O mote é atribuído a dois ícones da poesia nordestina os poetas João Paraibano e Valdir Teles ambos de saudosa memória! As glosas são de Carlos Aires
MINHA ALMA MATUTA FOI GERADA
NAS ENTRANHAS DO VENTRE DO SERTÃO!!!
Tenho orgulho de ser um campesino
De viver recolhido aos cafundós
Num lugar que não temos vez nem voz
Mas cumprimos tão bem nosso destino
Mesmo quando viramos peregrino
Pela força da grande sequidão
As batidas do nosso coração
Soam forte ao longo da estrada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Quem nasceu sertanejo vai sentir
Um vazio no peito um aperreio
Ao deixar para traz aquele meio
Onde um dia se deu seu existir
Mas não pensa jamais em desistir
De voltar outra vez para o seu chão
E em voz alta fazendo aclamação
Vai bradando na sua caminhada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Caso vire um migrante a saudade
Invadindo seu peito sertanejo
Logo acende a chama do desejo
De voltar pra sua localidade
Cada dia que sente mais vontade
De outra vez habitar na região
E sentindo a dor da aflição
Ele acorda a lembrar de madrugada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Sertanejo tem sua identidade
No seu jeito matuto, na palhoça,
E nos calos contidos na mão grossa,
No calçar, no vestir, na humildade,
Ao andar pelo campo em liberdade
Cavalgando em seu belo alazão
Bem trajado com botas e gibão
Ele ecoa em voz alta na baixada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Sendo igual a raposa, ao carcará,
Ao lambu, ao xexéu, e ao concriz,
Juriti, ribaçã e corduniz,
Ao furão, ao mocó e ao preá
Tendo a rusticidade do gambá
E a astúcia de um velho gavião
Tendo apego ao seu berço, ao seu torrão
Pra você essa frase é adequada,
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Se for como velame e macambira
Xique-xique umburana e facheiro
Catingueira braúna e juazeiro
Lobisomem, caipora e curupira,
Sendo um Jeca, um matuto, um caipira,
Do que vive no mato e faz questão
De manter toda aquela tradição
Use a frase que aqui foi indicada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Sertanejo legítimo não se ausenta
Desse chão que o gerou e lhe deu vida
Onde a água é escassa e a comida
É cuscuz mungunzá fava e polenta
Sofre muitas agruras, mas, aguenta,
Firme e forte, nem fala em migração
Pois na corda que amarra o matulão
Esta frase se encontra ali colada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Se gostares da plaga nordestina
De seu povo sofrido, sua gente,
Se te adequas ao clima seco e quente
Se és adepto da luta campesina
Vem pra roça cumprir a tua sina
E verás que a cidade é ilusão
Sossegado, teu velho coração,
Agradece, e feliz exclama e brada,
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Carlos Aires
23/07/2021