JOSÉ DE JESUS LINS DE ALBUQUERQUE

A José Lins de Albuquerque,

Médico humanista de augusto espírito imortal -

A flama entusiasmada de seus familiares.

Não sei dizer o porquê, mas ao compor sobre tia Naíde, centraram-se forças em meu punho para escrever sobre Zé Lins. Tenho, portanto, o superior intuito de resgatar, aqui, neste capítulo a parte, a figura singular deste meu primo querido, médico humanista de alto abono e sã têmpera, que deixou pelas tribunas da vida o rastro luminoso de sua existência.

Filho de Belarmino e Naíde Lins de Albuquerque, José de Jesus Lins de Albuquerque (Zezinho), nasceu em Fonte Boa (AM) na segunda-feira florida do dia 15 de março de 1948. Em sua terra natal desfrutou de uma infância alegre. Costumava brincar no terreiro de sua casa, cujo quintal, ladeado pela pujante floresta que tanto admirava, foi também cenário de seus primeiros encantos. Adorava banhava-se nos cristalinos igarapés que cortavam a cidade, subir nas árvores frutíferas, ficar a beira do barranco vendo a paisagem exótica da cadencia rítmica do pôr-do-sol. Talvez por isso tenha se impregnado de tanta amazoneidade, um sentimento que sempre se manifestava em seus calorosos discursos. Aliás, Zé Lins, ainda muito jovem - a imagem de Demostenes, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, Victor Hugo, José Bonifácio, Padre Antônio Vieira e tantos outros grandes tribunos – já era visto por seus pares como um dos mais eloquentes oradores brasileiros do século XX.

Em Manaus realizou um de seus muitos sonhos, dentre eles, o de ser médico. Foi o primeiro jovem sonhador vindo lá das barrancas do alto Solimões (Fonte Boa) a se formar pela Faculdade de Medicina do Amazonas – UA. E como se não lhe bastasse ser um dos mais proeminentes alunos do curso de medicina, foi também o orador de sua turma. Não tardou se pós graduar em Administração Hospitalar, cuja atividade acompanhou diretamente sua vida profissional nas várias atividades de gestão que exerceu como homem público. Dentre estas, Diretor do Hospital Getúlio Vargas em Manaus, Presidente do Instituto de Previdência do Amazonas, Sub Secretário e Secretário de Saúde do Amazonas, Deputado Federal, Juiz de Contas, Secretário de Finanças do Município de Manaus, e muitas outras muitas funções relacionada a medicina.

A formação de sua família deu inicio ao enamorar-se com a frajola faceira menina, Maria de Nazaré Rocha (Mara), nascida a 13 de maio de 1952, natural de Coari, com a qual se casou e teve quatro filhos, Marcelo, Mara Bianca, Marcus e Marcela. Foram seus tesouros mais preciosos, suas joias de orgulho, carinho e devoção.

Minhas lembranças mais profundas de Zé Lins me levam sempre a sua simplicidade e bondade extrema. Era um homem simples e bondoso, detentor de dotes culturais extraordinários e de uma inteireza de caráter excepcional, principalmente quando espraiamos seu exemplar amor ao próximo e sua trajetória histórica iluminada pela dedicação primorosa de sua vida, a maestria da medicina, e a vida pública. O luxo social que permeava este homem contrastava com a simplicidade de sua alma, de seus atos, de sua humildade perene. Insisto em reafirmar, sua simplicidade transparecia suas excepcionais qualidades de fidalguia e lisura, conquistando todas as pessoas desde o primeiro momento com a sua maneira de ser, sempre atencioso e cordial, com um sorriso de respeito e amizade, na qual denotava um incrível interesse, domínio e sensibilidade em relação aos temas abordados junto ao bem estar de seu semelhante e em geral de sua sociedade proficiente. Essas lembranças profundas do caráter de Zé Lins me levam recordar as belas palavras de Dalahi Lama “a bondade é o que realmente importa. A bondade, o amor e a compaixão combinados são sentimentos que levam à essência da fraternidade. São alicerces da paz interior.” Eis aqui, a transfiguração poética e reflexiva da personalidade formada do grande caráter deste meu primo querido que também me fez ser um grande admirador seu.

Zé Lins nos visitava constantemente. Em nossa humilde casa era sempre bem recebido. Não tínhamos a preocupação de providenciar um bom cenário para recebê-lo, ele não prestava atenção nessas coisas, se a casa era de madeira, ou se o sofá era velho, não, isso realmente não importava mesmo. Zé Lins gostava mesmo era de uma boa prosa regada a Uísque 12 anos (esse ele sempre trazia), relembrar seus tempos juvenis, falar sobre política e outras coisas bem engraçadas. Eu estava sempre no meio das rodadas dessas prosas. Observava e admirava a robusta inteligência, a índole e o caráter sem jaça de Zé Lins. Fico orgulho em saber que seu nome e sua memória estão perpetuados nos quatro cantos do Estado do Amazonas, lugar este que tanto amou, trabalhou e defendeu seus interesses coletivos. Poderia citar no mínimo duas dezenas de prédios públicos no Amazonas que recebem o nome do Dr. José Lins de Albuquerque, mas para resumir podemos aqui destacar: o prédio da Assembleia Legislativa do Estado, uma dezena de hospitais e postos de saúde, quadras poliesportivas, escolas, etc... A cidade de Fonte Boa, seu berço materno, também conserva a memória perenal de Zé Lins, não só por ter seu nome em alguns prédios públicos, mas pela figura bondosa, zelosa e competente, por sua generosidade peculiar de sua personalidade, que em vida, iluminou a sua gente e o seu povo com sua bondade e amor ao próximo.

O padre Fábio de Melo em uma de suas pregações, falou que a vida é fruto da decisão de cada momento. E que viver é plantar. “deixar cair na terra de nossa existência as mais diversas formas de sementes.” A sabedoria bíblica nos confirma isso, quando diz que “debaixo do céu há um tempo para cada coisa!” Realmente essa assertiva é sempre contemporânea. Senão vejamos. Em 1978, Zé Lins recebeu o convite do então vice-governador do Estado do Amazonas, João Bosco Ramos de Lima, (que chegou a ser eleito Senador, mais morreu no inicio do mandato) para se candidatar ao cargo de Deputado Estadual. De fato ficou honrado pelo convite, mas o declinou por estar exercendo em sua atividade médica o gerenciamento de projetos que ora estava sendo executado com muita determinação e apreço. Entretanto, Zé Lins lembrou ao vice-governador que tinha um irmão mais novo que estava vivendo a efervescência da política estudantil. Seu nome Atila Lins, um jovem líder estudantil que era afiliado ao partido do governo – ARENA. Atila aceitou o convite, concorreu ao mandato eletivo de Deputado Estadual da legislatura de 1979/1982. Foi o segundo nome mais votado no pleito, ficando atrás somente do radialista Josué Filho. De lá (1978) até os dias de hoje (2014) são 36 anos ininterruptos como parlamentar (Deputado Estadual e Deputado Federal) pelo Amazonas. Seu outro irmão, o Belarmino Lins (Belão) ao enveredar nesse campo político, se tornou um campeão de votos e de mandatos consecutivos, no total de seis mandatos de Deputado Estadual.

Mas voltemos ao Zezinho. Somente no inicio dos anos de 1980 quando o Brasil vivia o processo de redemocratização, a formação de novos partidos e o amadurecimento político começava a se engendrar no cenário nacional com o fortalecimento da Zona Franca de Manaus, é que Zé Lins resolveu lançar seu nome as urnas, fato ocorrido nas eleições de 1982 onde preiteou o cargo de Deputado Federal pelo seu Estado. Aliando sua visão moderna de mundo a seu alto grau de humanidade, o apoio de seu irmão e aliados políticos, elegeu-se Deputado Federal. Sua posse ocorreu em 01 de fevereiro de 1983. Lembro que o governador eleito já nas urnas foi o boto navegador, quer dizer o Gilberto Mestrinho.

Zé Lins -tanto o político como homem do povo- aliava sempre o dom de sua simplicidade, inteligência e pendor nato, à sua fantástica capacidade de simpatia. Fazia com que todos os seus pronunciamentos transmitissem serenidade e otimismo, paciência e bondade. Como já vimos era, detentor de fecunda oratória de verbo incandescente e palavras primorosas, utilizando seu dom no plenário da Câmara Federal sempre a serviços de sua comunidade e de seus irmãos amazônidas.

Em 1982, por ocasião da instalação do Tribunal de Contas do Município (TCM) foi indicado com os demais membros, a assumir o cargo de Conselheiro, fato este, ocorrido somente em 1983. Para assumir o cargo, Zé Lins teve que renunciar ao seu mandato de Deputado Federal do qual fora eleito durante o pleito de 1982. Porém, sabia que podia servir melhor seu povo estando mais perto dele. As tecnologias de logísticas e transporte aéreos não eram tão comuns e rápido como hoje, fato que o mantinha por muito tempo longe demais de sua família. Entretanto, ao renunciar o cargo, não declinou suas responsabilidades com o povo do Amazonas. Em Manaus pode desenvolver junto ao TCM um trabalho inovador, e isso o levou a ser eleito por unanimidade presidente da Colenda Corte de Contas.

Faço questão de trazer à luz, o pronunciamento de posse feito por Zé Lins ao mais novo membro do Conselho deste colegiado, Dr. Francisco Queiroz, para mostrar o profundo sentimento e o ardor encomiástico ditado pelo afeto de seu modo de ser, cujo discurso sereno flui da pura essência do ser humano, o seu objetivo nesta vida terrena, trilhado pelo norteamento de sua própria personalidade, conforme já revelamos. Vejamos:

“Nossas congratulações a V. Excia, Conselheiro FRANCISCO GUEDES DE QUEIROS, o que estendemos à sua família. Permita-me, portanto, que neste momento, possa também, como médico e homem público, e inspirado na experiência de vida que também já adquiri, lembrar-lhe que nós, os homens, só nos sentimos felizes, realizados, quando servimos.

Toda a nossa vida é um serviço. Servimos à família, servimos aos amigos. Servimos aos que de nós necessitam. Servimos à sociedade que integramos, à comunidade, e mais servimos, quando os nossos semelhantes colocam aos nossos ombros maiores responsabilidades. Não é a vaidade de servir, mas um dever para responder à nossa vocação comunitária.

Esta é a razão da distinção ou do destaque.

Não é a honra do cargo, mas o ônus, o peso de corresponder à confiança. A esta confiança está implícita à vontade que não se omite de ajudar no desempenho do serviço, que não será pessoal mas de todos.

Vamos servir para não negar. Vamos servir para o exemplo dos que se formam e esperam por exemplos.

Servir com fé e com crença no que se pode realizar, esperando e sabendo que Deus assiste a quem serve e dá forças para que as dificuldades sejam superadas.

Tenhamos a coragem de servir.

Seja bem vindo, colega FRANCISCO QUEIROZ!”

(Transcrito do Livro, Papel Político do Tribunal de Contas – Francisco G. de Queiroz 1987/ Imprensa Oficial).

Zé Lins era sempre assim, humilde em suas palavras, simples em seus atos, verdadeiro em seus sentimentos. Um homem cuja palavra valia mais que mil promissórias. A família e os amigos, o respeito e a solidariedade, o exemplo de vida, a confiança, a coragem de servir e a gratidão posta em seus discursos eram os mesmo que acompanhavam as praticas e atitudes deste meu primo querido. Todos que tiveram a honra e o prazer de conhecê-lo e conviver com ele, já percebia cedo que o sol fulgurava em tudo o dizia. A indulgência do gênio, o caráter diamantino e a grandeza do sábio foram à tônica maior de sua conversação pontificada de espiritualidade e lições filosóficas. Com ele aprendi muito. Parte do que sou devo as suas lições humanistas. “Bem aventurado os humildes de espírito” já o disse Jesus Cristo no Sermão Da Montanha.

Após algum tempo afastado do cenário político, Zé Lins resolveu sair da sombra de sua aposentadoria para retornar, em 1995, e tomar posse da pasta da Secretaria de Finanças do Município de Manaus. Era Prefeito à época o engenheiro Eduardo Braga. Zezinho costumava receber amigos em seu gabinete. Sempre que possível estávamos por lá também. Sua secretária era uma pessoa extremamente amável. Nunca deixou de nos atender, mas vale frisar, não íamos lá para pedir algo, íamos somente para conversar sobre diversas bobas coisas, lógico, entre elas, política e Fonte Boa eram sempre assuntos da pauta séria. Certa vez perguntaram a Zé Lins o porquê de tanto jovens em seu gabinete. Respondeu que acreditava na juventude, em muitos via potencial a ser treinando e expandido. Foi lá que amadureceu a ideia de retornar a política como candidato majoritário. Então, em 1996, candidatou-se ao cargo eletivo de Prefeito no Município de Fonte Boa, sua terra natal do qual amava com fortes sentimentos. Lá, a margens do rio Cajaraí, o primeiro comício foi um grande evento. Zé Lins foi ovacionado por simpatizantes de todas as nuances e matizes politicas locais. Conseguiu em pouco tempo a simpatia e o acolhimento até dos mais radicais ditos “contras”... O tempo foi passando e seu nome já era dado como certo, a população queria mudança, a população adorava Zé Lins e a duas coisas se combinavam. A inquietação do adversário era visivelmente desolada. Decerto Zé Lins seria o próximo prefeito de Fonte Boa, assim como fora vários tios seus assim como também foi seu pai. Mas a morte veio insidiosamente num golpe traiçoeiro, surpreendendo-o, em 17 de fevereiro de 1996. Foi um dia de luto para toda a comunidade Amazonense. Fonte Boa chorou, o Amazonas chorou pela perda de um filho tão estimado, ceifado por um traiçoeiro e fulminante infarto no miocárdio. Infelizmente a temporalidade da vida é curta. Mas há aqueles que vão antes de completar esse curto ciclo de tempo.

Seu corpo foi velado no Salão Nobre da Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas e suas vestes mortais guardadas no Cemitério de São João Batista em Manaus, cidade que o acolheu. José Lins fora em vida, um desígnio de Deus, que na sua alta sabedoria e bondade lhe traçou o glorioso destino, conduzindo-o pela senda florida das rosas irisada de fúlgidos clarões.

Em vida, recebeu Zé Lins a graça divina de poder iluminar a sua gente e o seu povo com o verbo de suas palavras, seus atos e o amor ao próximo. Nunca fez de seus títulos objeto de culto ou vaidade pessoal, porque praticava a humildade e a bondade com sentimentos cristãos. Também procurava nunca se envaidecer com os elogios que recebia, dando a impressão de pedir desculpas por ser grande. Por isso, enquanto houver a sabedoria e o bom senso da humanidade e os nossos corações bombeando a essência da vida, sua memória sagrada viverá sempre no halo de nossa admiração e na prece da nossa saudade.

Não posso deixar de relembrar que pouco mais de 04 anos após ida de Zé Lins ao plano espiritual, sua estimada esposa, recebe o chamado para ir ao seu reencontro no plano superior. Os anjos a vieram buscar no dia 08 de outubro de 2000, deixando órfãos mais uma vez, os filhos que tanto amaram. Inspirado pelo poema de Vinícius de Moraes que diz: “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida” podemos afirmar, uma coisa é certa: do outro lado do rio da vida nos reencontraremos novamente, sempre.

Seu filho Marcus, jovem intelectual e herdeiro político de Zé Lins, em tributo fraternal aos seus inesquecíveis amados pais, e ao seu bondoso avô Belo Gomes, em sentimentos de grande saudade, prestou-lhes homenagem encerrando uma placa com saudosas palavras no jazigo da família Lins de Albuquerque, cujo dizeres são:

“Bimbo, Guru e Belo.

Perdidos, mas jamais esquecidos”.

Marcus Lins

02/11/02

José Lins foi assim, e sem o pecado da vaidade podemos dizer: foi um grande amigo. Melhor dizendo, foi um simples caboclo, filho querido e inestimável da região do Solimões, que teve a mesma simplicidade e limpidez constante das águas dos cristalinos igarapés de sua terra natal. Esse varão ilustre de méritos e eloquente oratória, cujo nome de batismo derivado do hebraico Yoseph “aquele que acrescenta” é a quem hoje, resguardamos sua memória. Abraços fraternos meu primo. Você foi acima de tudo, um caboco pai d ‘égua!

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Eylan Lins
Enviado por Eylan Lins em 15/01/2014
Reeditado em 16/01/2014
Código do texto: T4651257
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