PONTO DE VISTA
Prefácio:
Do curso primário, onde a cultura escrita começa, algumas coisas ficam para sempre na lembrança, recordo-me
do canto orfeônico (A Retirante =>
Foi numa leva que a cabocla Maringá/
Ficou sendo a retirante que mais dava o que falá/
E junto dela houve alguém que suplicô/
Pra que nunca se esquecesse do caboclo que ficô/
Maringá, Maringá, depois que tu partiste/
Tudo aqui ficô tão triste/Que eu garrei a imaginá/
Maringá, Maringá, para haver felicidade/
É preciso que a saudade vá batê notro lugá/
Maringá, Maringá, vorte aqui pro meu sertão/
Pra de novo o coração/De um caboclo assossegá...);
do teatro (peças escolares com suas encenações inocentes que nos preparam para continuar encenando no cotidiano da nossa vida);
das poesias de Gonçalves Dias (Canção do exílio =>
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorgeiam,
Não gorgeiam como lá...);
de Olavo Bilac (A um poeta =>
... Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:
Porque a Beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a Graça na simplicidade.);
de Castro Alves (Os anjos da Meia Noite =>
Como o gênio da noite, que desata
O véu de rendas sobre a espádua nua,
Ela solta os cabelos... Bate a lua
Nas alvas dobras de um lençol de prata... )
Tudo começa na infância, se confirma na adolescência e influencia a vida toda. Sítio, cavalo, natação, pescaria. Tudo na vida é prática e dedicação. Por isso eu era, quando adolescente, um bom pescador de lambari no rio Paraitinga. Meu pai admirava minha habilidade e não entendia porque não fazia igual. Hoje estamos em igualdade de condições, porque já não tenho como ele - na época, tempo para praticar. E o interese se volta, naturalmente, para outras coisas. Sempre gostei de ler e por isso devorava compulsivamente todos os livros que via pela minha frente. Hoje continuo com o hábito embora selecione, naturalmente, entre as várias opções disponíveis.
O diretor da escola primária, prof Adhemar Bolina, sabendo talvez do meu interesse pela poesia, intimou-me a fazer um hino a Salesópolis. Entreguei-lhe o que consegui fazer e nunca obtive resposta. Na verdade, “em terra de cego, quem tem um olho é rei” e só por isso meus colegas elogiavam minhas rimas. Porém, eu não sabia sequer a diferença entre verso e estrofe na poesia. Desconhecia completamente a existência da métrica, nem sabia o que era parnasianismo, realismo, naturalismo ou humanismo. Fazia aquilo de forma simples e natural, em busca de preencher um espaço que se fazia presente e encontrava nela um canal de expressão. Minha poesia é livre - sempre foi e pelo jeito sempre será! Não tem técnica, métrica, ou tendência didática - embora nunca estejamos totalmente livre de influências. Meu compromisso é com meu tempo e minha própria personalidade. De lá para cá, no entando, duas gerações se passaram. É natural, portanto, desenvolver estilo próprio através da auto-crítica.
Um desafio me acompanhou durante esse tempo quase que inconscientemente e me frustrava por não encontrar o “fio da meada”. Era com relação ao poema da cidade. De tempos em tempos eu tentava, mas não ficava satisfeito com o resultado. Mas, como disse Thomas Édson: – “1% de inspiração e 99% de transpiração fazem a diferença...” E foi assim que um dia, depois de tantas tentativas infrutíferas, ano após ano, surgiu “SALESÓPOLIS - São José do Paraitinga”(publicado no Recanto). Ao terminar tive certeza (modéstia à parte) de que aquele era o hino solicitado trinta e três anos atrás. A gente sabe quando a coisa acontece. Pois nada vem por acaso e reconhecemos quando ocorre. Durante três decadas foram 99% de transpiraçao. Surgiu, de repente, o 1% de inspiração que faltava e ficou claro o objetivo atingido. Dispensa reconhecimento público e o tempo dirá a que veio. O importante é sentir-se realizado, com consciência do dever cumprido. Quem pediu não viu, mas é mentor da idéia...
Nesse meio tempo os poemas se acumularam nas gavetas. Simultanemante, escrevia também minhas crônicas - que mais tarde evoluiram para artigos publicados em jornais da cidade, a partir de 1981 nos periódicos “O Nascente”, “O Salesópolis”, “O Município de Salesópolis” e agora, mais assiduamente, no jornal “A Notícia”.
Em 1981 contatei algumas editoras, sondando a possibilidade de publicar um livro de poesias. Conheci então o mundo real da literatura e desci das nuvens. Em 1987 participei de um concurso de poesias em nossa cidade, durante a programação da Festa do Divino, coordenado pelo maestro Sebastião de Mello Faria. Inscrevi três e elas se classificaram nas três premiações programadas: 1º, 2º e 3º lugar. Foi o primeiro reconhecimento público. Onze anos depois um dos jurados daquele concurso, Lucas Candelária, me procurou e selecionou algumas para o seu livro “Irmãos de Sonhos”. Gostei muito do seu trabalho e a partir daí percebi que as coisas poderiam ser diferentes - que tudo era questão de elaboração e direcionamento. Organizei então o que tinha arquivado e me preparei para uma nova etapa naquilo que fazia. Desenvolvi artigos jornalísticos de forma mais específica e aprendi com o JAM a otimizar as matérias. Participo desde então, naturalmente, da influência exercida sobre a cultura local - principalmente na área política - buscando interpretar as ações Executivas e Legislativas, de modo a traduzir e refletir o pensamento do cidadão, através do meu ponto de vista.
Em 1998 resolvi que já estava na hora de editar um livro. Comprei um computador adequado e comecei a levantar o alicerce. Já tinha em mente o título “Minha Pintura” e uma frase de Leonardo da Vinci (A pintura é uma poesia que vemos em vez de sentir e a poesia uma pintura que sentimos em vez de ver) para compor a capa. Como ilustração imaginei, em função do título, a foto de uma pintura surrealista do Paulo Sexto - artista plástico consagrado de nossa cidade. Digitei o livro, mas achei-o longo - e a miscelânia dos assuntos não me agradou. Decidi, então, desmembrá-lo em:
- HOMENAGENS (nominais/generalizadas);
- REFLEXÃO;
- COISAS DO CORAÇÃO;
- COLETÂNEA - Autores Diversos (seleção de poesias de outros autores);
- LETRAS DE MÚSICAS E PARÓDIAS;
- FRAGMENTOS DA CRIAÇÃO (seleção de poesias de autoria própria - mesclando os assuntos dos livros anteriores)
e, por fim,
- PONTO DE VISTA
(artigos jornalísticos – publicados e inéditos, poesias - de cunho político e de conscientização - e outros escritos).
No embalo da digitação, e euforia da novidade no campo da editoração, resolvi transformar em livro as participações de um concurso de poesias direcionado aos alunos do Ensino Fundamental e Médio. Surgiu então MOMENTO CULTURAL I “Talento Jovem”. Em seguida, ressuscitei as participações do concurso de 1987 (citado anteriormente) com o título “A POESIA DA FESTA DO DIVINO”.
Pretendo, daqui para frente, localizar aqueles que escrevem para transformar seus escritos em livros. O Lucas plantou uma semente e mostrou, com isso, o caminho das pedras. É uma seara que promete, porque não faltam semeadores e o solo é fértil. Precisa apenas de incentivo e organização. Nada perde, quem cria... quando há reconhecimento. Já tenho alguns autores em mira - estão arredios, e é natural, mas o tempo é um bom conselheiro e se depender de mim suas obras não ficarão engavetadas! O primeiro a ouvir e acatar minha sugestão foi o professor de história Alexandre Benedito Figueiredo, que convocou seus alunos do ensino médio a desenvolver versos para nota em sala de aula e obteve como resultado a editoração de um livro em parceria com seus alunos tendo como tema assuntos relacionados à sua disciplina escolar. Foi um trabalho rápido com efeito imediato. Fez, com isso, algo diferente na sua área de atuação; seus alunos descobriram vocações que sequer sabiam existir e um caminho novo foi desbravado - sua edição foi encaminhada à Secretaria de Educação; quem sabe faz escola dentro da própria escola!
Tudo isso para dizer que "PONTO DE VISTA" não apareceu do nada, nem surgiu de repente. É resultado de um aprendizado que pretende evoluir para algo maior - e mais produtivo!
Representa, no mínimo, meio século de experiência de vida – direcionada através do ensinamento paterno para o íntegro e justo. Motivo fundamental para justificar a diferença entre o que penso das ações, reações e comportamento dos políticos locais e o que eles próprios pensam de mim. Apesar de ninguém neste mundo ser dono da verdade e sabermos que nosso comportamento é produto de uma cultura, nada justificaria castrar nossa própria consciência.
Assim sendo, todos tentamos realizar sonhos e projetos. Mas sonhar é relativamente complicado. A maioria se perde neles e armazena apenas um celeiro de ilusões.
Para realizá-los temos que simplificá-los, vendo-os com riqueza de detalhes e nitidez. É preferível ter um grande sonho de forma bem definida do que muitos sonhos pequenos de forma vaga. Porque, como diz Paulo Coelho, quando definimos com clareza o que desejamos, o universo conspira a nosso favor!
Infância, adolescência, maturidade. Família, política, religião. Indivíduo, comunidade, sociedade. Conceito, filosofia, tradição. Pergunta, resposta, aprendizado. Caro, barato, relativo. Certo, errado, cultura. Sonho, realidade, ilusão. Nascimento, morte, vida. Sincretismo, pluralismo, generalismo. Caráter, personalidade, comportamento. Mistério, magia, sedução. Começo, meio, fim. Concreto, abstrato, poesia. Vivência, lembrança, experiência. Sentimento, emoção, confusão. Sinceridade, hipocrisia, naturalidade. Crença, fé, poder. Poder, responsabilidade, conquista. Feio, bonito, visão. Visão, interpretação, ponto de vista...
Assim é a vida, com todos os seus extremos e paradoxos, de bom e ruim, de sério e chato, de lírico e envolvente. Que o amor maior que nos mantém a todos unidos transforme-se, um dia, em outra coisa etérea no Universo “posto que é chama; mas que seja eterno enquanto dure!”. O poeta maior se foi, mas viveu seriamente como um eterno menino. Exerceu plenamente seu direito de opção por um estilo de vida diferenciado. E nos deixou, como outros, apenas um exemplo do que a vida pode nos proporcionar. Ou negar! A realidade é um fato que ninguém consegue contestar. Mas os momentos vividos são sagrados – ninguém poderá nos tirar. E os sonhos são nossos, pois, ao ser humano é permitido sonhar! E ao Universo... conspirar!
Um dia uma professora, que foi colega de escola, perguntou em quê eu havia me destacado – citando alguns exemplos, inclusive um prefeito, ao lembrarmos das pessoas que estavam na foto da nossa formatura. - “Em nada!” lhe respondi. “E a resposta está na sua própria pergunta.”
Nossa vida pode passar em branco ou não – depende do que fazemos em comunidade. O que direcionamos a nós, nos mantém vivos; o que produzimos para a humanidade, nos imortaliza. Mas é importante também, como disse Monteiro Lobato, “não fazer certo a coisa errada...”
* Pastinho = chácara na estrada das pitas ao lado do rio Paraitinga, a quatro km do centro da cidade (Salesópolis/SP), onde íamos - o Narciso Félix (Inho) e o Edmundo como anfitriões e os colegas de adolescência como convidados - durante as férias escolares, para um contato mais próximo com a Natureza. Para pescar, nadar, caminhar pela mata e pelos pastos, caçar rã à noite e observar as estrelas. A cozinha era por nossa conta – seus pais (Sr. Sírio e Dona Nena) faziam a provisão de alimentos necessários para o período em que ficaríamos e o resto era com a gente! No começo foi uma loucura. Errávamos no tempero e tinha comida que nem cachorro comia – literalmente; tanto que um dia deixamos uma das nossa artes culinárias na porteira e os cachorros da vizinhança cheiravam, mas não comiam. Até que um, provavelmente mais esfomeado, não resistiu e experimentou. Mas, em seguida, saiu em desabalada carreira para rio. A comida estava muito “quente” - como dizem os baianos. Na primeira macarronada, fui incumbido de lavar o macarrão. A fazê-lo, reclamei que não parava de sair água suja. Os outros vieram ver. Simplesmente não havia mais o que cozinhar de tão fino que estava. Se detalhássemos tudo que acontecia quando nadávamos no rio Paraitinga e no dia a dia das nossas férias daria, com certeza, um capítulo à parte na história das nossas vidas. Exageros à parte, foi um misto de escotismo com exército que, com certeza, acrescentou algo à nossa experiência de vida. Só quem viveu, sabe; quem não viveu só pode, no máximo, imaginar.. De qualquer maneira foi bom ou eu não estaria me lembrando disso com saudade.