu espaço na glória celestial. Findou-se a matéria, mas de fato continua vivo, vivíssimo no coração, na memória e na história de sua terra. Indo além, podemos dizer que hoje “brilha no céu de novo uma estrela” como sugere o poeta e cantor Marcos Sabino. Sim! Uma luz que reluz florida no jardim do céu de nossos mais profundos e afortunados sentimentos e de nossas memórias, uma estrela chamada Epaminondas!
O RIO SEGUE SEU DESTINO
Com o advento prematuro da partida de tio Nondas, tia Joaninha, que sempre foi dedicada esposa e fiel companheira, passou algum tempo a frente da administração da fazenda “Mororó”, uma imensa propriedade rural extrativista que fora herdado por Epaminondas nos tempos de seus pais. No entanto, em 1986, a pedido de seus filhos que residiam na capital, tia Joaninha se obrigou a fixar domicilio definitivo em Manaus. As recordações que enchiam de alegrias seu coração eram as mesmas que logo se revertiam em dor com as doces lembranças mergulhadas na profunda saudade que sentia de seu querido e amado companheiro de tantos anos. Tendo quase todos os filhos morando em Manaus, com exceção da querida prima Jany, o fato da saudade intensa que aquele lugar provocava nela, a casa, o comercio, a rua em que morava, o cheiro do mato e do vento que trazia o rio para dentro de casa, tudo isso lhe trazia um sentimento de saudade intensa daquele que em vida fora sua alma gêmea. Dentre outras coisas somando-se a tudo isso acabou por decidir ir morar com os filhos.
...E “Agora, que faço eu da vida sem você? / Você não me ensinou a te esquecer. / Você só me ensinou a te querer, / e te querendo eu vou tentando te encontrar”. Talvez este poema de Fernando Mendes e José Wilson Lucas (1979), possa retratar o grito mudo que ecoou entre os choques de sentimentos de tia Joaninha até o dia em que ela também teve que partir.
Tia Joaninha nasceu na terra de sua mãe, Benjamim Constant (AM), em uma quarta-feira do dia 19 de fevereiro de 1919, era filha do peruano Lázaro Anaquirí Cauassa, e de dona Eleotina Ipuxima Cauassa que era descendente de pai japonês e mãe peruana. Chegou à Freguesia de Fonte Boa em 1922, e lá se estabeleceu com sua família. Viveu intensamente até 95 anos de idade. No o rude dissabor da vida, vivenciou a perda de alguns de seus filhos, uns ainda no ventre, outros na infante idade. Chorou também pela partida prematura do seu querido Sósthenes tirado de nosso convívio no vigor de sua maturidade. O dia de sua chamada ao Plano Superior se deu no dia 18 de setembro de 2014. Cumpriu sua missão. Deixou em nosso convívio uma família maravilhosa, fruto do amor que teve com seu inesquecível Epaminondas, um homem simples, humilde, digno e bondoso, preceitos que seus filhos e descendentes jamais deixaram perecer, vez que esses tesouros receberam como herança.
Esta crônica cumpriu seu objetivo, reverenciar e promover novamente a perenidade da memória e da história de nossos antepassados, na certeza que agora estão todos vivendo eternamente como astros fúlgidos do zênite azulado de nossa eterna saudade.
Epaminondas Ferreira Lins
* 15/07/1913 † 07/10/1984