A escrita desse texto e em linguajar matuto,
sugiro ao leitor que leia escutando o áudio
para compreender melhor o desenrolar da história.
O autor.
PÊDO DE BELA E
DONA SANTA BENZEDEIRA!!!
Nas quebrada do sertão
A gente incronta de tudo
E o pueta cuma sempre
Arrelata o contiúdo
Cum caima e cum paciênça
Quié pra mode dá ciênça
E infoimá a cuntento
De tudo quonte se passa
Seja vintura ô disgraça
Dá nutiça im cem pru cento.
Lá pru lado do Quilombo
Na vila da Catinguera
Risidia Dona Santa
Uma véia benzedera,
Me dixéro cá mulé
Rezava cum tanta fé
Tanta garra e tanta crença
E o persuá dali jura
Qui ela incrontava a cura
Pra toda e quarqué duença.
E gente de todo canto
Vinha praquele lugá
Trazeno suas mazela
Pra dona Santa rezá
Qui fosse dô de barriga
Sarna difruço lumbriga
Dô de cabeça ou de dente
Pudia chegá aus grito
Dispois daquele bendito
Tava curado e cuntente.
A fama foi se inspaiano
Ali pelos arrdó
E a quontidade de gente
Cada dia marmaió
Qui vinha buscá alento
Ou cura pru sufrimento
Pra dô, má instá, tristeza,
A benzedera rezava
A tôdo qui ali chegava
Cum munta dilicadeza.
Um dia, Pêdo de Bela,
Do coração dueceu
Foi pru dotô, e ele dixe,
Tá triste o instado seu
O coração tá inchado
Você tá disiganado
É um caso sem solução
Prutanto quêra issimbora
E pode a parti de agora
Incumendá o cachão.
Assentosse na carçada
Numa tristeza infiliz
Aí chegou Zé Mané
Proguntô, Pêdo mi diz,
Pruque tu tá desse jeito?
Calocou a mão no peito
Chorano qui nem minino
Dixe Zé, eu tô lascado,
Pois o dotô Lionado
Detreminô meu distino.
Dixe qui tô sem futuro
E morro a quarque instante
O meu coração num presta
Mode fazê um transprante
Eu sem tê o qui fazê
Perdi o gosto, o prazê,
E vô ti dá uma prova
Vamo mais zeu Zé! Eu quero,
Passá lá no cimitéro
Pra inscuiê minha cova.
Zé dixe, peraí Pêdo,
Isso num é assim não
Vamo pensá mai um pôco
Pra qui ache a sulução
Aí Zé dixe animado
Cria corage danado
Vê si num ti disincanta
Pois assuntei um projeto
Nois vamo daqui direto
Pra casa de Dona Santa.
E sem qui perdesse tempo
Butaro o pé no camim
Pêdo amarelo e cansado
Ficava dizeno assim:
Ô meu Sinhô Jesuis Cristo
De vivê eu num disisto
Me ajude, faça um favô
Pois já tô de vista inscura
Mermo qui num tanha a cura
Alivie a minha dô.
E chegaro na casinha
Qui dona Santa morava
As três e meia da tarde
E a coitada inda tava
Tratano dos seus criente
Mas conde avistô a gente
Naquela situação
Dixe a Pêdo vem dipressa
Apruveite a hora é essa
Sinão num tem jeito não
Pêdo sentô no baquim
Ficô quaje dirmaiano
Ela num disanimô
E cuntinuou resano
E sem incrontrá sucesso
Rezô o credo azavesso
A ladainha ao contráro
O pade nosso invertido
Sem nada tê risurvido
Intão, rezô um rusáro.
Pêdo cada vêis mais fraco
Ficô parmo, sem assunto,
Sem tê um pingo de sangue
Mais parecia um difunto
Dona Santa dixe assim
Acho qui chegô o fim
Marnada posso fazê
Pêdo suspirô bem fundo
Pensei: se foi desse mundo,
Pois acabô de morrê.
Deitemo ele num banco
Prostrado de fio cumprido
Todo mundo acreditano
Qui Pêdo tinha murrido
Dez minuto se passou,
Né qui Pêdo retornou
E já se acordô rosado
Bem corajoso e dizeno
Pelo jeito queu tô veno
Tô totarmente curado.
Ficou im pé cum frimeza
E a Dona Santa abraçô
E dixe tais vendo Zé
Foi Jesuis quem mi saivou
Pois eu já disiludido
Pelo dotô cunvencido
Qui ia morrê ligero
Fiquei ali lamentano
Contano as hora, insperano
O momento derradero.
Dali, Pêdo foi pra casa,
Ainda hoje é vivente,
Mai Dona Santa morreu
A coitada, de repente,
Porém dexô seu legado
Curou cego e alejado
Cum as reza puderosa.
E manera indireta
Inda ajudou o pueta
Assuntano pressa prosa.
Carlos Aires 29/06/2014