TIMIDEZ ESPETACULAR

“Afinal, que retumbante timidez é essa, que atrai tanta atenção?”

Luís Fernando Veríssimo

Devo ter sido a criança mais tímida desse planeta. E por ter nascido numa família de super extrovertidos, talvez eu tenha sofrido ainda mais que os outros tímidos do mundo.

“Sou menor que uma formiga e minha timidez é do tamanho de um elefante”, como já disse. Era um paradoxo: a pessoas me apagavam e ao mesmo tempo acendiam todos os holofotes sobre a minha timidez. Era a única característica que percebiam em mim. Jamais falavam de outros assuntos comigo. Era sempre aquilo: “Noooooossaaaa, como você é quieeeeeeetaaaa!!!!!!!!!( E quantas exclamações!) e eu me espantava com o espanto que a minha timidez causava. E também: “Como você é diferente dos seus irmãos!” E as comparações depreciativas me davam calos nos ouvidos. Enquanto meus irmãos eram exemplos de superioridade, popularidade e perfeição, eu era um desastre completo e algumas vezes me arrependia de ter nascido.

Sempre fui uma estranha na família, na escola, na igreja. Sempre causei espanto onde quer que fosse. E estive sozinha no meio da multidão. Mas aprendi muito com a solidão e a dor de ser diferente, de não caber nos padrões.

E a minha timidez espetacular, só faltava ser manchete nos jornais. “A garota mais tímida do mundo” em letras grandes. Imagine que ironia, ficar famosa por ser tímida!

Poderia ser matéria do Globo Repórter, sair no Fantástico, ser entrevistada pelo Jô Soares ... Então eu me prepararia, mas apareceria com o rosto quadriculado ou embaçado e uma irritante voz de pato; que não me identificassem, até porque eu nem tinha nome. A minha timidez exposta pro mundo inteiro e eu, anulada como pessoa.

Eu era uma anomalia, realmente. E as pessoas que me cercavam, sempre apavoradas, nunca souberam lidar com esse monstro que era a minha timidez. E por falta de tato e de sabedoria, pioravam ainda mais a situação.

Não é preciso ser um psicólogo para saber que quando se coloca uma lente de aumento sobre um problema, ele irá se agigantar. Mas se você desviar o foco para outras coisas, o problema tende a diminuir.

Imagine conversar com um cego só sobre a cegueira dele, toda vez que encontra – lo. Por que as pessoas fazem isso com os tímidos? Por que não falam de outros assuntos? É sempre “Porque você é quieto?” “Porque o seu irmão é melhor que você?”

Se quer conversar com um tímido, ótimo. Mas por favor, tente dar uma trégua, fale algo que não seja sobre a incrível timidez dele. Pergunte se ele estuda, onde trabalha, se pratica algum esporte, discuta a questão do aquecimento global...Permita – o esquecer-se dela por alguns instantes e se sentir uma pessoa normal.

Não diga “Fala alguma coisa” nem pergunte se um rato comeu a língua dele que até uma criança sabe ter mais conteúdo.

Os tímidos são muitos e são pessoas normais. Mas muitas vezes são vistos como E.T.s .

“Se você tratar um indivíduo como ele é, ele permanecerá como é.

Mas se você o tratar como se fosse o que deveria ser, ele se transformará no que deveria e poderia ser.”

(Goethe)